Para economistas, grande dúvida é se Copom mudará a orientação para as próximas reuniões

Nos últimos encontros, o chamado "forward guidance" do BC apontou para novas quedas de 0,50 p.p. nas "próximas reuniões"

Roberto de Lira

Reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil. Foto: Raphael Ribeiro/BCB

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Ainda que seja difícil encontrar algum economista ou analista de mercado que acredite na possibilidade de o Banco Central do Brasil acelerar o ritmo de cortes na taxa de juros no curto prazo, alguns já passaram a perguntar se não teria chegado a hora de uma mudança na orientação futura (o chamado “forward guidance”) da autoridade monetária. A expectativa praticamente unânime dos especialistas é que o Copom decida em sua reunião desta quarta-feira (13) reduzir a Selic em 50 pontos-base, para 11,75% ao ano.

Nas últimas reuniões, após o cortes de 0,50 ponto percentual, os membros do Copom optaram por inserir na comunicação pós-decisão a orientação de que, em se confirmando o cenário econômico esperado, a tendência era de uma  “redução de mesma magnitude nas próximas reuniões”, avaliando que esse seria o ritmo apropriado para manter a política monetária contracionista necessária para o processo desinflacionário. Ou seja, na reunião de novembro, foram contratadas quedas iguais ao menos em dezembro e no final de janeiro.

Para Eduarda Schmidt , economista da Órama Investimentos, pode ter chegado a hora de um ajuste nessa comunicação. “Vemos que uma comunicação mais ‘dove’, com uma sinalização para a aceleração na magnitude dos cortes da Taxa Selic a partir de março, seria coerente diante do atual quadro econômico brasileiro”, sugere.

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Ela afirma que essa sinalização tanto pode ser explícita como apenas colocando o ‘forward guidance’ no singular, trocando a expressão “próximas reuniões” por uma versão no singular, referindo assim apenas à reunião de janeiro.

“Apesar de ambas abrirem espaço para uma queda mais forte no segundo encontro do ano, passam mensagens diferentes. A primeira pode trazer um ganho institucional, antes da substituição de dois diretores, alinhando o discurso e o compromisso em trazer a inflação para a meta entre as composições do Comitê. Enquanto, deixar apenas ‘próxima reunião’ reduz o comprometimento com a mudança de ritmo e traz a ideia de ‘data dependent’, estratégia que vem sendo utilizada pelo Fed em suas comunicações”, explica Eduarda.

Sobre como a economia se comportou desde a última reunião do Copom, a economista da Órama, afirma não ter notado mudanças relevantes. “A conjuntura internacional melhorou em relação ao último encontro, com forte recuo nos rendimentos dos juros de longo prazo (nos EUA). Contudo, ainda existem incertezas quanto à resiliência da economia americana, principalmente no mercado de trabalho, após a divulgação de mais um payroll acima do esperado.

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Eduarda diz perceber, no entanto, que a resiliência do mercado de trabalho e as expectativas de inflação ainda desancoradas no Brasil, além de um possível descompasso com o Fomc, diminuem o incentivo do Comitê para a elevação no ritmo no curto prazo.

“Desse modo, enxergamos que o cenário é propício para uma permanência do ‘forward guidance’ em relação ao atual ritmo de cortes para as próximas reuniões, que inclui as duas primeiras de 2024, e esperamos um comunicado neutro.

A visão da XP Investimentos é similar. No relatório “Esquenta do Copom”, assinado pelo economista chefe Caio Megale e por Rodolfo Margato e Alexandre Maluf, a observação é que as notícias foram benignas para a inflação de curto prazo desde que os integrantes do Copom se reuniram pela última vez, em 1º de novembro.

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“As taxas de juros mais longas nos países desenvolvidos e os preços do petróleo recuaram. Além disso, a inflação corrente continuou em queda, com abertura favorável. Por outro lado, os resultados do PIB do 3º trimestre vieram acima das expectativas e sinais recentes reforçaram o viés expansionista da política fiscal”, diz o texto.

Embora reconheçam a possibilidade de o Copom optar por limitar o “guidance” nesta reunião – retirando o plural da frase ou até mesmo decidindo não fornecer orientação alguma, retirando a frase inteira -, os economistas da XP acreditam que o Comitê irá ajustar apenas levemente o comunicado pós-reunião.

“O viés expansionista da política fiscal foi reforçado recentemente. Nesse cenário, não vemos razão para o Copom antecipar a flexibilização monetária. A autoridade monetária deve seguir argumentando que o ritmo de corte de juros de 0,50 p.p. por reunião é o adequado”, prevê a XP.

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Para os economistas, atividade econômica vem de fato perdendo força, mas permanece relativamente sólida, com as expectativas de inflação ainda acima da meta. E as taxas de juros de longo prazo nos mercados desenvolvidos recuaram nas últimas semanas, mas ainda estão consideravelmente acima dos níveis observados no primeiro semestre do ano.

Sobre as estimativas para a inflação, a XP acredita que BC divulgará projeções de IPCA um pouco mais baixas para 2023 (de 4,7% para 4,5%) e 2024 (de 3,6% para 3,5%), sem alterar a projeção para 2025 (de 3,2%).

A projeção é que a taxa Selic feche o ano em 11,75% no final de 2023, após um novo corte de 50 p.p. nesta quarta-feira, e em 10,00% no final de 2024, uma taxa aliás acima do consenso de mercado.

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Copom amarrado?

Já Rafaela Vitória, economista chefe do Banco Inter, acredita que, com a queda da inflação maior que o esperado no curto prazo, a Selic ficou em patamar ainda mais restritivo e haveria espaço para cortes maiores. “Seria apropriado no comunicado o Comitê se desfazer do ‘guidance’ que amarra as discussões dos próximos passos e ancora as expectativas de queda da Selic em um ritmo que talvez esteja lento demais para o patamar de inflação que vemos hoje”, argumenta.

Segundo ela, no longo prazo, as expectativas de inflação acima da meta podem limitar a Selic terminal, mas no curto prazo há espaço ainda para cortes mais significativos. “Poderíamos chegar na taxa de 9% mais próximo do meio do ano, com cautela suficiente para monitorar o risco fiscal e eventual aceleração da inflação ao longo do próximo ano”, defende.

Marco Antonio Caruso, economista chefe do PicPay, enxerga que, desde o último Copom, houve uma “acalmada na discussão de juros altos por mais tempo”, além de uma melhora das condições de contorno da inflação no exterior, retirando um pouco da pressão que a curva longa exerce em economias emergentes como a nossa. Segundo ele, isso acabou aparecendo lá fora no câmbio e nos preços de petróleo.

Caruso destaca que o PIB mais fraco, a inflação doméstica mais bem comportada e o ambiente externo melhor, trabalha para expectativas de inflação mais baixa. Assim, os analistas têm discutido se isso pode fazer com que o Copom opte por ganhar graus de liberdade na sua comunicação e parar de amarrar suas mãos para as próximas duas decisões.

“Hoje, o ‘guidance’ que o Copom vem dando é: cortei 0,50 p.p. e para as próximas vejo a priori uma nova queda de 0,50 p.p. O BC sempre sinalizava pelo menos duas reuniões à frente com o mesmo ritmo de cortes. Dado que há essa melhora das condições de contorno, será que o Copom vai querer se desamarrar um pouco ou abrir a porta para uma possibilidade de mudança no ritmo, para 0,75pp? A novidade poderia vir daí”, comenta.

Mas Caruso acredita que o Copom ainda parece confortável com o atual ritmo de cortes e, a princípio, prefere não fazer esse tipo de compromisso. “O Copom prefere olhar como o cenário se desenvolve nesse ritmo, não me pareça que já tenha espaço suficiente para, quem sabe, ver uma redução de 0,75 p.p.

Ele alerta, no entanto que essa leitura vale para o comunicado. “Para a ata, quando muitas vezes abre mais espaço para “divergências” entre diretores e é um documento maior, talvez possa aparecer a discussão a respeito de mudar o ‘forward guidance’ de sempre falar em 0,50 p.p. nas próximas reuniões”, pondera.

Danilo Igliori economista-chefe da Nomad, também se mostra cético sobre o BC fazer uma mudança muito grande em sua comunicação. “Tudo indica que a decisão de cortar 0,5 ponto percentual será acompanhada de comunicado reforçando que este será o ritmo nas reuniões seguintes. Mas vale ficar atento em como temas fiscais, expectativas de inflação e cenário internacional serão abordados”, afirma.

Felipe Salles, economista chefe do C6 Bank, aposta que a comunicação deve retratar o alívio registrado no cenário internacional desde a última reunião, com a queda das taxas de juros de mercado nos EUA e o enfraquecimento global do dólar. Além disso, ele prevê que a continuação da queda da inflação doméstica deve dar conforto ao Comitê de continuar sinalizando cortes de juros nas próximas reuniões.

Para ele, as previsões de inflação do Banco Central não devem sofrer alterações relevantes, o que sugere a manutenção do plano de voo da autoridade monetária. “Acreditamos, por ora, que o BC deve manter o ritmo de corte de juros de 50 pontos-base ao longo da primeira metade do ano que vem. Projetamos a Selic em 11,75% ao final de 2023 e em 9,25% ao final de 2024.”

Rafael Cardoso, economista-chefe da Daycoval Asset, acredita que o BC ainda deve continuar comunicando que a desaceleração da atividade econômica como um todo segue conforme o esperado, mas que, dado o mercado de trabalho ainda resiliente, o comitê deve manter a atenção aos desdobramentos futuros deste segmento. “Neste sentido, o comitê deve manter o balanço de riscos simétrico, dando mesmo peso aos itens que podem levar a inflação para baixo ou para cima no horizonte relevante”, avalia.

“Será importante também acompanhar qual será a avaliação do comitê sobre os recentes desenvolvimentos no campo fiscal, sobretudo pela sua importância para a reancoragem das expectativas de inflação.”

Cardoso também diz que o ponto mais relevante do comunicado será a sinalização sobre o plano de voo do Comitê. “Nossa expectativa é que mantenham a sinalização de que atual ritmo de cortes de juros é o apropriado para as próximas duas reuniões”, estima.

Gino Olivares, economista chefe da Azimut Brasil Wealth Management, também comenta que mercado tem especulado sobre a possibilidade de o Copom mudar sua comunicação, em direção a uma postura mais “flexível”. Mas ele lembra que o colegiado já sinalizou claramente que uma eventual mudança de ritmo, no sentido de acelerar os cortes, dependeria de avanços significativos em três frentes: ancoragem de expectativas de inflação, comportamento da inflação de serviços e grau de ociosidade da economia.

“A rigor, houve apenas melhoria na parte da inflação de serviços. As expectativas de inflação de 2024 em diante continuam acima da meta e as próprias estimativas do grau de ociosidade do BC têm sido recorrentemente revistas no sentido de mostrar uma ociosidade menor. Assim, acreditamos que o Copom deverá manter o diagnóstico de que o ritmo de 50 pontos-base por reunião continua sendo a melhor estratégia para levar a inflação de volta às metas.”

Para o Bank of America (BofA), a melhoria das condições financeiras no exterior e a evolução da orientação orçamental interna até apoiam a continuação do ciclo de flexibilização, mas a atividade mais forte do que o esperado e a incerteza em torno do cumprimento das metas fiscais futuras impedem qualquer mudança no ritmo dos cortes nas taxas.

“A orientação deve se limitar apenas às próximas reuniões. Esperamos que o BC mantenha o plural ao se referir à expectativa para as próximas reuniões. E o Comitê deve destacar a incerteza do lado externo para manter o ritmo de flexibilização monetária, apesar as condições internas favoráveis”, diz o banco de investimentos em relatório.

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