Inflação suave nos EUA reforça tendência de manutenção dos juros, mas cortes ainda estão distantes

Índice tem mostrado desaceleração, mas CPI em 12 meses ainda está muito acima da meta do Fed, o que sugere manutenção da cautela

Roberto de Lira

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A confirmação da desaceleração da inflação ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) nos Estados Unidos em outubro – a variação mensal ficou estável e a anual recuou de 3,7% para 3,2% em um mês – reforça a projeção de que o Federal Reserve terá motivos suficientes  para manter as taxas de juros no atual patamar em dezembro, opinam os economistas.

No entanto, eles argumentam ser preciso que a tendência se consolide com mais firmeza antes de a autoridade monetária sinalizar um ciclo de cortes a partir do ano que vem.

Um motivo para que a cautela defendida pelo presidente do Fed, Jerome Powell, prevaleça é que a velocidade da desinflação do núcleo ainda é baixa – essa medida passou de 4,3% em 12 meses até agosto para 4,1% em setembro e para 4,0% em outubro. O índice mensal foi de 0,2%, ante 0,3% em setembro.

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Claudia Rodrigues, economista do C6 Bank, reforça que o setor de serviços segue sendo o principal responsável por manter a inflação americana ainda longe da meta de 2%, com o mercado de trabalho ainda aquecido contribuindo para pressionar os custos. “Apesar do dado mais fraco em outubro, a inflação segue resiliente”, afirma.

Mesmo assim, a economista diz que os números divulgados hoje reforçam a visão de que o Fed não deve implementar mais uma alta de juros esse ano, principalmente se a próxima divulgação de inflação e de dados do mercado de trabalho continuarem mostrando uma desaceleração. “Acreditamos, no entanto, que cortes de juros só devem começar de forma gradual no fim de 2024, mantendo os juros americanos no maior patamar dos últimos 20 anos”, prevê.

Já o economista chefe da Suno Research, Gustavo Sung, considera que a boa notícia é que tanto a inflação cheia quanto o núcleo vieram abaixo das expectativas no mês. “Caso o núcleo mantenha essa trajetória baixista até a próxima reunião do Fomc, a tendência é de não termos mais elevações na taxa de juros”, afirma.

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No cenário base da Suno, não são esperadas mais altas pela frente, com a expectativa de manutenção da taxa entre 5,25% e 5,50% anuais na reunião de dezembro. Mas os cortes na taxa de juros só devem ocorrer só na metade de 2024, segundo Sung. “A taxa de juros deverá permanecer no pico por um bom tempo até que a inflação dê sinais de convergência para a meta de longo prazo”, diz.

Andressa Durão, economista da ASA Investments, por sua, viu informações benignas em vários itens em outubro, com destaque para aluguéis, veículos e passagens aéreas. “Houve surpresa baixista relevante em itens de serviços, que impactam o ‘supercore’, importante para a política monetária. Ainda assim, a inflação de serviços segue resiliente e parte da surpresa pode ser revertida em novembro em itens relacionados a viagens”, alerta.

Andressa lembra que já houve alguns sinais de que o Fed não quer mais subir juros e que o dado de hoje contribui com o discurso de que a política monetária está fazendo efeito. “Ainda esperamos que a inflação permaneça acima da meta por um tempo, o que forçará o Fed a manter porta aberta para futuras altas. O Fomc deve focar no ‘higher for longer’ e não comentará sobre início do ciclo de queda”, acredita.

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Danilo Igliori, economista chefe da Nomad, comenta que o resultado do CPI de outubro se beneficiou da queda dos preços nos combustíveis, enquanto outros itens de energia e despesas com habitação aceleraram um pouco no mês passado.

“Os dados do CPI de outubro, marginalmente abaixo das expectativas de mercado, devem reforçar as expectativas de que o Fomc vai manter a taxa de juros no nível atual e encerrar o ciclo de alta. Na mesma direção, o fato de o núcleo continuar desacelerando terá peso na decisão”, afirma.

Momento de cautela

Matheus Pizzani, economista da CM Capital, no entanto, pondera que, apesar de o dado quantitativo ter sido melhor que o esperado pelo mercado, a análise qualitativa do indicador se torna ainda mais importante do que em situações comuns.

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Ele lembra que esse indicador foi o primeiro a ser divulgado após a fala do presidente de Jerome Powell, que no final da semana anterior afirmou que a inflação estaria dando sinais enganosos de arrefecimento. E também que as métricas efetivamente acompanhadas pelo Fomc não davam sinais tão positivos como a interpretação do mercado estava sugerindo.

Um exemplo desse cuidado, segundo Pizzani foi a contribuição dos preços da energia para o headline do CPI, que voltaram para o terreno recessivo após quatro meses consecutivos de crescimento, com uma retração de 2,5%. Nesse caso, a gasolina apresentou a queda mais intensa do período (-5%).

Mas ele destaca que esse efeito não chegou a ser sentido no preço dos serviços de transporte, que apresentaram crescimento marginal entre setembro e outubro, saindo de uma alta de 0,7% para 0,8%.

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“Excluída a hipótese de que o aumento de preços foi causado por pressões de custo, com o preço dos combustíveis sendo o principal componente, resta atribuir à demanda ainda aquecida o motivo pela variação, algo que não traz sinalização positiva para o núcleo da inflação e, consequentemente, para a política monetária como um todo”, explica.

“Em linhas gerais, o dado de hoje reforça a cautela sugerida por Powell na semana passada quando da análise dos indicadores de inflação”, afirma. Para o economista, o comportamento dos componentes do núcleo ainda não sugere um processo consolidado de desinflação em curso

Já Damanick Dantes, estrategista da gestora norte americana Global X, afirma que o dado do núcleo da inflação, com preços mais baixos em todos os níveis, é encorajador para os mercados e provavelmente significa que um aumento de juros em dezembro está fora de questão.