‘Nova composição do Congresso impõe desafio à coalizão de um eventual governo Lula’, diz analista

Rafael Cortez avalia que maior governabilidade de Bolsonaro em relação a Lula é relativa: "não tem protagonismo na condução da agenda"

Anderson Figo

O resultado das eleições para o Congresso Nacional (senadores e deputados federais), com o fortalecimento de partidos do chamado “centrão”, como o PL e o União Brasil, dificulta a formação de uma eventual coalizão mais forte da base governista, caso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vença as eleições no segundo turno.

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A avaliação é do analista político e sócio da Tendências Consultoria Integrada Rafael Cortez, que participou, nesta segunda-feira (3), da edição especial do InfoMorning, programa exibido pelo canal do InfoMoney no YouTube. Segundo ele, “o resultado da eleição reforçou a ideia de que dificilmente a esquerda governa sozinha”.

“Tem essa percepção entre os agentes econômicos que uma orientação de política econômica muito à esquerda dificilmente acontece porque, no geral, uma boa parte do eleitorado brasileiro vai em direção à centro-direita. Isso era realidade no passado e continua sendo verdade agora em 2022, com a diferença de uma mudança no perfil dessa direita”, avaliou Cortez.

O que mais expressa isso, segundo o analista, é o declínio do PSDB comparado com o crescimento de partidos como o PL, o União Brasil e o próprio PP. Depois de um racha vir à tona e azedar os planos dos tucanos de terem um representante na disputa pela Presidência neste ano, eles ainda ficaram de fora da corrida pelo governo de São Paulo, onde tinham hegemonia há 28 anos.

Para o sócio da Tendências, há “uma chance alta de que a coalização do petista [Lula] não inclua o partido do presidente da Câmara [Arthur Lira, do Progressistas]. Tem um risco também [de acontecer o mesmo com Rodrigo Pacheco] no Senado, mas é mais forte na Câmara”.

“A gente viu o PL com um desempenho muito positivo, há uma chance de união, de fusão, do PP com o União Brasil. Eventualmente, se esses partidos se alinharem para fazer a reeleição do presidente Arthur Lira, é difícil o PT organizar uma coalizão alternativa no comando da Câmara”, afirmou.

“Há um risco no Senado de acontecer o mesmo, embora lá a composição eventualmente com PSD, MDB, ajude a colocar o PSD eventualmente numa coalizão com o governo do PT [em caso de confirmação da vitória de Lula no segundo turno]”, completou.

Isso afasta o risco de “eventuais retrocessos” em alguns pontos da agenda econômica que eram comentados pela campanha de Lula, segundo Cortez, como reavaliação de alguns pontos da reforma trabalhista. “Mas ao mesmo tempo impõe um desafio grande de manter essa coalizão de pé. Uma coalizão heterogênea.”

Já com uma eventual reeleição de Bolsonaro, Cortez afirma que “há uma chance de forte concentração de poder”, mas ressalta que “embora tenha uma concentração de forças em termos partidários, fica ainda uma incerteza se o Executivo é que vai organizar essa agenda econômica no próximo mandato”.

“É algo que a gente não viu nessa legislatura. A despeito de ter bastante apoio formal, quem tocou a agenda foi o Arthur Lira e o Rodrigo Pacheco”, avaliou o sócio da Tendências. “A agenda econômica foi muito descentralizada. Tem apoio econômico, tem, mas sem protagonismo.”

Fiscal

Cortez avalia que a questão fiscal é a chave para entender a condução econômica dos dois candidatos à Presidência. Segundo ele, Lula terá uma dificuldade mais de longo prazo, pois o Orçamento de 2023 já está praticamente comprometido.

“Sob Lula há uma incerteza mais longa porque dificilmente o Orçamento de 2023 vai contemplar as preferências do governo eleito. Basicamente esse Orçamento de 2023 vai refletir a construção de apoio para a eleição [da presidência] das casas legislativas. O Arthur Lira provavelmente vai articular para manter execução orçamentária elevada, o dito ‘orçamento secreto’ vai continuar muito forte, justamente para ele conseguir formar essa maioria”, disse.

Já sob Bolsonaro, o analista diz que essa “incerteza é reduzida”, porque “se Bolsonaro se reelege, já tem uma coalizão formada e o próprio Executivo que fez a peça orçamentária”. “Esse debate sobre a questão fiscal, que vai vir independentemente de quem ganhar, no Bolsonaro já vai aparecer no Orçamento de 2023. Sob Lula, vai aparecer ao longo do ano [que vem]”, afirmou.

O sócio da Tendências acredita que, embora a composição do Congresso possa impor um desafio a um eventual governo Lula, especialmente na questão fiscal, não existe um cenário de falta de governabilidade, como acabou acontecendo com a ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

“O Bolsonaro tem coalizão agora, mas não quer dizer que a equipe econômica tem protagonismo na condução da agenda. Pelo contrário, quem dominou nestes últimos anos de Bolsonaro foram Arthur Lira e Pacheco. Dizer que essa governabilidade é mais fácil com Bolsonaro não significa dizer que o Executivo é quem vai controlar essa agenda. Você pode ter uma governabilidade descentralizada”, concluiu.

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Anderson Figo

Editor de Minhas Finanças do InfoMoney, cobre temas como consumo, tecnologia, negócios e investimentos.