As incertezas que rondam o comunicado do Copom na reunião desta quarta-feira

O trabalho do BC na reunião desta semana será especialmente difícil, com grandes riscos de má interpretação do mercado.
Por  Alexandre Manoel, Mirella Hirakawa -
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Na próxima reunião do Copom, a Selic deverá ser elevada para 10,75% ao ano. A última vez que observamos patamar de dois dígitos foi em junho de 2017. Naquele período, no entanto, a Selic estava em processo de queda, após atingir 14,25% no final do ciclo, em julho de 2015, e manter essa taxa por 14 meses, até outubro de 2016. No fim do atual ciclo, esperamos Selic próxima a 12%, mantendo-se nesse nível por um período muito menor que aquele de 14 meses, se a política fiscal agir de maneira coordenada.

Em outras palavras, se o governo respeitar o atual teto (evitar forte expansão real do gasto público) e não fizer uso de excessos fiscais junto aos bancos públicos, como ocorria antes de 2016, usufruirá plenamente dos benefícios das reformas aprovadas nos últimos seis anos. Por conseguinte, a maior eficiência da política monetária e a maior credibilidade do Banco Central (BC) levarão a um impacto muito maior da Selic sobre o nível e a velocidade de convergência da inflação para a meta, implicando, de maneira mais rápida, Selic menor ao longo do tempo.

O presidente do BC em seu último evento aberto discutiu os dois tipos de erro ao qual está sujeito. O primeiro é optar por uma taxa de juros mais baixa, com risco de a inflação ficar acima da meta. Já o segundo é optar por taxa mais alta, com risco de uma inflação mais baixa. Ao saber que a maior contribuição de um BC para o sistema econômico é assegurar a estabilidade de preços, infere-se que, se o BC considerar a ancoragem das expectativas de inflação e a memória inflacionaria brasileira, estará mais propenso a errar para obter inflação menor.

De fato, dadas as premissas acima na condução da política fiscal, se o objetivo do BC é transmitir uma mensagem de taxa de juros alta por mais tempo e ancorar as expectativas, principalmente as relacionadas à inflação implícita, deverá misturar ingredientes hawkish (preocupados) com dovish (menos preocupado) no próximo comunicado, a fim de conseguir afunilar as expectativas para uma desaceleração do ritmo de alta na reunião de março.

Nesse sentido, essa mistura dos ingredientes passaria por deixar a comunicação mais aberta ao mesmo tempo que demonstre perseverar em uma estratégia mais ativa, preocupada com as expectativas e dependente tanto dos ruídos e decisões relativas à política fiscal quanto do cenário externo. Esta prudência muito provavelmente induzirá as expectativas para uma alta de magnitude mais modesta, próxima de 100bps, em março.

Entendemos este ser o caminho mais adequado, em vez de uma comunicação em que sinalizasse, por exemplo, uma alta da mesma magnitude (150 bps) na próxima reunião, com comentários benignos sobre fluxo de dados recentes. Contudo, reconhecemos que o grau de incerteza em relação ao comunicado de fevereiro está maior que o usual, dado o estágio atual do ciclo contracionista.

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Os efeitos da política monetária já podem ser observados na desaceleração da atividade no quarto trimestre de 2021 e as expectativas de crescimento para 2022 já foram sucessivamente revisadas para baixo. Ademais, as incertezas sobre a reunião do Copom de fevereiro aumentam ainda mais, ao considerarmos a ausência de um diretor no comitê, de modo que mudanças no comunicado podem ser lidas como uma descrição do perfil dos membros restantes, menos ou mais preocupados com a dinâmica de inflação.

Enfim, o trabalho do BC na reunião desta semana será especialmente difícil, com grandes riscos de má interpretação do mercado. Por isso, é importante evidenciar didaticamente a importância das decisões de política fiscal sobre a monetária, reconhecer a incerteza e deixar a próxima decisão um tanto quanto aberta, com uma comunicação híbrida, que entendemos ser essencial, neste momento, para ancorar as expectativas.

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