MP das Subvenções: parlamentares tentam afrouxar regras para empresas conseguirem crédito fiscal

MP é uma das principais apostas do governo para aumentar a arrecadação, mas enfrenta resistência no Congresso

Luís Filipe Pereira

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Após o governo editar a Medida Provisória 1.185/2023, que muda as regras para utilização do benefício fiscal vinculado a subvenções para empresas, especialmente as concedidas por estados e o Distrito Federal, parlamentares apresentaram 98 emendas com o propósito de afrouxar pontos do texto.

A MP é uma das principais medidas do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), para aumentar a arrecadação do governo federal, melhorar as contas públicas e atingir a difícil meta de zerar o déficit primário em 2024. Mas o impasse sobre a tramitação de MPs no Congresso Nacional — inclusive a das Subvenções — pode atingir a tramitação da proposta no Legislativo (veja mais abaixo).

A matéria que barra a concessão de incentivo tributário federal sobre subvenções estaduais para custeio de empresas foi editada no fim de agosto e não avançou desde então, por isso o governo deverá substituí-la por um projeto de lei com regime de urgência, o que provoca trancamento da pauta da casa legislativa em que estiver tramitando após 45 dias.

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A maioria das mudanças foi apresentada por parlamentares do Republicanos e do PL — partido que tem a maior bancada tanto na Câmara quanto no Senado e abriga grande parte da oposição ao governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), aponta levantamento feito pelo InfoMoney sobre as 98 emendas propostas, a partir de dados disponibilizados pelo Congresso Nacional.

Na outra ponta, não houve qualquer proposta de emenda de deputados ou senadores do PT.

Onze emendas foram apresentadas pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e outras oito, pelo senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR). Entre os mais participativos estão também os deputados federais Capitão Alberto Neto (PL-AM), Domingos Sávio (PL-MG) Túlio Gadelha (Rede Sustentabilidade-PE), com seis sugestões de alterações no texto cada um.

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É recorrente nas propostas analisadas a tentativa de parlamentares de dar mais previsibilidade à concessão de crédito fiscal e de tentar neutralizar o movimento do governo de exercer maior controle sobre as subvenções. Muitas propõem o estabelecimento de uma alíquota fixa de 34%, no caso das subvenções para investimentos, contemplando valores pagos a título de IRPJ (25%) e da CSLL (9%).

“A MP tal como redigida ignora toda a discussão e entendimento que se criou sobre a natureza dos incentivos fiscais, violando a segurança jurídica e, principalmente, os direitos dos contribuintes, por exceder demasiadamente os poderes de tributação pelo Estado, criando um cenário totalmente instável às empresas”, afirma o senador Flávio Bolsonaro em uma das justificativas protocoladas.

“Resta essencial que a apuração do crédito fiscal seja feita mediante o produto das receitas de subvenção e da alíquota do IRPJ, inclusive a alíquota adicional, e da alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido [CSLL] vigentes no período em que as receitas foram reconhecidas”, complementa o deputado federal Gilson Marques (Novo-SC).

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Norte e Nordeste

Representantes de empresas sediadas no Norte e Nordeste têm pressionado por uma definição de um prazo para o uso do crédito e entendem que o percentual proposto pelo governo para a concessão de crédito fiscal não é suficiente para contrapor a tributação federal, o que inviabilizaria novos investimentos.

A possibilidade de haver efeitos negativos para a Sudam e a Sudene, órgãos de fomento da Amazônia e do Nordeste, é outro entrave à tramitação da medida. Emenda proposta pelo deputado federal Capitão Alberto Neto, por exemplo, visa blindar subvenções para implantação ou expansão de empreendimentos econômicos concedidos nessas áreas.

Outra sugestão recorrente é a de suprimir o artigo 8º da MP, que diz que, na apuração do crédito fiscal, não poderão ser computadas receitas não relacionadas às despesas de depreciação, amortização ou exaustão relativas à implantação ou à expansão das atividades empresariais.

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Segundo o tributarista Rodrigo Borba, sócio coordenador do Araúz Advogados, a retirada deste ponto tem o objetivo de afastar a necessidade de comprovação de que os valores subvencionados tenham sido reinvestidos na implantação ou expansão das atividades, além de afastar a limitação da subvenção às despesas com a depreciação, amortização ou exaustão do empreendimento.

Diferença entre investimento e custeio

A medida editada pelo governo autoriza a Receita Federal a classificar as subvenções concedidas por União, estados, Distrito Federal e municípios e abre a possibilidade de empresas tributadas com base no lucro real apurarem o crédito fiscal só em subvenções para investimento, que são destinadas a implantar ou expandir empreendimentos. As subvenções para custeio não darão direito ao crédito fiscal.

O texto da MP também substitui o incentivo fiscal, hoje viabilizado por meio de exclusão de base de cálculo de tributos federais (IRPJ, CSLL, Contribuição para o PIS/Pasep e Cofins), por incentivo concedido mediante crédito fiscal, que poderá ser utilizado para compensar outros débitos ou ressarcido em dinheiro.

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“A ideia é diferenciar os casos em que o incentivo fiscal servirá para custear as atividades ordinárias da empresa daqueles em que o incentivo servirá para viabilizar investimentos extraordinários”, afirma o advogado Pedro Lameirão, sócio da área de Direito Tributário do BBL Advogados. “O princípio por trás disso é que o incentivo fiscal não deve objetivar o aumento do lucro do empresário, mas sim o aumento da atividade econômica, revertendo de forma positiva para a sociedade”.

Segundo o governo, as receitas de subvenções efetuadas pelo poder público vão passar a compor as bases de cálculo do IRPJ, CSLL, Contribuição para o PIS/Pasep e Cofins a partir de 1º de janeiro de 2024. Elas devem alcançar potencial de arrecadação de R$ 35,3 bilhões em 2024, 32,4 bilhões em 2025, R$ 34,1 bilhões em 2026 e R$ 36,1 bilhões em 2027.

“Ao pretender equiparar diversos benefícios concedidos pelos estados relacionados ao ICMS a subvenções governamentais para investimento, os dispositivos promulgados causaram distorções tributárias, com impactos profundamente negativos para a arrecadação federal, além da insegurança jurídica e do aumento de litigiosidade tributária”, afirma o texto anexo à MP assinado por Haddad.

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“A concessão de benefícios em caráter geral ou de forma incondicionada pelos estados e pelo Distrito Federal, com decorrente redução das bases de cálculo de tributos federais, provoca impacto fiscal negativo na ordem de R$ 80 bilhões (oitenta bilhões de reais) ao ano, segundo estimativa realizada pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil”, conclui o ministro.

Dificuldades no Congresso

Em meio às dificuldades para fazer a medida avançar no Legislativo e com tantos pontos de resistência, o governo avalia encaminhar um Projeto de Lei (PL), com teor similar e pedido de urgência, para o Parlamento. “Apesar da importância do tema para o governo e para as questões fiscais de 2024, o tema hoje está totalmente congelado dentro do Congresso”, afirma o coordenador do time de análise política da Warren Rena, Erich Decat.

“Ao longo dos últimos meses temos visto o presidente da Câmara, Arthur Lira, se posicionar de forma bastante firme contra a discussão e votação de MPs. Ele defende que os temas de interesse do governo tramitem por meio de um Projeto de Lei”, diz Decat. “É uma forma de ampliar o protagonismo da Câmara. Em razão desse impasse, várias MPs acabaram perdendo a validade e se transformaram em PLs, como por exemplo a volta do voto de qualidade no Carf e a taxação dos fundos offshore”.