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Embora seja praticamente uma unanimidade no mercado financeiro que o Comitê de Política Monetária (Copom) vai iniciar nesta quarta-feira (2) um ciclo de corte de juros, pondo fim à fase de aperto iniciada em março de 2021, há divergências sobre a velocidade do ajuste a ser implementado. Basicamente, as projeções estão divididas entre dois grupos de analistas.
Para os economistas de grandes bancos e corretoras, o Banco Central manterá o discurso de parcimônia, iniciando o novo ciclo com um corte moderado, de 25 pontos-base (ou bp), colocando a Selic em 13,50%. Mas os gestores e operadores do mercado já têm se posicionado há algumas semanas a favor de uma redução de 0,50 ponto percentual (p.p.), para 13,25%, conforme aponta a curva futura de juros.
Esse movimento de precificação no mercado de juros tem ganhado força desde a última reunião de política monetária, em 21 de junho. As apostas nesse sentido foram incrementadas após a decisão do Conselho Monetário Nacional (CMN), no final de junho, que manteve a meta de inflação em 3% para os horizonte de 2024 e 2025, estendendo ainda o objetivo para 2026.
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Além disso, o IPCA de junho (anunciado em julho) mostrou deflação de 0,08%, com o IPCA-15 de julho mantendo a tendência, ao registrar -0,07%, conforme divulgado pelo IBGE na semana passada. Para completar a leitura de que uma queda maior é possível, na última sexta-feira o Banco Central do Chile surpreendeu o mercado local, cortando sua taxa em 1 ponto percentual, quando a mediana das projeções era de um corte já ousado de 0,75 ponto.
Segundo comentário de analistas, a decisão final depende muito de qual variável recente será levada em conta pelo colegiado do Banco Central e também de qual leitura de tendência está sendo feita.
Em uma live da Nord Research na semana passada, Fabio Kanczuk , head de Macroeconomia da ASA Investments, comentou que a decisão do Copom é tomada numa ponderação entre o balanço de riscos e as preferências de cada diretor. “Tanto na minha época como agora, vai ter gente que vai olhar a mesma situação, os mesmo números, e vai ter uma visão mais pessimista ou mais otimista”, disse o economista, que ocupou a diretoria de Política Econômica do BC entre 2019 e 2021.
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Ele comentou ainda que acredita que alguns diretores podem até votar por uma manutenção da taxa, citando que a desancoragem para 2025 ainda está alta, enquanto outros devem votar por corte de 0,50%, por conta dos efeitos dos juros na economia. Assim, não seria surpresa se o BC fizer uma opção de consenso, com um corte de 25 pontos-base.
A Warren Investimentos, por sua vez admite que há uma probabilidade relevante de o BC optar por um corte de 0,50 ponto percentual, mas que um ajuste inicial de -0,25 p.p. seria “bem mais coerente com a clara sinalização anterior do Comitê de cautela e parcimônia na condução da política monetária”. Além disso, ajudaria a conter um “excesso de otimismo” no mercado de juros.
Sobre os motivos que embasam a crença do início de cortes, as leituras são similares em todas as análises: em especial o recuo das expectativas de inflação e a continuidade do processo de desaceleração dos núcleos.
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Mas, para a Warren, o processo de reancoragem das expectativas foi apenas parcial, a inflação de serviços ainda se mostra resiliente e os dados robustos de mercado de trabalho podem limitar um processo de desinflação mais rápido. Vem daí, a projeção mais conservadora para os juros.
Já o Bank of America (BofA), reforçou sua estimativa de corte de 0,50 ponto na semana passada, após a divulgação do IPCA-15, que apontou deflação de 0,07% em julho, com o registro de desaceleração também na inflação de serviços e nos núcleos mais acompanhados pelo Banco Central.
“Dada a dinâmica positiva das medidas subjacentes de inflação, a desaceleração dos principais serviços e principais produtos industriais, a revisão para baixo das expectativas de inflação de 2025, preços mais baixos das commodities, moeda apreciada e desaceleração da atividade econômica, mantemos nosso call de corte de 50 bps na Selic”, disse o banco de investimentos em relatório.
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A leitura foi similar à feita pelo sócio fundador e diretor de investimentos da Persevera, Guilherme Abbud em entrevista ao InfoMoney. Ele disse que, após o IPCA-15, fazia “pouco sentido econômico” em realizar um corte de apenas 0,25 ponto percentual na reunião de agosto.
“Uma queda de 0,25 em cima de uma Selic de 13,75% é meio que nada. Demoraria mais 45 dias para vir o próximo corte. Acho que o BC começará com 0,50 p.p., apesar de não ser o costume”, disse na semana passada.
Nos cálculos da Persevera, a inflação cheia deve encerrar este ano em 4,5% e a casa espera que a Selic recue para 11%, abaixo do esperado pelo mercado no Boletim Focus, que projeta a taxa básica de juros em 12% ao fim de 2023, conforme divulgou o BC na segunda-feira (31).
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Já a Warren destacou em sua análise que na reunião anterior do Copom, em junho, houve divergência no Comitê em torno do grau de sinalização em relação aos próximos passos. “A avaliação predominante foi de que a continuação do processo desinflacionário em curso poderia permitir acumular a confiança necessária para iniciar um processo parcimonioso de inflexão na próxima reunião, enquanto outro grupo se mostrou mais cauteloso”, destacou o relatório da casa de investimentos, citando a Ata da reunião.
Segundo essa análise, no passado, o termo “parcimônia” foi associado a um ajuste de 25 bps da taxa Selic. “Um ritmo inicial de -50 bps provavelmente levaria o mercado a precificar uma probabilidade maior de aceleração para um ritmo mais intenso (75 ou 100 bps) nas próximas reuniões, o que poderia atrapalhar o processo de reancoragem das expectativas e levar a uma queda mais forte do juro real de um ano”, alertou a Warren.
O texto conclui que um ajuste da Selic mais agressivo na largada poderia alimentar os temores de uma política monetária mais leniente – ainda mais com as mudanças na composição da diretoria – e interromper ou mesmo reverter esse processo. “Como foi alertado na reunião do Copom de junho, flexibilizações prematuras podem ensejar reacelerações do processo inflacionário”, diz a análise.
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Queimando a largada?
A leitura do Itaú é muito parecida. Para o banco, não observar a cautela defendida nas últimas comunicações poderia ser visto como “queimar a largada”. Análise assinada por Julia Gottlieb e Julia Passabom, lembra que ciclos anteriores que começaram com cautela foram bem-sucedidos em levar a inflação para perto da meta, possibilitando um equilíbrio final de juros mais baixos por mais tempo e domando as expectativas inflacionárias.
“Cortes de juros menos cautelosos, por sua vez, podem levar a uma eventual depreciação da moeda ou piora nas expectativas de inflação, o que poderia cercear e, no limite, até interromper o processo de desinflação em curso”, alertam.
Para o Itaú, mesmo que a curva de juros de mercado já contemple a possibilidade de um movimento mais intenso, “cabe ao Copom liderar o mercado, não vice-versa”. “O início do ciclo de flexibilização deve se dar em um ambiente em que, embora com melhora recente, os núcleos de inflação e expectativas ainda se encontram em patamares relativamente elevados, indicando que permanece a desancoragem em relação à meta”, defende do banco.
O Itaú prevê, portanto, que BC comece com um corte de 25 bps em agosto e acelere para 50 bps nas reuniões subsequentes do ano, com a Selic fechando 2023 em 12% e 2024 em 9,50%. “A aceleração para 50 bps a partir de setembro estaria em linha com o Boletim Focus e fundamentada na nossa expectativa de continuidade da desinflação dos núcleos e serviços”, explicou.
Mas o banco não descarta uma opção mais arrojada de corte, caso o Comitê avalie que houve uma melhora do balanço de riscos acima do esperado ou que um ajuste menor seria incongruente com o atual patamar da taxa Selic. “Nesse caso, seria provável uma forte sinalização de que esse ritmo seria seguido nas próximas reuniões.”
O JP Morgan está na mesma linha de raciocínio, aguardando um corte de 0,25 ponto e uma comunicação que deixe a porta aberta para acelerar o ritmo em setembro, dependendo dos dados que chegarem – em particular da inflação e da atividade de serviços essenciais.
“Em nosso cenário central, a composição da inflação deve melhorar na segunda metade do ano, apesar do IPC cheio mais alto do que no ano anterior, o que deve permitir uma aceleração para cortes de 50 pontos-base nas próximas reuniões. No entanto, não vemos o BCB reduzindo as taxas abaixo do juro neutro, pois esperamos que a política parafiscal se torne cada vez mais ativa, bem como as taxas globais permaneçam altas por mais tempo.”
O Goldman Sachs é outro banco a projetar uma queda de 0,25 p.p. na reunião de hoje, sem descartar a possibilidade de um movimento mais ousado de -50 pontos-base, colocando a apreciação recente do real em relação ao dólar como um dos fatores a serem levados em consideração.
“Não descartamos decisão dividida. No caso de um corte de 50 pb, esperamos que o Copom dê guidance (sinal) de que o ritmo será mantido na próxima reunião, enquanto com um corte mais parcimonioso de 25pb, a porta estaria aberta para acelerar o ritmo já na próxima reunião”, comenta o banco de investimentos.
Para o Goldman Sachs, “jogar o jogo longo” seria consistente com iniciar o ciclo de flexibilização suavemente, a fim de ir mais longe. “Ou seja, é importante limitar o risco de ‘girar demais no início’ para consolidar os recentes ganhos de desinflação e ancorar ainda mais as expectativas de inflação, pois o trade-off pode estar abrindo um caminho mais amplo para cortes mais rápidos e profundos neste ciclo”, completou.
O ‘call’ de corte de 25 pontos-base do banco é sustentado pelo fato de que as expectativas de mais longo prazo (2025 e 2026) pararam de melhorar e se estabilizaram em 3,50%, ainda acima da meta de 3,0%.
Além disso, é citado que o mercado de trabalho continua aquecido, a postura fiscal e parafiscal vem se deteriorando, a desinflação observada até agora tem forte viés para bens não essenciais e industriais e a inflação de serviços essenciais em 5,9%, ainda está muito longe da meta. Por último, é lembrada a linguagem conservadora usada na última reunião do Copom, quando foi valorizada a serenidade, a paciência e a parcimônia na calibração monetária.
Serenidade
Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research, também se posiciona entre os analistas que acreditam numa postura mais cautelosa do BC nesta reunião. “Nas declarações, nos comunicados e nas Atas, o Comitê sempre prezou pela serenidade e pelo cuidado. Logo, a nossa visão é de queda de 25 bps.”, estima. Para 2023, a projeção para a taxa terminal da Selic é de 12,00% a.a., recuando para 9,75% em 2024.
“Em reuniões anteriores, acreditamos que não havia condições suficientes para que o Banco Central começasse a cortar a taxa de juros. Ao longo dos últimos meses, algumas incertezas foram dissipadas e a inflação deu sinais de arrefecimento. Atualmente, o cenário inflacionário é benigno para uma mudança na política monetária”, avalia Sung.
No cenário base da Suno, de contínua melhora da inflação, o Copom deve fazer cortes de 50 pontos-base em suas reuniões de setembro, novembro e dezembro, levando a taxa Selic a 12,00% no final de 2023. “Choques positivos ou negativos podem alterar esse cenário e suas respectivas probabilidades. Nesse primeiro momento, a queda de juros irá impactar positivamente a Bolsa brasileira. No médio prazo, a economia real e o crédito serão mais beneficiados”, prevê.
Bruno Di Giacomo, CIO da Nero Capital, diz que sua expectativa é de um corte de 0,25 ponto percentual, principalmente porque mostrar a direção é um elemento bastante forte para o comunicado do BC. “Eventualmente um corte de 0,50 ponto pode gerar um efeito de expectativas dentro do mercado contrários aos últimos dizeres do BC. A gente não viu, principalmente o Roberto Campos ser extremamente ‘dovish’”, comenta. “Pelo contrário, ele tem sido bastante conservador nos dizeres e o corte de meio ponto pode passar uma sinalização no mercado de uma sinalização contrária à intenção do BC.”
C6 Bank também acredita num BC mais cauteloso em seu movimento inicial de flexibilização. Em relação à comunicação, a expectativa é que o Comitê afirme que vê como adequado o início de um ciclo de corte de juros e que o ritmo de queda da Selic dependerá do cenário prospectivo para a inflação, que inclui as expectativas de inflação, assim como a dinâmica inflacionária corrente.
“O alongamento do horizonte relevante, que deve passar a considerar, a partir desta reunião, também o ano de 2025, abre espaço no modelo do Banco Central para cortes de juros. Esperamos um corte de 25 pontos base em linha com a comunicação do BC de iniciar um processo parcimonioso de queda dos juros. Projetamos, por ora, Selic em 12% ao final de 2023, com cortes de juros adicionais de 50 pontos-base a partir da reunião de setembro”, comenta o banco.
Marco Caruso, economista-chefe do PicPay, crê num corte de 0,25 p.p. Ele avalia que a inflação e os núcleos têm melhorado sua dinâmica, mas a desancoragem persistente das expectativas de inflação mais longas, a manutenção do pleno emprego e o risco de déficits primários nos próximos anos demandam cautela na velocidade do ajuste. A projeção é de o BC acelerar os cortes a partir de setembro, ao ritmo de 50 pontos-base, com a Selic fechando o ano e 12%.
A cautela e a parcimônia devem ser as palavras-chave dessa reunião, na análise da XP Investimentos, cujo cenário já comtempla há algum tempo um início de corte de 0,25 p.p. na reunião de agosto. “Entendemos que a divisão entre um corte inicial de 0,25 p.p. e 0,50 p.. que se observa no mercado também aparecerá nos votos dos membros do Copom. Pelo menos um diretor votará por um corte de 0,50 p.p.”, afirma a XP.
O ritmo posterior dos cortes, no entanto, dependerá dos dados, diz o texto assinado pelo economista-chefe, Caio Megale, e os economistas Rodolfo Margato e Alexandre Maluf.
Segundo os analistas da XP, esse início menos intenso da flexibilização é consistente com a sinalização recente de cautela do BC, as expectativas de inflação ainda acima das metas, a incerteza sobre o grau de desaceleração da demanda interna e as medidas de aumento de arrecadação, que ainda não se mostrarem suficientes para equilibrar o déficit público.
“Entendemos que na reunião de setembro o comitê terá mais elementos para calibrar o ritmo de redução de juros, com mais confiança de que a inflação convergirá à meta. Em nosso cenário, o ritmo acelera para 0,50 p.p. e se mantem nas reuniões seguintes”, diz a análise.
“Nosso cenário contempla seis cortes de 0,50 p.p. a partir de setembro, que poderiam se transformar em quatro cortes de 0,75 p.p. se a evolução dos dados econômicos, especialmente inflação e taxa de câmbio, continuar favorável”, completam.
A XP alerta que o viés expansionista da política fiscal, a inflação de serviços resiliente e as expectativas acima da meta tendem a limitar a extensão do ciclo em 2024. “Nosso cenário base contempla a taxa Selic em 10,50% em 2024, acima do consenso de mercado. Com as informações atuais, acreditamos que juros muito abaixo deste patamar não levam à convergência da inflação à meta, recém confirmada pelo CMN.”