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Um artigo do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) do próximo ano acendeu um alerta em técnicos de orçamento do Legislativo, que avaliam que o texto permite ao governo alterar o mix de despesas condicionadas por meio de decreto, o que reduziria o poder do Congresso. O Ministério do Planejamento, por sua vez, garante que o dispositivo só libera o “descondicionamento” das despesas tal qual consta do projeto de orçamento quando o crédito for apurado e aprovado.
A divergência sobre o dispositivo pode virar mais um embate na disputa já em curso entre Executivo e Legislativo, que tentam assegurar para si mais poder sobre a alocação do Orçamento da União.
O bloco de despesas condicionadas ganhou atenção especial nas discussões do Orçamento de 2024 em razão do novo arcabouço fiscal. São R$ 32,4 bilhões “pendurados” na peça orçamentária, à espera do índice de inflação fechado até dezembro – uma inovação que ainda suscita dúvidas e interpretações jurídicas diferentes entre técnicos.
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O texto foi enviado ao Congresso com o limite de gastos corrigido pelo índice de doze meses até junho, fechado em 3,16%, além da alta de 1,7% autorizada pelas regras do arcabouço fiscal. Mas, com a necessidade de acomodar mais despesas, o governo apresentou um grupo de dispêndios atrelado à expectativa de inflação para 2023, estimada hoje em 4,85%.
Embora esse montante só possa ser usado quando o índice for apurado e o crédito suplementar aprovado pelo Legislativo no próximo ano, o destino desses recursos pode virar alvo de disputa desde já. Isso porque o PLOA, além de prever quais ministérios se beneficiarão com os gastos – o que em tese pode ser alterado pelos parlamentares -, também traz um artigo que dá as coordenadas de como essas despesas serão liberadas.
É esse dispositivo que acendeu um sinal amarelo no Congresso, e chegou a ser mencionado em nota conjunta das consultorias da Câmara e do Senado. Enquanto o Planejamento tem uma interpretação muito mais restritiva sobre o texto, os órgãos legislativos avaliam que o trecho permite a ampliação das dotações condicionadas por atos infralegais, como um decreto ou portaria, ou ainda mudar a programação das despesas que estão condicionadas à aprovação do Congresso.
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“Ademais, ainda que se admitisse a possibilidade de inserção no PLOA, entende-se indevida a permissão do caput do art. 4º para suplementação das dotações condicionadas marcadas com IU 9. Na sua forma atual, a redação do PLOA 2024 autoriza não só as condicionadas de R$ 32,4 bilhões, mas a ampliação desse condicionamento por crédito suplementar veiculado em ato infralegal”, diz a nota conjunta das consultorias de orçamento publicada no início do mês, documento que dá subsídio para o debate do PLOA no Congresso.
O artigo 4º é o que trata de autorização para abertura de crédito suplementar. Apesar de a nota técnica não entrar em detalhes, um técnico explicou ao Broadcast que o texto encaminhado no PLOA permite, na prática, que as despesas condicionadas sejam ampliadas por decreto ou portaria – atos infralegais. A avaliação é que esse aumento não faz nenhum sentido durante a execução dos gastos. “Só faz sentido na execução aumentar despesas em razão de fatos concretos, e não em cima de possibilidade dependente de outras coisas”, argumentou esse técnico.
Para outro técnico, ainda que a leitura dê a entender que o Executivo poderia aumentar as condicionadas por decreto, isso é algo que “logicamente” não seria feito. Mas, para ele, isso permite que o Executivo mude o carimbo de condicionadas de uma despesa para outra por conveniência, especificamente nas que estão atreladas à apuração da diferença da inflação.
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Desse grupo de despesas, calculado em R$ 32,4 bilhões, R$ 21 bilhões foram carimbados na proposta orçamentária como gastos com a transferência de renda do Bolsa Família. Como mostrou o Broadcast, junto do Ministério de Desenvolvimento e Assistência Social, as pastas da Defesa e da Educação são os órgãos que concentram os maiores volumes de despesas condicionadas à correção da inflação até o fim do ano.
No Congresso, uma leitura feita é de que o governo propôs a maior fatia dessas despesas para o programa social justamente como uma forma de pressionar o Legislativo a não mexer nas sugestões feitas pelo Executivo. Isso não impede, contudo, os parlamentares de reivindicarem suas escolhas para os gastos ‘pendurados’ pela inflação. E é essa disputa sobre o destino dos recursos que acaba pondo mais temperatura na avaliação jurídica do texto enviado ao Congresso.
O Planejamento nega a interpretação mais ampla dada por técnicos do Legislativo. À reportagem, a pasta afirmou que o dispositivo do PLOA só libera o “descondicionamento” de despesas no valor correspondente à apuração da diferença da inflação. Segundo o ministério, o Executivo só poderá “descondicionar” as despesas, substituindo um indicador, por decreto. “E só uma vez “descondicionado” que poderia remanejar para outras programações, dinâmica essa semelhante à dos recursos condicionados da regra de ouro”, explicou o ministério.
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O Planejamento lembra ainda que a previsão das despesas condicionadas à apuração do IPCA consta atualmente do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO), que ainda não foi votado no Congresso. Essas despesas só poderão ser autorizadas após a substituição do identificador de gasto, por meio da abertura de crédito adicional. Por essa razão, a pasta diz que “a proposta do Poder Executivo foi incluir autorização de crédito na própria LOA que permitisse a substituição do Iduso (identificador) na forma de crédito adicional”, além de ressaltar que o texto estabelece os critérios para abertura desse crédito.
“O entendimento é que a autorização não trata de autorizar a ampliação das despesas condicionadas, mas, sim, de permitir seus “descondicionamento” no montante possível após apuração do IPCA, uma vez que a legislação fixou que somente crédito adicional pode fazer esse movimento”, alega o Planejamento.
O debate sobre o mecanismo das despesas condicionadas à inflação pode, na prática, se tornar mais um capítulo da disputa entre o Congresso e o Executivo sobre a execução do Orçamento. O Legislativo tem atuado para não perder o poder conquistado sobre a alocação dos recursos federais, e tentado, inclusive, aumentar essa influência no próximo ano.
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Na nota técnica das consultorias da Câmara e do Senado, esse alerta fica claro. Ao tratar da previsão de despesas condicionadas, os técnicos do Legislativo afirmaram ser necessário “certo comedimento nessa concessão, de modo que o Congresso Nacional não venha a ter seu papel esvaziado quanto à alocação de recursos públicos”. “Quanto mais amplo o espectro dessa autorização, menos o Congresso toma conhecimento da composição atualizada dos orçamentos da União, reconfigurada por uma multiplicidade de atos esparsos, internos a cada órgão”, dizem os técnicos.
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