Copom faz o esperado, mas adota tom duro em comunicado ao reforçar preocupação com inflação, apontam economistas

Comitê enfatiza em comunicado que irá perseverar na sua estratégia até consolidar a desinflação e ancorar as expectativas

Lara Rizério Mitchel Diniz

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Em um cenário de inflação galopante, mas de recessão técnica, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu por uma nova alta de 1,50 ponto porcentual da Selic (a taxa básica de juros) nesta quarta-feira (8), com a taxa indo de 7,75% para 9,25% ao ano, em linha com o que já havia indicado o Copom na última reunião, em outubro.

Foi o sétimo movimento consecutivo dos juros, após o BC cortar a taxa básica à mínima histórica (2%) em meio à pandemia de covid-19. Com a decisão de dezembro, o choque de juros este ano chega a 7,25 pontos porcentuais, o maior em quase 20 anos – desde o ciclo entre o fim de 2022 e o início de 2003. E a Selic alcançou o maior patamar desde 2017, quando estava em um ciclo de afrouxamento após alcançar 14,25% em meio à crise de 2015 e 2016.

Para economistas consultados pelo InfoMoney, ainda que a decisão tenha vindo em linha com o esperado e a atividade econômica esteja fraca em meio a seguidos dados abaixo do esperado, o comunicado do Copom que seguiu o comunicado trouxe mais elementos hawkish (mais duros com relação à inflação), mostrando que o Comitê está mais preocupado com a alta da inflação.

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João Leal, economista da Rio Bravo Investimentos, destaca a indicação do Copom que irá perseverar na estratégia até consolidar a desinflação e ancorar as expectativas, sinalizando também que colocará o juro em patamar “significativamente contracionista”. “Foco é inflação, atividade é secundária nesse momento”, complementa.

Um ponto destacado é que o BC relevou a desaceleração da economia, “afirmando que está moderadamente abaixo do esperado”. Conforme avaliou Thais Zara, economista-sênior da LCA Consultores, em live do InfoMoney (veja na íntegra acima), o Comitê não sinalizou que dados ruins de atividade tenham afetado balanço de riscos.

Thais destaca ainda que houve uma ênfase maior do comunicado foi em relação ao setor externo. Isso em meio à indicação de que alguns bancos centrais das principais economias expressaram claramente a necessidade de cautela frente à maior persistência da inflação, tornando as condições financeiras mais desafiadoras para economias emergentes. Além disso, a possibilidade de nova onda da Covid-19 durante o inverno e o aparecimento da variante Ômicron adicionam incerteza quanto ao ritmo de recuperação nas economias centrais.

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Já Patricia Pereira, estrategista-chefe da MAG Investimentos, destacou também durante a live que avalia ser importante acompanhar a ata do Copom a ser divulgada na semana que vem para entender se o BC vai manter a indicação do documento anterior de que vai perseguir cumprir o teto da meta de inflação de 2022, de 5%, ou se perseguirá um horizonte de um prazo mais longo, para 2023. A projeção é de um IPCA de 4,70% no ano que vem, dando pouca margem de manobra para o BC para cumprir a meta, ainda mais em um ano bastante desafiador com eleições.

A XP também aponta que o comunicado trouxe uma previsão de inflação acima do esperado para 2022 (de 4,7%) e para 2023 (3,2%), mesmo com um corte significativo na previsão de inflação dos preços administrativos para 2022 (ou seja, a previsão da inflação dos preços de mercado aumentou significativamente).

Entre os elementos hawkish do comunicado, o Copom afirmou que “é oportuno avançar de forma significativa (palavra que foi adicionada em relação ao último documento) o processo de aperto monetário no território restritivo”.

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“O acréscimo do termo ‘significativamente’ sugere, a nosso ver, que o Copom agora vê uma taxa terminal mais elevada do que a observada em sua última reunião”, avalia a equipe de análise econômica da XP.

O Comitê também acrescentou em relação ao comunicado anterior que “irá perseverar em sua estratégia até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas”. “A nosso ver, a recente alta nas expectativas de inflação para 2022 e para além desse horizonte está de fato incomodando o Comitê”, aponta.

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Já do lado dovish (brando, de flexibilização monetária), a XP aponta que o Copom não mudou sua avaliação no front fiscal, apesar da recente aprovação de parte da PEC dos Precatórios no Congresso.

Além disso, o Copom visa agora a “convergência” da inflação para a trajetória de metas, ao invés de “cumprir” a meta (sinalizando que o Comitê reconhece que cumprir a meta em 2022 exigiria um sacrifício exagerado).

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Para o Goldman Sachs, o BC fez uma “inovação” ao já antecipar um cenário de inflação bastante desafiador em 2022, citando a busca pela convergência da inflação para as metas “ao longo” do horizonte relevante, ao invés da convergência para as metas “nos” horizontes relevantes de 2022 e 2023.

“Em nossa avaliação, este é o reconhecimento tácito de que, apesar de uma postura e disposição hawkish, a inflação provavelmente ainda estará visivelmente acima do ponto médio da meta de inflação de 3,50% no final de 2022″, ressalta.

Ainda em ciclo de alta

O Goldman projeta outro aumento de 1,5 ponto na reunião do início de fevereiro de 2022, para 10,75%, e uma taxa Selic terminal entre 11,75%  e 12% no final do primeiro trimestre de 2022, com cortes modestos previstos para o final de 2022.

Para a XP, a decisão desta noite está de acordo com o cenário de que a taxa Selic chegará a 11,5% ao final do ciclo de aperto monetário, até 22 de março. “O tom hawkish traz risco de alta para essa projeção, ainda que: i) o Comitê tenha reforçado o ritmo de alta de 1,5 ponto para a próxima reunião; e ii) acreditamos que a desaceleração da atividade econômica se intensificará no futuro, levando o Comitê a reduzir o ritmo na reunião de março para 75 pontos-base”, avalia.

Thais Zara, por sua vez, projeta mais uma alta de 1,5 ponto na próxima reunião e mais 1 ponto em março de 2022, levando a taxa para 11,75%, permanecendo neste patamar até o final do ano.

Para Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, que também vê um comunicado mais duro do BC com relação à inflação, o BC ainda deve fazer mais uma alta de 1,5 ponto na reunião de fevereiro e, a partir daí, “pode mudar a mão de uma postura hawkish para mais dovish na reunião posterior, para fazer uma alta final em um ritmo menor”.

O Bradesco BBI avalia que o Copom se mostrou comprometido em levar a inflação para a meta, mas mantendo um passo seguro ao caminhar em um ritmo sólido sendo que, embora o IPCA ainda tenha mostrado pressões generalizadas nas últimas divulgações, a atividade econômica continuou decepcionando nos dados recentes, sugerindo que as pressões de demanda sobre a inflação podem diminuir em algum momento.

“Por ora, continuamos esperando que a Selic alcance um pico de 11,5% no primeiro trimestre, com mais duas altas, de 1,5 ponto e 0,75 ponto (para 11,5%), sendo reduzida para 10,5% no final do ano 2022 com o fim de algumas incertezas”, avaliam os economistas do banco.

O Itaú BBA, por sua vez, manteve a previsão de que o fim do ciclo de alta deve culminar com a Selic a 11,75% ao ano, o que é consistente com as projeções apresentadas no comunicado de alta de 1,5 em fevereiro e de 1 ponto em março. Contudo, avalia que se saberá mais sobre o fundamento da decisão do BC na próxima terça-feira, com a divulgação da ata do Copom. Além disso, será divulgado na quinta-feira o Relatório Trimestral de Inflação de dezembro, que aprofundará a visão das autoridades.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.