ESG: o bônus e o ônus para quem respeita (ou não) o planeta, a sociedade e as normas

A sigla está ganhando cada vez mais relevância no setor de seguros
Por  Denise Bueno -
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Quem acompanhou os diversos eventos do mercado de seguros em setembro e outubro, tanto dentro quanto fora do Brasil, notou que a sigla ESG está ganhando cada vez mais relevância no setor de seguros.

Afinal, para as seguradoras e resseguradoras, que baseiam suas avaliações de risco na probabilidade de eventos ocorrerem ou não, quanto mais todos respeitarem o planeta, a sociedade e cumprirem as normas, menor será a probabilidade de os clientes precisarem acionar o seguro.

Isso, por sua vez, resulta em maiores lucros para as empresas de seguros. No entanto, também representa vantagens para os clientes que adotarem essa abordagem.

Investir em gerenciamento de riscos e buscar ações sustentáveis não é mais apenas um diferencial ao negociar programas de seguros, mas agora se tornou uma condição para obter seguro.

Um exemplo disso é a renovação do programa de seguros da Suzano, a maior produtora de celulose do mercado. Este é um dos três maiores contratos de seguros no país, com um limite de risco de US$ 1 bilhão. A Suzano possui 13 fábricas no Brasil, incluindo três consideradas como de “highly protected risk,” além de diversos portos e terminais intermodais, totalizando mais de 20 locais de risco em território brasileiro.

As negociações para a renovação do seguro começaram em junho e devem ser concluídas neste mês. A apólice entrará em vigor no início de novembro e terá uma validade de 18 meses, até abril de 2025. Até o momento em que este texto foi concluído, em 13 de outubro, tudo indica que o contrato será renovado com redução de taxas, de acordo com informações de pessoas próximas às negociações com resseguradoras no Brasil, em Miami, Londres e na China. A agenda incluiu a apresentação do risco para mais de 100 resseguradoras, das quais cerca de 50 demonstraram interesse em assumir uma parte do risco.

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Além das coberturas tradicionais de danos patrimoniais e lucros cessantes, o programa de seguros da Suzano inclui coberturas para obras de engenharia e mercadorias armazenadas nas fábricas, com uma cláusula de rateio que não se aplica. Isso torna o programa de seguros da Suzano um dos mais abrangentes do setor. As seguradoras e resseguradoras que participarem deste seguro terão preferência na contratação do seguro para a nova unidade fabril em Ribas do Rio Pardo, no Mato Grosso do Sul, que será a maior linha única de produção de celulose do mundo. A previsão é que comece a operar no primeiro semestre de 2024 e receba investimentos de R$ 20 bilhões, conforme informações divulgadas pela imprensa.

Renovar um contrato sem aumento de prêmio nos últimos dois anos é um grande feito em um cenário delineado por resseguradores em eventos como Monte Carlo, Mônaco, Fides Rio 2023 e na Associação Brasileira de Gerenciamento de Riscos (ABGR), que reúne os principais compradores de seguros corporativos do Brasil. Eles destacaram a importância da agenda ESG e apontaram as tendências para renovações em vários segmentos da economia, observando que o fim do ciclo “hard” está previsto apenas para 2025, a menos que surjam novas surpresas, como eventos climáticos graves, pandemias ou conflitos armados.

A abordagem ESG beneficia a Suzano devido à sua abordagem robusta e ao comprometimento da alta direção da empresa com essa agenda. O grupo informou em várias entrevistas que a remuneração variável de todos os gestores está ligada a metas de ESG. Além disso, uma grande parte da dívida da companhia está vinculada a esses indicadores, incluindo green bonds e Sustainability Linked Bonds (SLB).

A Suzano foi a primeira empresa do Hemisfério Sul a emitir dívida vinculada a esses indicadores e a segunda no mundo a fazê-lo. Antes disso, a Suzano já se destacava no mercado devido ao amplo uso de energias renováveis, já que gera toda a energia elétrica necessária para sua operação em suas fábricas e exporta o excedente para a rede elétrica brasileira, conforme apresentado a resseguradoras.

Corretores, resseguradores e subscritores enfatizaram em palestras durante os eventos que o mercado europeu já está mais avançado na agenda ESG e está selecionando segurados com base nesse critério. Afirmaram que ainda não é possível estabelecer um paralelo concreto entre descontos e ações ESG, mas agora todas as apresentações de riscos contam com a participação de especialistas em ESG para ajudar o subscritor de risco a decidir se aceitarão ou não o risco. Em resumo, quem não aderir a essa abordagem corre o risco de ficar sem seguro.

Samarco ainda paga ônus da devastação causada em Mariana (MG)

Outra notícia deste mês de outubro que destaca a importância da agenda ESG diz respeito à gestora americana Gramercy Fund Management e a maior tragédia ambiental do Brasil. A gestora anunciou um investimento de US$ 552 milhões no escritório londrino de advocacia Pogust Foodhead, que representa 720 mil pessoas afetadas pelo rompimento da barragem de Fundão da Samarco em Mariana, em 2015.

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Em junho deste ano, a Samarco fechou um acordo com suas parceiras Vale e BHP Billiton Brasil e seus credores financeiros para aprovar seu plano de recuperação judicial. Esse processo foi iniciado em abril de 2021, quando a empresa estava com uma dívida de R$ 50,5 bilhões. Mais de R$ 26 bilhões desse valor eram dívidas com fundos estrangeiros que haviam adquirido títulos da Samarco emitidos antes do acidente de 2015, que levou à suspensão das operações da mineradora. As dívidas com a Vale e a BHP totalizavam cerca de R$ 24 bilhões e consistiam em títulos de adiantamentos concedidos à Samarco desde 2015.

A ação coletiva movida pelo escritório Pogust pode resultar em indenizações superiores a 36 bilhões de libras esterlinas, de acordo com informações de agências internacionais. Em comunicado, a Gramercy Fund Management afirmou que apoiar litígios ambientais está alinhado com sua missão de trazer impacto positivo para seus clientes, empresas do seu portfólio e suas comunidades. A gestora também expressou orgulho em contribuir para buscar justiça em um dos piores desastres ambientais das últimas décadas.

Apesar dos altos valores de indenizações solicitados no Brasil e no exterior, há um limite máximo de cobertura estabelecido no programa de seguros da Samarco. Na época do desastre, a apólice foi segurada e ressegurada por empresas como Chubb, Mapfre, Swiss Re Corporate Solutions e Fairfax Brasil.

Empresas que adotam boas práticas ESG tendem a ter um custo de capital mais baixo, a atrair os melhores funcionários e a estar mais preparadas para enfrentar situações adversas, além de manterem sua relevância em um mercado em constante mudança. Investidores, analistas, profissionais e consumidores estão cada vez mais atentos a esses aspectos.

Como afirmou Antonio Trindade, presidente da Federação Nacional de Seguros Privados (FenSeg), durante um evento da ABGR, o consumidor final está avaliando as marcas com base em seu comprometimento com a agenda ESG. Há muito tempo, o ESG deixou de ser um diferencial e agora é uma condição de mercado. Quem não adotar essa abordagem corre o risco de ficar para trás, pois o bonde da história agora é elétrico e não mais movido a gasolina. Antonio Trindade é também membro do conselho da Chubb, uma das maiores seguradoras do mundo em riscos patrimoniais e de responsabilidades.

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Denise Bueno Jornalista especializada em seguros, resseguros, previdência e capitalização, é fundadora do blog Sonho Seguro

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