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Transparência radical: como a tese de Ray Dalio pode ser aplicada ao mercado brasileiro de fundos de investimento

Que o regulador do mercado no Brasil ao menos pense em modular os produtos para que fundos de investimento no exterior que cumprem as regras locais sejam flexibilizados para todos os perfis de investidores por aqui
Por  Francine Balbina -
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Uma das dúvidas recorrentes que recebo é por que não recomendo o fundo All Weather (AW) da Bridgewater Associates, uma das gestoras mais famosas do mundo, com US$ 138 bilhões sob gestão.

Para quem não conhece, ele é um dos fundos mais famosos de Ray Dalio, o fundador da gestora. Além de investidor, ele é filantropo e escritor com vários livros publicados, com destaque para “Princípios”, best-seller do The New York Times que já vendeu mais de 2 milhões de cópias.

Criado em 1996 com o intuito de gerir o patrimônio do próprio Dalio e de seu trust – recursos que sua família vai herdar quando ele falecer –, o All Weather (em tradução livre, “todos os climas”) está disponível aqui no Brasil nas plataformas das corretoras Vitreo e XP.

O nome do fundo foi inspirado na pergunta que Dalio procurou responder para criá-lo:

Qual portfólio é mais adequado para performar bem em todos os tipos de ambientes econômicos?

Ele chegou à conclusão que a resposta era:

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Um portfólio global e balanceado, estruturado para ser indiferente às mudanças nas condições econômicas, através de: alocação global, diversificação, paridade de risco e liquidez.

Ray Dalio reconhece que é quase impossível prever e acertar todos os cenários. Portanto, ele usa o fundo para montar uma carteira que cubra “todos os cenários”. Muitos executivos da Bridgewater dizem que o fundo opera com a ótica de uma carteira que funciona bem atualmente e funcionará bem daqui 20 anos.

Eu sou fã assumida de Ray Dalio e já tive a oportunidade de fazer diversas reuniões no escritório da Bridgewater, em Connecticut – infelizmente, não com o próprio Dalio, mas com alguns de seus brilhantes colegas. E foi nessas ocasiões que vi pessoalmente a aplicação de um dos seus princípios: a transparência radical dentro da gestora.

Como falo muito de Dalio, sou muito questionada sobre a recomendação do fundo, ou melhor, sobre a falta dela entre os fundos de investimento recomendados na minha série da Spiti, “Você, Investidor Global”.

O fundo AW só está disponível no Brasil para investidores profissionais, aqueles com mais de R$ 10 milhões em investimentos. Como sempre busco a democratização dos investimentos, não me parece coerente recomendar um fundo para investidores profissionais quando a grande maioria dos meus assinantes é de investidores e investidoras de varejo, ou seja, investidores comuns.

Obviamente, gostaria de ver uma versão do fundo All Weather e de alguns outros fundos disponíveis somente para investidores profissionais e institucionais, como o Hillhouse Capital, disponíveis para outros perfis de investidores aqui no Brasil.

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Mas, neste caso, acreditem, eu concordo com a CVM, nosso regulador, quando ela coloca uma régua alta para que se possa investir nesses produtos, já que o fundo domiciliado no Brasil vai investir 100% dos seus recursos em um fundo de investimento domiciliado nas Ilhas Cayman, com regras bastante flexíveis e sem praticamente nenhum monitoramento regulatório.

Aliás, esse tipo de fundo é muito comum no exterior. São os chamados hedge funds puros, primos dos nossos fundos multimercados, mas menos regulamentados. Além de serem formados de maneira privada, voltados para investidores mais sofisticados, eles não têm regra de cálculo de cota e liquidez, por exemplo. Há alguns anos, eram até conhecidos como fundos do “Wild Wild West”, uma analogia aos caubóis americanos que viviam em territórios sem leis.

As regras dos hedge funds estão todas explicadas no regulamento dos fundos, e eles têm muita flexibilidade: cabe ao investidor ou à investidora aceitar ou não os termos, pois os reguladores no exterior, no caso de hedge funds, pouco se envolvem com questões de obrigações de cálculo de cota diária ou de auditoria.

Enfim, entendo perfeitamente o porquê de esses fundos estarem disponíveis somente para investidores profissionais. No entanto, os fundos de investimento no exterior, conhecidos como fundos IE, aqueles que podem investir até 100% do seu patrimônio no exterior e estão disponíveis no Brasil para investidores qualificados, seguem outro tipo de regra.

Para poderem ser distribuídos para investidores qualificados no Brasil, aqueles com mais de R$ 1 milhão em investimentos, eles precisam investir em fundos com algumas características básicas, tais como:

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– Não pode haver alavancagem financeira;
– A liquidez dos ativos é diária, em geral;
– A cota é atualizada diariamente

Além de regras sobre custodiante local em jurisdição reconhecida, autoria e gestão de risco, e uma infinidade de outras obrigações, que normalmente são cumpridas através de um veículo UCITS (Undertakings Collective Investment in Transferable Securities), um regulamento padrão da Comissão Europeia que cria um regime harmonizado em toda a Europa para a gestão e venda de fundos de investimento em Luxemburgo.

A ironia aqui, no entanto, é que esses veículos UCITS são produtos para investidores de varejo na Europa e são altamente regulados, assim como nossos fundos locais.

Por conta disso, é inevitável que surjam certos questionamentos, como quais são as razões pelas quais nós não podemos aportar nesses fundos, uma vez que, no exterior, qualquer perfil de investidor tem acesso a eles, ou por quais motivos ficamos excluídos deles.

Assim, esta é a pergunta que faço ao nosso regulador, me apropriando de um dos princípios de Ray Dalio, o da transparência radical:

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“Por que não podemos aportar nos fundos que, na Europa, são para o varejo através de estruturas brasileiras e que cumprem todas as regras locais brasileiras?”

Aproveito para revelar um anseio meu – e, provavelmente, de muita gente: que o regulador reveja algumas de suas regras ou, pelo menos, pense em modular os produtos para que fundos de investimento no exterior que cumprem as regras de locais sejam flexibilizados para todos os perfis de investidores.

Ou que, ao menos, encontremos um meio-termo para auxiliar investidores e investidoras de varejo brasileiros a terem acesso aos melhores produtos globais.

Um abraço,

Fran Balbina

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Francine Balbina Especialista em investimentos globais da Spiti, formada em Relações Internacionais e pós-graduada em Consultoria Empresarial. Tem 15 anos de experiência em prestação de serviços de governança e compliance para gestores de investimentos independentes, assets, bancos, family offices e investidores institucionais globais. A expertise adquirida nos anos em que viveu nas Ilhas Cayman e em Nova York, bem como sua atuação na Irlanda, Luxemburgo, Londres, EUA, Hong Kong e Cayman são sua fonte de inspiração para trazer conteúdo que cobre todo o mercado financeiro internacional.

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