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O Terraço entrevistou com exclusividade o Deputado Betinho Gomes, Relator da MP 777/17, que trata sobre a criação da Taxa de Longo Prazo (TLP) para remunerar os contratos de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
A TLP substituiria a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) nos empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a partir de janeiro de 2018. A ideia é aproximar o custo de captação do banco ao do Tesouro, atrelando a TLP à taxa paga pelo próprio governo nos títulos vinculados à Inflação – IPCA (NTN-B) de cinco anos. Atualmente, a TJLP é definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
Betinho Gomes foi deputado estadual por dois mandatos não consecutivos (2003-2006/ 2011-2014). Atualmente exerce o seu primeiro mandato como Deputado Federal pelo PSDB – PE. Tem 42 anos. A entrevista foi feita por email.
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Terraço Econômico: Poderia explicar sucintamente para o nosso leitor qual a diferença essencial entre a TLP e TJLP?
Deputado Betinho Gomes: A TLP será uma taxa democrática, que vai permitir juros baratos para toda a sociedade, garantindo o desenvolvimento do mercado de capitais e, ao mesmo tempo, estimulando o investimento em projetos de longo prazo de qualidade.
Já a TJLP, ao longo dos últimos anos especialmente (os 10 anos recentes), foi utilizada para oferecer recursos baratos – recurso da sociedade e do trabalhador – a grandes empresários, que poderiam tomar seus financiamentos no mercado privado, mas procuram o BNDES por ter uma taxa vantajosa. Porém, no final das contas, o investimento privado não aumenta e, o pior de tudo, a conta está sendo paga pelo conjunto da sociedade, em particular pelos trabalhadores que financiam essa taxa barata para os grandes grupos empresariais.
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Como deputado, como é o trabalho de convencer a sociedade para adoção de uma medida que contraria grandes grupos de interesse ao passo que o beneficiado é uma massa gigantesca e infelizmente sem informação para saber inclusive os benefícios particulares dessa mudança? Como trazer a sociedade, ou uma parte maior dela, para perto dessa bandeira?
Nós fizemos, até aqui, um grande debate sobre a adoção da TLP. Realizamos três audiências públicas, o meu relatório está disponível há algum tempo. As pessoas interessadas estão tendo a oportunidade de ler e discutir esse relatório produzido decorrente de um debate profundo, que normalmente não acontece nem na Câmara Federal nem no Senado. Isso está permitindo que as pessoas comecem a ter consciência do que significa essa mudança estrutural na economia brasileira. Eu acho que o debate tem sido ajudado à medida que especialistas renomados do país estão se posicionando favoravelmente à TLP. Naturalmente, estamos enfrentando a resistência de setores corporativos, seja de servidores, seja especialmente de grandes empresários que não querem perder o acesso a esse recurso barato do BNDES, o que é compreensível diante do momento em que vive a economia brasileira. Mas, a expectativa muito clara é que o convencimento vai acontecendo à medida que o debate vai se aprofundando na Câmara e no Senado.
A melhor forma de convencer a sociedade é mostrar que ela está pagando um custo de um recurso que ela não está autorizando, ou seja, os subsídios implícitos não são autorizados por ninguém e, ainda sim, a sociedade está pagando esse preço. À medida que isso for revelado, tenho certeza que o conjunto da sociedade vai compreender a importância desse projeto, até porque o objetivo central será sempre o interesse difuso, e nós vamos defender esse interesse até quando ficar muito claro para a população que a taxa de juros estrutural será reduzida para todos e não juros especiais para alguns poucos que estão se beneficiando da TJLP atual.
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Como fazer isso se o atual presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro, dá sinais que não apoia a medida?
O presidente do BNDES é um homem muito experiente, é um economista reconhecido no Brasil inteiro, no entanto, ele comete um grave ao se contrapor a uma proposta do governo ao qual representa, até porque é bom sempre lembrar que o presidente do BNDES assumiu um compromisso de defender a taxa e, no entanto, suas declarações têm causado tumulto no debate e constrangimentos.
Evidente que, com sua experiência, ele tem obrigação de fazer esse debate dentro do governo, externar sua opinião, mas, à medida em que a proposta é debatida e o governo assumiu uma posição, o mais adequado e correto seria ele passar a defender a proposta ou, pelo menos, evitar opiniões que crie confusão e constrangimento. É uma questão interna do governo, mas, as opiniões a do presidente do BNDES, neste momento, tem mais atrapalhado do que ajudado.
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O debate crítico é sempre bem-vindo, mas é preciso ter clareza: ou a proposta é prioridade para o governo ou não é prioridade. O que não dá é ter várias vozes falando pelo governo, criando esse ambiente de dúvida e divisão sobre a prioridade que o governo vai dar a essa medida.
Ainda sobre essa questão, se olharmos na Consulta Pública, disponibilizada no e-cidadania na página do Senado Federal na internet, o placar está quase 50% a 50% entre os que apoiam a medida e aqueles que a rejeitam. Você acha que esse resultado era esperado?
Este é um assunto muito técnico e eu não tinha a expectativa que o conjunto da sociedade brasileira fosse se envolver com ele de maneira tão forte. Ele está hoje muito restrito aos grupos de interesse: economistas, empresários e funcionários do BNDES. Eu tenho impressão que essa enquete revela esse sinal de participação desse conjunto de pessoas. Obviamente que, quando chegar ao Plenário da Câmara e do Senado, é possível que esse tema consiga ganhar uma amplitude maior. O resultado dessa enquete me parece refletir muito mais a mobilização de conjuntos de interesses do que necessariamente uma opinião ampla da sociedade.
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O importante é que o debate seja feito e que as pessoas tenham conhecimento que estamos constituindo uma nova de juros para o BNDES, que vai permitir transparência, fim praticamente do subsídio implícito, garantia da redução da taxa de juros estrutural e a melhor remuneração dos fundos, especialmente do FAT, que é recursos do trabalhador. Quando as pessoas tomarem conhecimento de que esses serão os benefícios e, em contrapartida, o governo também terá um melhor ajuste fiscal, uma economia de recursos públicos para se investir em outras áreas, certamente o apoio será ampliado e a sociedade vai entender a importância da TLP.
Do que você tem visto na Comissão Mista da MP 777, a resistência de alguns deputados à proposta tem razões mais técnicas ou é definitivamente uma questão política?
É um misto das duas situações. Há resistência política de pessoas que representam setores empresariais e que não admitem a discussão desse assunto. Também há a resistência ideológica de alguns que acham que o melhor caminho seria manter uma política industrial e de desenvolvimento que já fracassou, que gerou os campeões nacionais e, portanto, não foi bem sucedida.
Há também resistência técnica, mas nesse caso específico, vale destacar que existe muito desconhecimento do teor da MP. Nem todos os parlamentares tiveram a condição ou tempo de analisar com tranquilidade esse ponto. Inclusive, para superar essas resistências, orientei a nossa consultoria legislativa a fazer uma apresentação aos assessores técnicos das bancadas para que pudessem tirar dúvidas sobre o tema.
O fato é que, quando todos tiveram consciência de que a TLP vai garantir financiamentos justos do ponto de vista da referência de mercado, vai garantir que o governo não aporte recursos da sociedade nos subsídios implícitos, que vai permitir a redução da taxa de juros, portanto, haverá um ganho para toda a sociedade, eu tenho certeza que o apoio virá e os parlamentares serão sensíveis à aprovação dessa matéria.
Funcionando como um Robin Wood às avessas, de 2007 e 2017, 70,8% das operações de crédito do BNDES foram para grandes empresas. Além disso, alguns estudos recentes mostram que o crédito do BNDES não ocasionou nenhum efeito sobre o investimento e o nível de produtividade da empresa que pegou o crédito. Só esses dois dados já não seriam suficientes para fortalecer o coro pela TLP?
Eu diria que esse é o grande argumento para defender a TLP. E o meu relatório destaca e comprova isso, que mais subsídios não significaram mais investimentos, ao contrário, os recursos baratos do BNDES foram internalizados nas empresas, não significando investimentos novos para o país.
Quem quer democratizar o crédito, garantir juros barato para toda a sociedade, quem quer que o BNDES faça um financiamento equilibrado por porte de firma, inclusive, priorizando pequenas e médias empresas, alocando recursos para projetos estruturadores de longo prazo – como saneamento, infraestrutura, tecnologia – precisa apoiar a TLP. Hoje, estamos garantindo recursos baratos para grandes grupos empresariais, que poderiam perfeitamente tomar recursos do mercado de capitais, de outras fontes. Essa mudança estrutural que a TLP vai provocar será muito benéfica para a sociedade e para a economia, dando mais relevância ao papel que o BNDES tem que cumprir.
As maiores críticas sobre a TLP envolvem a suposição de que sem o BNDES o mercado de crédito de longo prazo deixa de existir; você acha que a TLP teria capacidade de, ao longo do tempo, mostrar que na verdade o caso é oposto e não existe um mercado privado de crédito de longo prazo justamente porque o BNDES preenche essa lacuna?
O grande objetivo da TLP é garantir a redução da taxa de juros estrutural para o conjunto da sociedade. Hoje, nós temos poucos grupos sendo beneficiados por uma TJLP, que é financiada pelo trabalhador e pela população. Com a TLP, isso vai mudar. Todo mundo vai ter a possibilidade de uma taxa Selic menor e, consequentemente, as taxas de mercado deverão acompanhar esse movimento.
Acredito que a TLP vai produzir outros resultados relevantes. Um deles – e a expectativa é neste sentido – é o desenvolvimento do mercado de capitais. O mercado privado poderá passar a financiar projetos de longo prazo porque as taxas de juros estarão em equilíbrio em relação aos operadores públicos e privados.
A consequência será a grande possibilidade que teremos de reduzir as taxas de juros para todos, inclusive, na operação de longo prazo feito pelo mercado de capitais. Hoje, isso não é possível porque o BNDES, subsidiando as suas taxas, torna impossível garantir o desenvolvimento desse mercado. Tenho certeza que todos os setores vão sair ganhando com essa mudança, que será uma verdadeira revolução no mercado de crédito brasileiro.
Um outro tema que já foi tratado pelo Terraço é a influência do BNDES no mercado de ações. A hipótese é que bater na porta do BNDES seja menos trabalhoso e custoso para a empresa do que arrumar a casa e abrir suas portas para receber visitas, ou seja, fazer um IPO e abrir o capital. Os IPOs estão estagnados desde 2014, com poucas empresas optando por esse caminho. Você acha que a TLP pode dar um fôlego para o mercado de ações?
A TLP, além da importância e do significado para a economia nacional, também tem permitido debates conceituais importantes sobre o significado da nossa economia e o papel da ação do empresário na sociedade. Ao lado disso, também está permitindo a discussão de uma política industrial, do papel que deve ser exercido por um banco de desenvolvimento e a relação do governo com os empresários.
O fato é que nós nos acostumamos com o capitalismo de compadres em que grandes empresários, por ter muita proximidade com a política, sempre foram muito beneficiados com programas que, supostamente, iram lhes favorecer e trazer resultados para a sociedade. Mas a vida prática demonstrou o contrário. Observando os últimos 10 anos, especialmente, o que se viu foi uma proteção excessiva ao empresariado no sentido de garantir recursos facilitados, desoneração, taxas subsidiadas, e o resultado foi um grande rombo fiscal, as contas públicas não suportaram e também não significou, em nenhum momento, em aumento de investimento da produção industrial. Então, essa ótica precisa ser revista.
Tenho a expectativa que possamos ter a superação dessa relação de compadrio e que possamos estimular o empresariado a ser competitivo, com ambientes de negócios saudável e com segurança jurídica e, ao mesmo, garantir um desenvolvimento real para o Brasil baseado na indústria, na tecnologia, em serviços, em infraestrutura. E essa mudança cultural que a TLP vai provocar será um estímulo importante para o futuro.
Pode mencionar quais outras MPs e reformas que você defende ou apoia para o Brasil retomar o caminho do crescimento econômico?
O governo tem apontado para algumas reformas importantes, inclusive, algumas delas já aprovadas. Certamente, o grande desafio agora é a reforma da previdência, que precisa ser mais discutida com a sociedade, não basta ter apenas apoio congressual. Esse tipo de reforma também precisa ser compreendida pela sociedade para que esse assunto possa avançar até porque há muitos interesses envolvidos nessa questão.
Então, o governo precisa ter a disposição de continuar a debater esse assunto, buscar obter apoio social, para que esse tema possa prosperar no Congresso Nacional. Ao lado disso, embora ainda não esteja sendo abordada, é importante a reforma do estado brasileiro. Nós temos um estado inchado, os três repleto de exemplos de privilégios abusivos, que precisam ser discutidos.
Não é compreensível situações como vimos recentemente de um juiz no Mato Grosso receber R$ 500 mil de salário e parece que nada está acontecendo. Acho que esse é uma tema que precisa ser tratado com prioridade e urgência. A Câmara está dando um passo neste sentido, instituiu uma comissão especial que objetiva regulamentar um teto constitucional salarial para que a gente possa, definitivamente, acabar com essa deformação abusiva dos super salários dentro do poder público. Tenho certeza que vai ser um sinal importante.
Todavia, a reforma do Estado não é apenas tratar esse ponto, mas é importante garantir um estado eficiente e que possa financiar as políticas públicas. E só será possível fazer isso quando as distorções forem amplamente corrigidas. Esse debate ainda está muito incipiente e nossa expectativa é que ele possa na ordem do dia com urgência.