STF deve declarar PEC dos Precatórios inconstitucional, diz ex-PGFN da gestão Bolsonaro

De acordo com Ricardo Soriano, há precedentes do Supremo entendendo que postergar pagamento de precatórios ferem princípios da Constituição

Estadão Conteúdo

Estátua "A Justiça", escultura de Alfredo Ceschiatti em frente ao edifício-sede do Supremo Tribunal Federal (STF) em Brasília (Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil)
Estátua "A Justiça", escultura de Alfredo Ceschiatti em frente ao edifício-sede do Supremo Tribunal Federal (STF) em Brasília (Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil)

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Ex-Procurador-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) durante a gestão Jair Bolsonaro, Ricardo Soriano avalia que são altas as chances de o Supremo Tribunal Federal (STF) declarar a PEC dos Precatórios inconstitucional, como deseja o atual governo. O advogado foi funcionário de carreira da PGFN e participou das discussões sobre a proposta como integrante da equipe do então ministro da Economia, Paulo Guedes.

“Acredito que o STF vai declará-las inconstitucionais, não sei se na totalidade ou pelo menos em parte”, afirmou Soriano em entrevista ao Estadão. “Existem precedentes do Supremo entendendo que atos tendentes a postergar o pagamento de precatórios (dívidas judiciais da União) ferem princípios da Constituição, como coisa julgada, efetividade jurisdicional e outros.”

Promulgada em 2021, a proposta ficou conhecida como “PEC do Calote”, já que fixou um teto para o pagamento dos precatórios, “rolando” os valores que extrapolavam o limite anual. Essa sistemática gerou um estoque de R$ 95 bilhões em dívidas não pagas, o qual poderá alcançar R$ 250 bilhões em 2027.

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Essa “rolagem” é um dos principais pontos questionados no STF, que julgará as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) nesta segunda-feira. Na ocasião, os ministros poderão abrir caminho para o pagamento desse estoque fora do novo teto de gastos, além de autorizar uma mudança na contabilidade dessas despesas – o que é de interesse da atual equipe econômica (leia mais abaixo).

Soriano, que hoje é sócio do escritório Figueiredo & Velloso Advogados, alega que a PEC proposta pelo governo Bolsonaro era “bem diferente” do texto que acabou sendo promulgado pelo Congresso e que, à época, “havia elementos para defender a constitucionalidade”.

“A questão é complexa. Quando do último julgamento (sobre o assunto), da Emenda Constitucional 62, o próprio STF ficou dividido sobre determinados pontos”, afirma. “Em alguns deles, até cinco ministros entendiam que parte das alterações era constitucional, enquanto outros seis entendiam que não guardava conformidade com a Constituição”, exemplifica.

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O advogado também avalia que a PEC trouxe uma importante válvula de escape, que, caso tivesse sido regulamentada, teria o potencial de reduzir os efeitos do subteto dos precatórios. Trata-se da possibilidade de uso dessas dívidas como moeda de troca, para fazer “encontro de contas”. Usá-las, por exemplo, para quitar débitos do contribuinte com a União ou pagar outorgas de concessões de serviços públicos.

A Advocacia Geral da União (AGU) caminhava para fazer essa regulamentação agora em 2023, mas suspendeu o processo após a decisão do governo Lula de recorrer ao Supremo para mudar a forma de pagamento dos precatórios. Na argumentação enviada à Corte, a AGU pede, inclusive, que esse dispositivo também seja declarado inconstitucional.

“Eu não considero o parágrafo 11 inconstitucional, que é o da moeda de troca, mas não sei até onde o Supremo irá. Você pode, por exemplo, compreender que houve falha formal na votação da PEC, e aí comprometeria a constitucionalidade de todo o texto”, afirma Soriano.

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Estratégia de Haddad

O julgamento desta segunda-feira é de grande interesse do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que busca abrir caminho para o atual governo quitar o estoque de precatórios por meio de créditos extraordinários, ou seja, fora do novo limite de gastos, além de alterar a forma como essas despesas são contabilizadas.

Pela fórmula proposta, o valor principal da dívida será tratado como despesa primária – ou seja, contabilizado no resultado primário (saldo entre receitas e despesas, sem contar os juros da dívida). Já o que for referente ao pagamento de juros será separado e tratado como despesa financeira, sem ser contabilizado no resultado primário e, consequentemente, no limite de gastos.

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Questionado sobre a estratégia do governo, Soriano avaliou como interessante e positiva a decisão de recorrer ao STF para solucionar o problema do estoque, já que a outra opção seria levar o tema novamente ao Congresso e isso exigiria construção política. Mas disse ver com estranheza o pedido de mudança na contabilidade.

“Quando a União recebe pagamentos com juros, isso entra como receita primária e impacta positivamente o resultado do governo. Não parece fazer sentido, quando são recebidos juros, isso impactar positivamente, mas, na hora de pagar os juros dos precatórios, essa despesa ser desconsiderada. É uma linha bastante polêmica”, afirma.

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