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O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) estabeleceu como objetivo dobrar a participação de ferrovias nas exportações brasileiras até 2035 e aumentar a proporção do escoamento de grãos neste modal ‒ atualmente dominado pelos minérios. A ideia é que a mudança eleve a produtividade do país e aumente sua competitividade no mercado internacional.
Em entrevista concedida ao InfoMoney, o ministro dos Transportes, Renan Calheiros Filho (MDB), disse que o Brasil precisa investir na adequação da malha ferroviária às necessidades da produção agrícola, construindo um corredor que leve o coração da produção a portos localizados em diversas regiões.
“É preciso ter um corredor até o coração da produção do Mato Grosso, ligando tanto ao Porto de Santos quanto à construção de um porto no sul da Bahia. Esse corredor Leste-Oeste será muito importante para fortalecer o escoamento da produção do Brasil central por meio de ferrovias, usando menos rodovias”, disse.
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“Imaginamos que até 2035 nós possamos elevar de 17% para 40% o escoamento da nossa produção [exportada] pelo modo ferroviário. Isso já vai ser uma transformação relevante, sobretudo porque vai crescer na área de grãos”, continuou.
Segundo o Ministério dos Transportes 85% do volume total exportado pelo modal ferroviário são minérios ‒ o que indica a participação ainda tímida dos grãos devido à baixa capilaridade do transporte por trilhos país afora.
Durante a entrevista, o ministro também defendeu a importância de o desenvolvimento da malha ferroviária estimular uma competição maior entre portos no país.
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“Temos muita dificuldade de chegar com concorrência nos portos mais periféricos. O Arco Norte avançou um pouco, mas o Nordeste ainda está pouco explorado e poderia ser muito mais explorado. E mesmo o Sudeste, com portos fundamentais como o de Açu não recebem uma série de mercadorias, porque tem dificuldade de conexão”, pontuou.
Renan Filho conversou com a reportagem do InfoMoney durante o evento “Welcome Saudi Arabia”, promovido pela XP Investimentos, que recebeu mais de 300 executivos e gestores brasileiros e sauditas. No encontro, ele conversou com o ministro de Investimentos da Arábia Saudita, Khalid A. Al-Falih, sobre a possibilidade de novos negócios entre os países.
Veja os destaques da entrevista:
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InfoMoney: Qual a importância do encontro com a comitiva saudita?
Renan Filho: A Arábia Saudita tem uma economia que tem similaridades e complementariedade com a nossa. Eles são grandes produtores de óleo e gás ‒ os maiores do mundo. Nós também somos um produtor muito relevante. O Brasil é um dos maiores consumidores de gasolina e óleo diesel do planeta e tem praticamente autossuficiência em toda sua produção ‒ não nos derivados, mas no óleo bruto.
Mas nós temos uma complementariedade muito importante, especialmente na produção de alimentos. Eles são grandes compradores de alimentos, têm população jovem, estão em crescimento e precisam de segurança alimentar. E são produtores muito significativos de fertilizantes, que, para serem produzidos, precisam sobretudo de gás barato, que eles têm muito e a gente tem dificuldade de produzir, justamente pelo preço do gás vendido domesticamente.
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Percebemos isso com a guerra [na Ucrânia] e agora estamos descobrindo novos parceiros. A exportação russa sofreu por conta da guerra, e a Arábia Saudita pode ser uma parceira importante nessa área.
Também há toda a transição energética e na economia verde, na sustentabilidade, além da área da inovação. O segmento de transportes entra em praticamente tudo isso. A área de transportes no Brasil é fundamental para a alimentação e a descarbonização do planeta, dado que o segmento de transportes no mundo representa mais do que 20% das emissões de carbono.
É sempre bom conversarmos com países que pensam como nós, que estão em busca dessa agenda. E a Arábia Saudita é um exemplo melhor ainda, porque, além de ter uma agenda parecida, do ponto de vista da sustentabilidade, eles também têm condição de fazer os investimentos, por conta do fundo soberano.
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IM: Durante sua exposição aos empresários, o senhor abordou dois potenciais eixos de investimentos sauditas na economia brasileira: tanto diretos no transporte e na infraestrutura, quanto com impactos indiretos do simples aumento das relações comerciais. De qual forma poderiam vir os investimentos diretos nos transportes?
RF: Fortalecer o comércio é a atividade principal. Às vezes, no Brasil, a gente imagina que o fundo soberano vá fazer o investimento direto. Não é assim que as coisas ocorrem. Entretanto, o ministro [de Investimentos da Arábia Saudita, Khalid A. Al-Falih] colocou que o fundo soberano tem joint ventures com empresas locais e outras mundo afora.
Nós temos alguns corredores de transportes muito importantes ‒ especialmente o Leste-Oeste, que vai ligar Lucas do Rio Verde (MT), passando por Mara Rosa (GO), e chegando até Ilhéus (BA). Além disso, o fortalecimento das conexões ferroviárias de alto desempenho com os nossos principais portos do Brasil inteiro. Precisamos criar uma competição entre os portos, porque temos muita dificuldade de chegar aos mais periféricos. O Arco Norte avançou um pouco, mas o Nordeste ainda está pouco explorado e poderia ser muito mais explorado. E mesmo o Sudeste, com portos fundamentais como o de Açu não recebem uma série de mercadorias, porque tem dificuldade de conexão.
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O ministro [Al-Falih] falou que há empresas sauditas desejando investir em portos, e, por consequência, a conexão dos portos com as áreas produtoras do país. Essa é uma discussão. Mas a discussão mais imediata certamente é o fortalecimento das nossas relações comerciais, porque elas garantem mais atratividade para investimentos em infraestrutura. São coisas que caminham juntas.
IM: Os grãos hoje dependem muito mais do transporte rodoviário do que do ferroviário. Como fazer essa inversão, para que esse segmento possa usufruir de um transporte mais barato e sustentável, aumentando sua competitividade?
RF: É preciso ter um corredor até o coração da produção do Mato Grosso, ligando tanto ao Porto de Santos quanto à construção de um porto no sul da Bahia. Esse corredor Leste-Oeste será muito importante para fortalecer o escoamento da produção do Brasil central por meio de ferrovias, usando menos rodovias.
Vale enfatizar que essa produção do Brasil central tem 30, 40 anos, é muito recente. E ela encontrou uma malha ferroviária que não estava adequada para essa exportação, sobretudo porque percorria o centro de grandes cidades, e hoje está sendo transformada em uma malha mais eficiente, que garanta mais competitividade ao país e facilidade ao escoamento da produção. Isso vai ocorrer sobretudo nos próximos anos.
O país entregou a Norte-Sul, que passou 30 anos para ser construída. E agora vamos enfrentar o desafio de fazer a Leste-Oeste, melhorar as conexões com o Porto de Santos, com o Porto de Paranaguá. E também conectar os portos do Nordeste. A Transnordestina está em obras, precisa ser concluída e precisa ter uma conexão também com a Norte-Sul. Assim, vamos possibilitar a criação de uma competição entre os portos para exportar grãos. Hoje há poucos portos que exportam grãos. Isso faz com que nossas ferrovias tenham sempre que levar para o mesmo local sem ter uma opção de competição.
IM: Qual é atualmente a participação dos grãos no volume exportado via ferrovias e qual é o patamar que a pasta deseja chegar em um horizonte próximo?
RF: Do volume total da carga exportada pelo Brasil, apenas 17% chegam aos portos por ferrovias. Desses, 85% são minérios. Ou seja, temos uma participação ainda muito pequena [dos grãos]. Por isso, ainda precisamos construir as ferrovias para o coração da produção.
Queremos chegar a 40% [de participação do transporte ferroviário sobre o total exportado pelo país], com crescimento em grãos significativo. É óbvio que minério também vai ter que crescer para chegarmos nessa proporção.
Nós dividimos esse corredor em 5 trechos: a ferrovia de integração Oeste-Leste já tem o trecho 1 pronto, o trecho 2 está em obra. Estamos trabalhando para iniciar o trecho 3. E a ferrovia de integração do Centro-Oeste está em obra de Mara Rosa (GO) até o Mato Grosso, mas precisamos levar até Lucas do Rio Verde (MT) para que ela tenha condição de pegar o grão mais próximo da fazenda.
É claro que o valor agregado em soja é menor. Quando você deixa a ferrovia longe dele (do produtor), ele termina chegando ao porto de caminhão.
IM: Vimos recentemente um conjunto significativo de pedidos de revisão de contratos e devolução de concessões. Como a pasta está trabalhando para lidar com esse problema?
RF: Nós fizemos uma consulta ao TCU justamente com a abordagem de uma questão factual. Vimos que o país percorreu uma curva de experiência ao longo dos últimos anos, e muitos erros foram cometidos em concessões rodoviárias especialmente.
Nós propusemos ao TCU modificar os novos contratos, dando mais transparência, aproveitando a experiência internacional, fazendo contratos com mecanismos de reequilíbrio, porque são contratos de 35 anos. Quando muda preço de insumo ou acontece qualquer coisa mais significativa… Risco geológico, risco de demanda, insumo… A pandemia fez despencar a demanda em alguns trechos. Isso desequilibrou os contratos, e eles não tinham mecanismos para serem reequilibrados.
Estamos propondo trazer todos os contratos para um padrão de agora. Fazer um marco zero. E, daqui para frente, utilizar essa experiência. [Nossa sugestão] Foi acolhida com bons olhos no TCU. O relator já votou favoravelmente à nossa consulta e acreditamos que nesta semana o plenário decida. Se ele decidir favoravelmente, a conta do ministério é que vamos destravar algo em torno de R$ 80 bilhões no reequilíbrio desses contratos. Isso é muito significativo para o país, porque vai agilizar o investimento, sobretudo porque o concessionário já conhece o trecho, já tem projeto, já tem licença ambiental. E se licitasse novamente, qualquer nova empresa teria que percorrer todo esse caminho, fazer um novo projeto, buscar licença. Isso levaria tempo e atrasaria o país.
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