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Jair Bolsonaro já escolheu o nome de seu companheiro de chapa nas eleições de outubro. Embora ainda não tenha anunciado a parceria oficialmente, o presidente da República deve disputar o segundo mandato ao lado do general da reserva do Exército Walter Braga Netto, que ocupa atualmente o cargo de ministro da Defesa.
Em entrevista à Jovem Pan na segunda-feira (21), Bolsonaro praticamente eliminou as últimas dúvidas que pairavam sobre o candidato a vice. “Devemos ter um vice que demonstre à população que não é para ajudar a ganhar a eleição, é para ajudar a governar o Brasil” disse o chefe do Executivo. “Eu tenho que ter um vice que não tenha ambições de assumir a minha cadeira ao longo de um mandato.”
Na entrevista, o presidente afirmou ainda que a escolha ficará clara a partir de 2 de abril, data-limite para os ministros que disputarão as eleições deixarem seus cargos no governo por exigência da legislação eleitoral – seis meses antes do primeiro turno do pleito. Bolsonaro deu mais uma dica: o futuro candidato a vice “é de Minas Gerais e fez colégio militar”. Braga Netto nasceu em Belo Horizonte.
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“Estrategicamente, Braga Netto é interessante para o Bolsonaro porque reafirma sua ligação com as Forças Armadas, que são uma base importante para ele. Mas não deve trazer votos”, afirma Hilton Cesario Fernandes, cientista político e professor da Fundação Escola de Sociologia Política de São Paulo (FESPSP). “O mais provável é que ele faça essa escolha com base em uma decisão pessoal de não ter alguém que faça sombra a ele na chapa. Bolsonaro é muito receoso de ter alguém que possa se voltar contra ele. Não se dá bem com lideranças que aparecem muito, como aconteceu com o Hamilton Mourão [atual vice-presidente]. O perfil do Braga Netto é bem mais discreto”, avalia.
A relação entre Bolsonaro e Mourão, de fato, foi marcada por pouca proximidade e muita tensão e desconfiança por parte do presidente, com divergências públicas ao longo de quase três anos e meio de governo. O mais recente embate se deu em torno da invasão da Ucrânia pela Rússia. No mês passado, o vice-presidente fez duras críticas à guerra levada a cabo por Vladimir Putin, comparando as ações militares russas à Alemanha de Adolf Hitler às vésperas da Segunda Guerra Mundial e defendendo uma reação mais enérgica dos países do Ocidente – que não se limitasse apenas a sanções econômicas.
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Poucas horas depois, em sua live semanal nas redes sociais, Bolsonaro desautorizou o vice. Escanteado da chapa presidencial em 2022, Mourão se filiou ao Republicanos e pretende disputar o Senado pelo Rio Grande do Sul. Ele apoiará a candidatura de Bolsonaro à reeleição e promete ajudar a fortalecer o palanque do presidente no estado.
“Em termos de voto, [Braga Netto] não agrega. Trata-se de uma postura personalista do presidente, achando que ele, sozinho, será suficiente para vencer a eleição, como aconteceu em 2018, quando se apresentou como candidato antissistema”, avalia o cientista político Eduardo Viveiros de Freitas. “A questão é que hoje Bolsonaro não é mais o candidato antissistema. Ele é o sistema.”
Escudo anti-impeachment
Considerado um dos principais representantes do núcleo duro de apoio ao presidente dentro das Forças Armadas, Braga Netto conta com a absoluta confiança de Bolsonaro. A provável escolha pelo general, no entanto, desagradou a caciques do Centrão, que ainda tentam convencer o presidente a optar por um perfil político.
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Entre os nomes que chegaram a ser especulados para a vice, estavam as ministras Tereza Cristina (Agricultura) e Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos) – que poderiam fortalecer Bolsonaro junto ao agronegócio e aos evangélicos, respectivamente. Também foram cotados os ministros Gilson Machado (Turismo), Fábio Faria (Comunicações) e Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional), além do chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI), e do deputado federal Marco Feliciano (PL-SP).
Seguindo sua intuição e operando sob uma lógica distinta daquela defendida pelo Centrão, Bolsonaro prefere abdicar de um nome mais ligado ao Congresso com um objetivo muito claro: não jogar lenha na fogueira de eventuais pedidos de impeachment em um possível segundo mandato.
“A ideia de Bolsonaro é criar uma espécie de seguro anti-impeachment. Sempre que a situação política se complicou neste governo, o presidente levantou a ameaça militar”, diz Viveiros de Freitas. Pela lógica do presidente – que foi deputado por três décadas antes de chegar ao Planalto –, um vice com experiência e bom trânsito no Congresso poderia encorajar os parlamentares a tentarem cassar o mandato do titular na primeira oportunidade que se apresentar.
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“Desde o início do seu mandato, Bolsonaro tem mencionado a questão do impeachment. Parece ser algo muito presente no pensamento dele. De fato, o principal motor do impeachment é a relação política entre o Executivo e o Legislativo. O impeachment tem muito mais o caráter político do que jurídico”, destaca Cesario Fernandes. “Bolsonaro tem esse medo por causa de sua relação difícil com outros políticos. Ele sempre teve o receio de sofrer um impeachment”, prossegue.
“O presidente poderia prestigiar mais o Centrão ao indicar um vice desse grupo, mas isso criaria o desconforto que ele sempre demonstrou: de ter um vice que pudesse querer o lugar dele e fosse palatável ao Congresso como seu substituto”, avalia o docente da FESPSP. “No caso do Braga Netto, isso não aconteceria. O Congresso não veria vantagem na troca de presidente.”
De acordo com Viveiros de Freitas, o temor de Bolsonaro, em grande medida, também é fomentado pela memória ainda muito presente do processo de impeachment que afastou a ex-presidente Dilma Rousseff (PT), em 2016. “Essa ideia de um vice que trai é referência ao quadro político da gestão anterior. Em tese, Dilma teria sido traída por Michel Temer”, afirma.
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“Além disso, há a insegurança do próprio Bolsonaro. Ele se vê cercado pelo Judiciário, com ações em andamento que podem vir à tona quando deixar o governo. Um passivo de inquéritos e denúncias contra ele e sua família, a ser resolvido, provavelmente, após o fim das eleições”, completa.
Segundo o cientista político, a despeito das preocupações de Bolsonaro com o futuro no médio prazo, a escolha de Braga Netto implica riscos mais imediatos sob o ponto de vista eleitoral. “Em termos políticos claros, é realmente difícil entender por que escolher um militar e não um político profissional. É uma opção arriscada em uma conjuntura na qual as pesquisas apontam que a popularidade do presidente está baixa.”
A ‘cartada’ militar e o perfil de Braga Netto
Como parte da reedição da estratégia de 2018, Jair Bolsonaro espera unificar a base de apoio nas Forças Armadas e consolidar sua posição junto à fatia mais conservadora do eleitorado. Braga Netto surgiria como um símbolo capaz de engajar a militância bolsonarista em uma eleição que deve ser fortemente polarizada entre o atual inquilino do Palácio do Planalto e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), líder nas pesquisas de intenção de voto.
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Em um governo marcado pela forte presença de representantes das Forças Armadas no primeiro escalão – o Ministério da Saúde, por exemplo, foi comandado pelo general Eduardo Pazuello de maio de 2020 a março de 2021, no auge da pandemia de covid-19 –, Braga Netto teve papel estratégico no xadrez montado por Bolsonaro na Esplanada.
Em fevereiro de 2020, o militar foi para a reserva do Exército e assumiu a chefia da Casa Civil, no lugar de Onyx Lorenzoni. Em março de 2021, foi deslocado para o Ministério da Defesa, para apagar o incêndio causado pela demissão do general Fernando Azevedo e Silva – que levou à saída dos comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, em protesto.
Braga Netto iniciou sua trajetória no Exército brasileiro em 1975, quando ingressou na Academia Militar das Agulhas Negras. General de quatro estrelas, chegou ao posto máximo da carreira militar. Em 2009, tornou- se chefe do Estado-Maior do Comando Militar do Oeste. Quando ainda era coronel, Braga Netto foi adido militar do Brasil na Polônia, nos Estados Unidos e no Canadá.
Em 2016, foi responsável pela coordenação da segurança durante os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. Em 2018, na reta final do governo Temer, Braga Netto comandou a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro, passando a liderar as ações das Polícias Civil e Militar, do Corpo de Bombeiros e da administração penitenciária do estado. Foram dez meses de intervenção, encerrada em 31 de dezembro daquele ano.
Para Viveiros de Freitas, a escolha de Braga Netto como candidato a vice reflete, além da “insegurança política de Bolsonaro”, um discurso que resgata “o vínculo com o passado militar” e apresenta as Forças Armadas “como seu grande capital político”. “O Exército é praticamente um partido político informal. Bolsonaro, talvez na ilusão de que ainda pertença a esse estamento, alimenta a ideia de que terá respaldo dos militares independentemente do que faça”, afirma.
Segundo Hilton Cesario Fernandes, seria importante traçar uma linha divisória regulamentar entre os poderes político e militar. Em sua visão, ultrapassar esse limite não é saudável para a democracia e o bom funcionamento das instituições. “Não é uma relação natural. Os militares e os políticos têm papéis diferentes a cumprir”, afirma. “É claro que as Forças Armadas podem ter representantes na política, mas a mistura entre os poderes é ruim. A política é um palco para políticos. A relação política é diferente da relação entre os militares.”
A passagem de Pazuello pelo Ministério da Saúde é citada como um exemplo dos riscos a que militares e políticos estão expostos ao se imiscuir em um mesmo projeto de poder. “O desgaste que o Pazuello teve como ministro foi político, mas acabou incidindo também sobre as Forças Armadas. É sempre bom ter cuidado com essa relação. Essa mistura não é muito saudável”, alerta Fernandes. Alheio aos conselhos de alguns de seus próprios aliados e inspirado na fórmula de 2018, Bolsonaro parece decidido a dobrar a aposta em 2022. Ao seu lado, a caserna voltará às urnas.
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