Com US$ 340 bi sob gestão, Janus Henderson questiona se era excepcional para ativos dos EUA está perto do fim

Gestor de multiativos, Paul O'Connor aposta em fortalecimento europeu nos portfólios da asset na qual Bill Gross atuou até 2019

Lucas Bombana

SÃO PAULO – Desde meados de 2008, quando da última grande crise dos mercados antes da pandemia da Covid-19, a economia dos Estados Unidos vinha reinando como uma das mais sólidas entre os pares desenvolvidos, entregando retornos difíceis de serem batidos ao longo da década passada.

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Os estragos causados pelo coronavírus, contudo, fazem com que os investidores comecem a questionar se o período de dominância dos ativos americanos sobre os demais desenvolvidos seguirá da mesma forma daqui em diante, diz Paul O’Connor.

Ele é responsável por coordenar a alocação de aproximadamente US$ 4 bilhões na área de multiativos da Janus Henderson no Reino Unido, gestora responsável por um total de US$ 337 bilhões em ativos sob gestão.

Em entrevista por telefone ao InfoMoney a partir da matriz inglesa, O’Connor disse que uma presença majoritária dos Estados Unidos no portfólio, em detrimento à Europa, já não é mais tão óbvia como até o início da crise do coronavírus.

A maneira como a pandemia foi tratada pelo governo americano, em contraste à maior eficácia de grande parte dos líderes europeus, é uma das razões para o rearranjo geográfico que começa a se desenhar nos portfólios da Janus Henderson.

O risco despertado pelas eleições americanas, principalmente caso o pleito resulte em um Congresso rachado, também foi citado pelo gestor, na casa desde 2013 e com passagens anteriores pela consultoria global Mercer e pelo Credit Suisse.

Fundada em 1934, a Janus Henderson ganhou as manchetes nos últimos anos quando da chegada, em 2014, do renomado gestor Bill Gross, um dos fundadores da Pimco e outrora conhecido como o “rei dos bonds”. Gross ficou na Janus até fevereiro de 2019, quando anunciou sua aposentadoria.  

Um dos maiores fundos de ações sob gestão de O’Connor, o “International Opportunities Fund”, com US$ 1,4 bilhão em ações da Europa e da Ásia, recua 8,9% no primeiro semestre, contra uma queda de 11% do benchmark “MSCI All Country ex-USA”. Desde o início, seu retorno médio anualizado é de 7,5%, acima da alta de 5,4% do índice de referência.

Em relação aos mercados emergentes, o gestor diz que os enxerga de uma maneira “confusa e complicada”, com os países em estágios muito diferentes no ciclo da pandemia. No grupo, a principal aposta está na China, que, segundo o gestor, é um dos poucos países que deve registrar PIB positivo em 2020.

Em 30 de junho, a gestora, com sede em Londres e presença em 27 países, direcionava a maior parte (US$ 180 bilhões) dos ativos sob gestão para a renda variável, mas com carteiras relevantes também de renda fixa (US$ 70 bilhões) e na área de estratégias quantitativas (US$ 30 bilhões)

Confira a seguir os principais trechos da conversa.

Alocação no pós-crise

Nas últimas semanas, a Janus Henderson, que vinha até então surfando a onda de recuperação dos mercados principalmente por meio de fundos indexados (ETFs) de dívida grau de investimento, começou a migrar parte da alocação passiva para estratégias mais ativas, tanto na renda fixa como nas bolsas.

Ações de empresas de alta qualidade com perspectivas de crescimento no médio e longo prazo e títulos graus de investimentos parecem ser a melhor alternativa, na avaliação do especialista.

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Entre as principais posições do “International Opportunities Fund”, estão nomes como o da farmacêutica alemã Bayer, do conglomerado de mídia francês Vivendi e da chinesa de e-commerce Alibaba.

Ele reconhece, contudo, que os ativos defensivos já estão caros, e reforça a importância do “stock picking” para evitar “armadilhas” em papéis que podem parecer atraentes, mas com negócios pouco promissores.

Europa cada vez mais atraente

Para o investidor disposto a assumir um pouco mais de risco, O’Connor entende que os ativos do mercado europeu podem ser uma boa pedida para o momento.

Segundo o chefe de multiativos da gestora, a principal aposta dos fundos nos últimos anos, em termos regionais, foi claramente o mercado americano, “porque era o melhor lugar para se estar.”

Essa, contudo, é uma visão que tem começado a mudar. “O mercado europeu se tornou muito mais atrativo nos últimos meses, em termos relativos”, afirma O’Connor.

Pesa a favor da Europa neste momento, diz ele, a forma mais disciplinada com que a pandemia foi combatida na maior parte da região, tanto em termos sanitários, com um distanciamento social mais severo do que nos Estados Unidos, como também econômicos, com os países demonstrando maior união para a aprovação de medidas de socorro financeiro.

Outro ponto que beneficia o mercado europeu, afirma O’Connor, é o risco gerado pelas incertezas das eleições americanas. Para o gestor, até mais importante do que saber quem será o próximo presidente dos Estados Unidos, é entender como se dará a nova configuração do congresso a partir de 2021.

Se o governo ficar rachado entre democratas e republicanos, o risco aumenta, já que a aprovação de medidas importantes para a recuperação da economia se torna mais complexa, afirma o O’Connor.

Devido aos riscos eleitorais e do coronavírus, o gestor prevê que o nível de volatilidade dos mercados no último trimestre de 2020 ficará bem acima do observado nos três meses anteriores.

Sinal dos tempos

“A última década foi marcada como um período excepcional para o crescimento e para os ativos americanos, e temos notado o mercado começar a questionar se essa era está chegando ao fim.”

Sinais podem ser vistos no mercado de bonds globais, diz o gestor. Há 18 meses, afirma, os títulos americanos com duration de dois anos negociavam com prêmio ante os pares europeus e asiáticos, o que hoje não existe mais.

Os investidores estão indicando que não aceitam mais pagar um spread pelos papéis dos EUA, uma vez que o diferencial de crescimento em relação aos demais desenvolvidos começa a ser colocado em xeque, aponta o gestor da Janus Henderson. “O desempenho positivo do euro em 2020 é, em parte, por conta dessa nova percepção dos agentes.”

A moeda subia 5% em relação ao dólar no ano, até julho.

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Apesar da visão gradualmente mais construtiva para a Europa, no caso específico do Reino Unido, O’Connor está com um posicionamento underweight.

Em parte pelo combate pouco eficaz do governo ao coronavírus, mas principalmente pelo impacto negativo que o Brexit já causou, e ainda deve causar, à economia da região. “O Brexit só está jogando luz às fraquezas de uma economia que já está debilitada.”

Segundo O’Connor, o Reino Unido foi, entre os mercados desenvolvidos, o que registrou a maior queda na onda de revisões de PIB após a Covid-19. Em fevereiro, o consenso de mercado, diz o gestor, indicava um crescimento real da economia britânica ao redor de 2,5%, no biênio 2020/2021. Agora, a expectativa é de uma retração da ordem de 3% no intervalo, com uma queda de quase 9% neste ano, seguida de uma alta de 6% no próximo.

Dezembro de 2020 é, a princípio, a data limite para o término do Brexit, sem que o governo do Reino Unido tenha obtido qualquer avanço relevante nas negociações com os pares europeus, afirma O’Connor.

Emergentes na berlinda

Em relação aos mercados emergentes, o gestor diz não ser possível uma visão clara a respeito por enquanto, uma vez que eles estão em fases bastante diferentes no ciclo da pandemia.

Enquanto a economia chinesa tem mostrado resiliência, sendo possivelmente uma das poucas a registrar crescimento em 2020 e levando junto os emergentes que orbitam ao seu redor, o coronavírus ainda segue muito mais presente na América Latina, diz O´Connor.

“Os emergentes são confusos e complicados neste momento, porque há duas histórias bastante diferentes ocorrendo.”

E embora os preços estejam atraentes, em um cenário no qual poucos ativos estão baratos, uma recuperação pontual das moedas emergentes em relação ao dólar pode ocorrer no curto prazo, diz o gestor.

Por conta disso, ele tem optado por uma postura mais cautelosa, com recomendação neutra para os emergentes, mantendo apenas a parcela indicada pelos benchmarks globais.

Lupa na recuperação econômica

O’Connor não acredita que a recuperação em formato de “V” que se observou em algumas regiões nos últimos meses, e que é uma das responsáveis pela rápida recuperação dos mercados, prosseguirá no mesmo ritmo, o que vai exigir uma análise mais minuciosa dos gestores da Janus Henderson.

“Ainda teremos um comportamento bastante volátil dos indicadores econômicos, com implicações significativas para os mercados financeiros.”

A confiança de consumidores e empresários, que segue baixa mesmo onde a pandemia já foi debelada, mostra que o impacto econômico do coronavírus está longe do fim, afirma o gestor, lembrando que o poder monetário dos bancos centrais está perto do limite, restando somente a política fiscal contra um desaquecimento prolongado da atividade.

“Nenhum de nós vivenciou uma situação como essa antes, e não se sabe ao certo qual a melhor resposta para tantas questões.”

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