Preço-teto: até quanto gastar com as ações das maiores pagadoras para garantir dividendos de 6% ao ano?

Estratégia disseminada por Décio Bazin e adotada por Luiz Barsi Filho ajuda a estabelecer margem de segurança na compra de ativos; veja lista de ações

Katherine Rivas

(iStock / Getty Images)
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Embora nem todo mundo se preocupe com o preço, o valor desembolsado para comprar uma ação importa bastante para garantir um bom retorno em dividendos. Na fase de acumulação, principalmente, comprar boas ações, com bons fundamentos e a bons preços ajuda o investidor na geração de renda passiva.

Grandes nomes do mercado, como Luiz Barsi Filho, considerado um dos maiores investidores individuais da Bolsa brasileira, e Décio Bazin, autor do livro Faça fortuna com ações antes que seja tarde, já falecido, estabeleciam uma espécie de margem de segurança na hora de comprar uma ação, conhecida como preço-teto. Desta forma, determinavam qual seria o preço máximo a pagar por uma ação com o intuito de garantir um dividend yield (retorno em dividendos) de 6% ao ano.

Esse “número mágico” – 6% ao ano de retorno mínimo com dividendos – foi disseminado por Bazin ainda na década de 1990, como um dos pilares para escolher uma ação para o longo prazo. No método Bazin, a opção de investir apenas em ações com esse nível de dividend yield se justificava na remuneração que os títulos de renda fixa ofereciam na época.

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“A vantagem de investir em ações que pagavam dividendos de 6% era que, além do retorno semelhante ao da renda fixa, existia também um ganho com a valorização da ação, fruto da escolha de boas empresas”, explica Luiz Barsi Neto, economista e assessor no escritório MMBarsi Investimentos – além de filho de Luiz Barsi Filho.

A estratégia se mantém mesmo décadas depois porque ainda atualmente as taxas reais (descontada a inflação) oferecidas pelos títulos públicos e privados de renda fixa são próximas de 6% ao ano. “Apesar do recente aumento nos juros, visto nos últimos dois anos, a estratégia de Bazin se prova segura para ainda ser aplicada nos tempos atuais”, reforça Barsi Neto.

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Como o preço-teto é calculado?

O cálculo do preço-teto pode ser aplicado a qualquer empresa listada na Bolsa. Basta dividir o valor pago em proventos no período de análise por 0,06 (6% de dividend yield).

No entanto, para o investidor que busca gerar renda com dividendos, a estratégia só faz sentido para companhias que reúnam alguns critérios, segundo Barsi Neto. Ele sugere enfatizar nas empresas que integram setores perenes, tais como financeiro, de saneamento, de telecomunicações e de energia, ou com resiliência comprovada nos lucros nos últimos anos.

Barsi Neto ressalta ainda que as companhias devem apresentar um bom histórico de distribuição de proventos, com pagamentos todos os anos e um dividend yield médio superior a 6% nos últimos cinco ou dez anos. A liquidez – facilidade de comprar e vender o ativo na Bolsa – também é importante. Segundo o economista, a preferência deve ser por ações com liquidez média diária de R$ 5 milhões, pelo menos. Além disso, as companhias não devem estar envolvidas em escândalos ou notícias ruins e, de preferência, precisam ter um endividamento controlado.

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Na visão de Barsi Neto, isso explica porque algumas das maiores pagadoras de dividendos em 2022 – como a Petrobras (PETR4) – não se encaixam em uma estratégia baseada no preço-teto.

Tomando como base a distribuição da petrolífera neste ano, foram pagos R$ 13,41 por ação como dividendos até a última sexta-feira (11). Aplicando o cálculo sugerido na estratégia, o preço-teto resultante seria de R$ 223,50. Com a companhia cotada na casa dos R$ 27 atualmente, seria irracional um investidor aceitar pagar mais de R$ 220 pela ação.

Barsi Neto explica que, neste caso, adotar o preço-teto como ponto de partida não traria uma margem de segurança ao investidor, como é o objetivo da estratégia. Afinal, a Petrobras não reúne outros critérios mínimos que precisam ser considerados.

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O preço-teto, no entanto, é adequado para a análise de outras companhias – como o Banco do Brasil (BBAS3).  Segundo levantamento para o InfoMoney realizado por Barsi Neto e Matheus Barsi, também do MMBarsi Investimentos, o banco pagou R$ 3,02 em proventos neste ano até dia 11. Para o investidor garantir um retorno mínimo de 6% em dividendos, seria aceitável pagar até R$ 50,34 pelo papel – seu preço-teto atual.

Se observado o ano de 2021, quando o Banco do Brasil pagou R$ 1,70 no mesmo período, o preço-teto para garantir um retorno de 6% em dividendos na época era de R$ 28,29. O valor aumentou 78% nessa comparação.

Os especialistas calcularam o preço-teto atual das ações consideradas as maiores pagadoras de dividendos da Bolsa nos últimos dez anos. Foram escolhidas companhias com dividend yield médio de 6% ou mais na década, com histórico de distribuições todos os anos e tidas como empresas perenes e com liquidez para uma estratégia de renda passiva no longo prazo. Confira:

Empresa  Dividend yield médio nos últimos dez anos Dividendos pagos em 2021 Dividendos pagos em 2022 Preço-teto em 2021 (considerando DY de 6% ao ano) Preço-teto atual (considerando DY de 6% ao ano) Evolução do preço-teto  Preço-teto médio nos últimos cinco anos
Unipar (UNIP6) 14,4%  R$  7,24 R$ 8,97 R$ 120,65  R$ 149,42 24% R$ 62,96
Taesa (TAEE11) 12,4%  R$  2,99  R$ 4,85  R$  49,76 R$ 80,91 63% R$ 18,32
Cemig (CMIG4) 10,1%  R$  0,61  R$  1,12  R$  10,20  R$ 18,62 83% R$ 7,36
Telefônica Brasil (VIVT3) 7,7%  R$  2,09  R$  2,03  R$  34,80  R$ 33,76 -3% R$ 46,45
Isa Cteep (TRPL4) 7,7%  R$  3,41  R$  56,83 R$ 34,50
Sanepar (SAPR4) 7,3%  R$ 0,10  R$  0,12  R$ 1,72  R$ 2,00 16% R$ 3,41
Santander (SANB4) 7,3%  R$ 1,49  R$  1,17  R$  24,76  R$ 19,57 -21% R$ 17,03
Bradespar (BRAP4) 7,1%  R$ 5,22  R$  3,10  R$  87,06  R$ 51,68 -41% R$ 48,25
Copel (CPLE6) 7,1%  R$ 1,20  R$  0,52  R$  20,04  R$  8,64 -57% R$ 7,02
Ferbasa (FESA4) 6,4%  R$ 0,59  R$  3,56  R$   9,87  R$  59,35 600%  R$ 33,20
Banrisul (BRSR6) 6,3%  R$ 0,78  R$  0,86  R$  13,05  R$  14,28 9% R$ 14,22
ABC Brasil (ABCB4) 6,3%  R$ 1,00  R$  1,03  R$  16,70  R$   17,12 2% R$ 14,65
Engie Brasil (EGIE3) 6,1%  R$ 1,71  R$  2,16  R$  28,58  R$  36,08 26% R$ 36,08
Banco do Brasil (BBAS3) 6,0%  R$ 1,70  R$  3,02  R$  28,29  R$  50,34 78%  R$ 35,56

Fonte: MMBarsi Investimentos. As colunas de dividendos pagos em 2021 e 2022 consideram o período entre janeiro e 11 de novembro de cada ano. O preço-teto atual é a divisão dos dividendos pagos no período por 0,06 (6% de dividend yield). A evolução é a diferença entre o preço-teto atual e o de 2021. O preço-teto médio considera o lucro por ação médio dos últimos cinco anos, multiplicado pelo payout médio no mesmo período, resultado nos dividendos por ação. O montante de dividendos por ação são, então, dividido por 0,06 (6% de dividend yield).

O histórico também importa

Para uma alocação estratégica, pensando em obter dividendos no curto prazo, o preço-teto atual apresenta uma boa fotografia do momento, explica Barsi Neto. Contudo, o economista esclarece que o investidor que busca renda passiva deve focar no longo prazo – e, diante disso, o preço-teto não basta. É importante também olhar o histórico das empresas.

Por isso, além de avaliar o atual, o ideal é observar também o preço-teto médio dos últimos anos, segundo Barsi Neto.

Barsi Neto explica que o cálculo do preço-teto médio envolve outras variáveis. É o caso do lucro por ação (LPA), fruto da divisão entre o lucro líquido médio anual do período considerado pela quantidade de ações da empresa; além dos dividendos por ação (DPA), que é a multiplicação do lucro por ação pelo payout (parcela do lucro líquido destinada a proventos) médio do período.

“O resultado dos dividendos por ação deve ser dividido pelo yield de 6% para chegar ao preço-teto médio do período”, explica Barsi. No levantamento, foi considerado um intervalo de cinco anos, entre 2018 e 2022.

No caso do Banco do Brasil, por exemplo, o preço-teto médio dos últimos cinco anos para assegurar um dividend yield de 6% ao ano é de R$ 35,56, muito próximo da cotação atual de BBAS3.

Uma análise baseada exclusivamente o preço-teto atual da instituição – de R$ 50,34 por ação – indicaria que faz sentido pagar até esse valor neste ano, considerando que o banco distribuiu um volume considerável de proventos. Mas observando o histórico da empresa, o que se percebe é que houve um salto no preço-teto. Afinal, seria mesmo justo pagar mais de R$ 50 para carregar a ação no longo prazo? Barsi Neto esclarece que o preço-teto médio apresenta um olhar mais realista para o investidor de longo prazo.

Cotação abaixo do preço-teto: hora de comprar?

Mas o que acontece se uma ação está cotada abaixo do preço-teto atual e do preço-teto médio de cinco anos? Segundo Barsi Neto, pode ser um indicativo de que existe uma boa margem de segurança para o investidor entrar no papel e garantir pelo menos 6% em dividendos no futuro. Contudo, este não é um fator decisivo de compra. Devem ser observados os fundamentos, o valuation e outros aspectos.

E se o caso for o oposto, com a cotação do papel acima do preço-teto? De acordo com o especialista, pode ser motivo para o investidor refletir se a companhia reúne os fundamentos necessários que justifiquem a sua compra no momento.

Por fim, quando se verifica uma diferença grande entre o preço-teto atual e o preço-teto médio, é importante avaliar o motivo que levou à evolução: se a companhia pagou dividendos de forma saudável, se queimou caixa ou se houve uma redução porque está focada em investimentos, entre outros.

Por que o preço-teto muda?

Segundo Barsi Neto, o preço-teto atual de uma ação pode mudar por diversas circunstâncias. A mais comum é quando a empresa paga mais dividendos, fazendo necessário um novo cálculo.

Já o preço-teto médio muda quando o número de ações em circulação é alterado ou a companhia anuncia um novo lucro ou prejuízo, ou ainda quando tem mudanças de payout.

Pagamentos extraordinários de dividendos também alteram e podem até distorcer o preço-teto de um ano para o outro. Barsi Neto diz que em 2022, por exemplo, muitas companhias tiveram um avanço no preço-teto em relação a 2021, já que o receio da instabilidade política e da tributação de dividendos levou muitas delas a distribuir uma parte maior dos lucros aos investidores.

Mas também há situações específicas que provocam avanço no preço-teto dos papéis. Ele explica que no caso da Ferbasa (FESA4), que pagou R$ 0,59 por ação em 2021 e R$ 3,56 em 2022, o salto foi de 600%.

No ano passado, o preço-teto de Ferbasa para garantir um dividend yield de 6% era de R$ 9,87. Atualmente, é de R$ 59,35. Segundo Barsi Neto, a justificativa é que a companhia pagou R$ 86,7 milhões em dividendos adicionais, com base nos recursos do saldo de reserva de lucro para investimento de exercícios anteriores.

Nesse cenário de distorção do preço-teto, observar o preço-teto médio dos últimos cinco anos ajudaria a ter uma visão mais realista, segundo o especialista.

Existe também o caso oposto, de companhias que tiveram uma redução no seu preço-teto, como a Bradespar (BRAP4), que de R$ 87,06 em 2021 passou para R$ 51,68 em 2022. “O motivo é que a companhia realizou uma redução de capital. Os investidores receberam uma parte em dividendos e outra em ações da Vale (VALE3)”, explica Barsi Neto.

Comparar a evolução do preço-teto de um ano com o próximo também auxilia o investidor a entender e avaliar se houve mudanças na companhia.

“Uma alta de 30% no preço-teto não é estável, como é o caso de Cemig,  Taesa, Ferbasa, Banco do Brasil”, avalia Barsi Neto. Da mesma forma, na visão dele, uma queda no preço-teto superior a 30%, como é o caso da Copel e da Bradespar também é atípica – um sinal para observar mais de perto a mudança.

Katherine Rivas

Repórter de investimentos no InfoMoney, acompanha ETFs, BDRs, dividendos e previdência privada.