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Eleições presidenciais no Brasil sempre casaram com crise, insegurança e incerteza. Nos anos 50, a eleição de Juscelino Kubitschek de Oliveira foi marcada pela ameaça de impedimento da posse. Jânio se elegeu em meio à crise econômica e política que caracterizou o período final dos 50 anos em 5. E o processo eleitoral contribuiu para acirrar os ânimos e jogar lenha na fogueira da crise econômica. Jango não completou seu mandado e hoje se sabe que até mesmo as decisões sobre que generais assumiriam a presidência foram cercadas de conflitos e crises no interior do poder militar.
A eleição de Tancredo Neves, embora indireta, também foi cercada de insegurança: pairava no ar a ameaça de que uma vitória de Tancredo sobre o candidato oficial, Paulo Maluf, não seria “absorvida” pelo regime e até as negociações para assegurar a transição foram concluídas poucas horas antes da posse do vice-presidente eleito, José Sarney.
A Nova República, como era chamado o 1º governo civil, assumiu o país em meio à chamada crise da dívida externa, marcada pela desaceleração rápida do crescimento econômico — o que criava um ambiente de crise em uma sociedade acostumada ao crescimento — e pela elevação dos preços. A sucessão de pacotes de estabilização associada ao populismo do governo Sarney contribui para agravar tanto o estrangulamento externo como a inflação, que no final da década de 80 já era classificada como hiperinflação.
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Assim, a campanha eleitoral de 1989 se desenrolou nesse cenário de crise e instabilidade, e a despeito das promessas de todos os candidatos de domar o monstro inflacionário, todos os indicadores econômicos se deterioraram rapidamente devido à incerteza quanto ao futuro. Nos meses de eleição que antecederam a posse do 1º presidente eleito pelo voto direto desde 1962, foi notável a fuga de capitais devido à insegurança quanto à manutenção dos mecanismos de proteção da riqueza financeira que até então tinham tido certa eficácia para reter recursos na órbita financeira doméstica.
A campanha que elegeu Fernando Henrique Cardoso não foi diferente. O Real, recém implantado e ainda frágil, era fortemente ameaçado. De um lado, o governo Itamar, pressionado pelo velho clientelismo para abrir os cofres e favorecer a eleição de alguns aliados, enfrentava enormes dificuldades objetivas para manter em prumo o Plano de Estabilização. De outro, o discurso negacionista do então candidato Lula, que mobilizava sua base contra o Real, aumentava a incerteza e as dificuldades. Não há dúvidas de que o maior mérito do presidente Itamar foi ter resistido aos dois ataques e mantido a firmeza que era necessária para assegurar a estabilidade da moeda, maior conquista da sociedade brasileira no período pós-regime militar.
A campanha de 1998, na qual o Presidente Fernando Henrique foi reeleito, também foi cercada de incertezas criadas tanto pela crise externa como pela ameaça, real, de uma vitória do PT, que propunha desfazer o Real e negava todas as reformas estruturais que vinham sendo duramente implementadas. Os indicadores econômicos refletiam diretamente a insegurança que voltava a nublar o cenário e mais uma vez foi necessário um pulso forte para impedir que o “bolo desandasse”, como dizem as cozinheiras. A insegurança era tanta que permitiu ao candidato à reeleição utilizá-la em sua campanha, apresentando-se como aquele que tinha condições de gerenciar a crise. Venceu no 1º turno.
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Em 2002, mais uma vez, o período eleitoral foi marcado pela insegurança que representava a possibilidade de ascensão do PT ao governo, o que se refletiu em praticamente todos os indicadores de mercado. O dólar disparou e os recursos externos, até então relativamente abundantes, desapareceram da noite para o dia. A Carta aos Brasileiros, assinada pelo então candidato do PT à presidência, comprometia-se a promover uma transição sem rupturas, e que qualquer mudança seria fruto de uma ampla negociação nacional, conduzindo a uma autêntica aliança pelo país, a um novo contrato social, capaz de assegurar o crescimento com estabilidade.
Essa atitude, in extremis, foi tomada para tentar controlar a fuga dos capitais que ameaçava colocar o país de joelhos e conter remarcações preventivas de preços que já começavam a ocorrer e comprometiam o esforço de estabilização. A insegurança era tamanha que também se transformou em mote de campanha. De um lado, o candidato de oposição pregava que o medo não podia vencer a esperança e o da situação explorava o medo e se apresentava como aquele que asseguraria um futuro mais tranqüilo.
A Carta aos Brasileiros não foi suficiente para acalmar o mercado, e ao assumir a administração, Lula teve que adotar medidas fiscais e monetárias ainda mais fortes do que aquelas da gestão anterior. Também se deve notar que, pelo menos neste aspecto, a promessa foi cumprida: o ideário petista para a política econômica foi colocado de lado e a nova administração manteve — e até aprofundou— os principais eixos da estratégia que vinha sendo adotada, baseada na responsabilidade fiscal, câmbio flutuante e metas inflacionárias.
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No novo período eleitoral de 2006, a economia se encontrava em um bom momento, com inflação baixa alinhada à meta da política econômica. No entanto, as eleições transcorreram em um clima delicado. Na verdade, não havia crise, mas a economia continuava patinando em marcha lenta. O setor agropecuário enfrentava dificuldades, em razão de uma associação de fatores conjunturais e estruturais: problemas climáticos (que afetaram as lavouras da Região Sul), revalorização do Real, preços baixos das principais commodities produzidas no Brasil, endividamento elevado e a conhecida precariedade da infraestrutura e logística para o escoamento da produção. Embora localizada setorialmente, os indicadores de mercado refletiam certa percepção de insegurança e os candidatos perdiam tempo tratando da conjuntura em detrimento das questões realmente importantes para o futuro do país.
Nas eleições atuais, é notável constatar que os indicadores econômicos ignoram a campanha eleitoral e que o mercado não reflete insegurança em relação ao resultado das eleições. A sociedade tampouco está com medo do resultado. Isto demonstra que no decorrer das ultimas décadas as instituições democráticas brasileiras se fortaleceram, e que nem a sociedade brasileira nem os stakeholders internacionais parecem se preocupar com quem será o vencedor.
Parece estar claro para boa parte do País que conquistas como a estabilidade monetária e programas sociais distributivos são hoje patrimônio da Nação e que não estão em questão no jogo eleitoral. Se esta análise estiver correta, o segundo turno abre espaço para que os candidatos discutam os problemas centrais do país, apresentem suas concepções e propostas de como superar os entraves ao desenvolvimento sustentável, de como lidar com os problemas que afligem o dia a dia dos brasileiros, desde a segurança ao transporte, e de como construir o futuro promissor que todos desejam.
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Este artigo contou com a colaboração do Prof. Antônio Márcio Buainain, professor de Economia na Unicamp, além de pesquisador e professor do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), Programa de Políticas Públicas, Estratégia e Desenvolvimento (PPED), liderado pela UFRJ.
Adriana Vieira é mestre em Direito, doutora em Desenvolvimento Econômico pela Unicamp, pós-doutoranda no Instituto de Geociências da Unicamp e bolsista do PNPD/CAPES, além de pesquisadora associada do GEOPI, Bioen/Fapesp e INCT/PPED/UFRJ.
adriana.vieira@infomoney.com.br
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