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Cento e setenta e sete dias nos separam do primeiro turno da eleição presidencial. O prazo é longuíssimo, principalmente para a política, é verdade, mas alguns traços da disputa de outubro já parecem delineados – e, dentro desse cenário, alguns pontos merecem atenção.
O primeiro fato mais consolidado é o estreito espaço no eleitorado para a construção de uma alternativa à polarização vista hoje entre Lula e Bolsonaro (entre vários outros indicadores, vale mencionar que apenas um conjunto de perto de 10% dos eleitores rejeita ambos simultaneamente), o que reforça o cenário de disputa entre os dois atuais líderes como o mais provável.
E vencerá o embate aquele que conseguir convencer o bolso do eleitorado – a afirmação pode parecer óbvia, mas destoa, por exemplo, da eleição de 2018, quando o combate à corrupção ostentava o primeiro lugar do ranking de preocupações do brasileiro.
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Há outras diferenças significativas em relação a 2018 que merecem ser mencionadas – e que corroboram o cenário de polarização: o índice de voto espontâneo nos dois candidatos que encabeçam a disputa já atinge 63%, o que denota um voto já consolidado – nas três eleições anteriores, a soma do voto espontâneo em todas as candidaturas rondava a casa dos 30% nessa mesma época do ano.
É também uma eleição em que, à diferença de quatro anos atrás, o presidente incumbente é candidato à reeleição e – mesmo com um núcleo resiliente de apoiadores – ostenta índices de rejeição elevados (61% no último levantamento Ipespe).
A avaliação negativa, aliada à preocupação do eleitor com a economia, favorece hoje seu principal antagonista, o ex-presidente Lula, que tem como maior ativo um discurso de comparação com o início dos anos 2000.
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Mas a distância entre Lula e Bolsonaro nas pesquisas, hoje em 14 pontos, segundo o último levantamento Ipespe, tem espaço para ser reduzida.
É preciso olhar com atenção para três pontos: o primeiro é o efeito que vai produzir o esforço de Bolsonaro para reacender o antipetismo que o levou ao Planalto em 2018.
Esse efeito parece ter limites diante do interesse manifestado pelo eleitor, mas um cenário econômico positivo poderia abrir espaço para uma mudança de foco da disputa.
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Nessa linha, é relevante também o empenho da candidatura governista para reincluir a agenda comportamental na discussão.
Caso a isca seja de fato mordida pelo petismo, como parece ter sido nessa última semana, Lula falou por exemplo em aborto e em padrão acima do necessário na classe média, o potencial é grande para afastar um eleitor mais moderado que hoje parece votar no petista a contragosto.
O segundo ponto com capacidade de estreitar a diferença hoje vista é a influência que exercerão a máquina e a propaganda do governo.
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Amparado pelo centrão, Bolsonaro tem falado menos e deixado espaço para a ofensiva preparada pelos aliados, que tentarão concentrar a ação para furar a bolha e atingir um eleitor mais dependente do Estado.
Ações como a antecipação do FGTS, a redução de tributos sobre combustíveis e a retomada da discussão sobre revisão da tabela do Imposto de Renda alimentam essa estratégia.
O terceiro, e mais importante, é o cenário econômico em si.
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A recuperação da atividade, com criação de emprego formal e o eventual controle da inflação são os pontos com maior potencial de melhorar a aprovação do presidente, reduzindo sua rejeição e ampliando seu potencial de voto.
O PT e Lula, evidentemente, não assistirão atônitos ao avanço, embora seja difícil se contrapor a uma possível melhora da economia.
À retomada das acusações de corrupção e do radicalismo petista como temas da campanha, o partido reagirá com casos também ruidosos dentro do governo atual e com a memória da atuação de Bolsonaro na pandemia, cujo impacto nas urnas ainda é incerto, mas merece ser monitorado nos meses à frente.
Erros cometidos pelo PT nesses últimos dias, sinais trocados sobre a condução da política econômica e dificuldades em formação de equipe e composições regionais são ingredientes que adicionam incerteza nos próximos meses e acentuam a necessidade de atenção nesses pontos mencionados, e que podem fragilizar a liderança ostentada hoje pelo ex-presidente.
O resumo desse cenário, do qual sou apenas porta-voz nesse primeiro texto, é fruto do trabalho do time que se dedica à análise da conjuntura política na XP, que conta com Richard Back, Victor Scalet, Júnia Gama, Debora Santos e Vinicius Scheffel, além de nossos consultores parceiros.
O objetivo deste espaço nos próximos seis meses é agregar a esse cenário análises, informações e discussões que possam referendá-lo ou alterá-lo.
Conto com sua leitura e participação nas próximas sextas-feiras.