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O fascínio e o risco das criptomoedas

Tecnologia que suporta moedas virtuais deve ser absorvida pelo setor financeiro, mas futuro delas é incerto e depende de regulação

Equipe InfoMoney

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Com valorização de mais de 1.300% em 2017, a moeda virtual bitcoin tornou-se o ativo mais comentado no mundo e jogou luz sobre as criptomoedas. O futuro delas, no entanto, ainda é incerto, principalmente por conta do avanço na discussão sobre a sua regulação – que é defendida por diferentes agentes do sistema financeiro e legal para trazer segurança jurídica e menos volatilidade a essa nova modalidade de investimento. Enquanto alguns analistas se mostram otimistas, outros são cautelosos. O único consenso claro por enquanto é com relação à base das moedas virtuais, o blockchain (corrente de blocos em inglês). É unânime o entendimento de que essa tecnologia é um divisor de águas nas transações financeiras do mundo daqui para frente.

O mercado aguarda uma definição sobre a melhor organização do uso das criptomoedas. Na avaliação de Fernando Ulrich, economista- chefe de criptomoedas da XP Investimentos, o bitcoin representa a chegada de um novo padrão de tecnologia “com implicações em diversos setores e usos”. Segundo ele, “estamos aprendendo sua utilidade, impactos e abrangência, e é um protocolo tão importante quanto a própria internet, com potencial transformador”. Ele ressalta, no entanto, que é fundamental conhecer os riscos antes de começar a investir. Para Guto Schiavon, cofundador da FoxBit, empresa que negocia o bitcoin, a criptoeconomia é um caminho sem volta, embora ainda não esteja claro qual desses ativos prevalecerá. “Eu acredito num mundo onde essas moedas coexistam. Mas não se sabe qual será o produto final.” Enquanto isso, outras moedas virtuais têm conquistado espaço. Entre elas, a ethereum, com valor de mercado estimado em US$ 89 bilhões, e a ripple, com capitalização em torno de US$ 42 bilhões. O valor de mercado do bitcoin passou dos US$ 156 bilhões, segundo dados do CoinMarketCap, site para verificação de preços.

O blockchain, o robusto pacote tecnológico que acompanha as principais moedas, têm atraído o setor financeiro pelo mundo. “O potencial em torno dessa tecnologia tem ganhado um aspecto muito mais amplo nos últimos anos”, afirma Hélio Soares, sócio da Pinhão e Koiffman Advogados. O escritório presta consultoria em legislação de tecnologia da informação e telecomunicações. “O próprio sistema financeiro tem apostado no uso do blockchain ao criar o consórcio internacional R3, com investimentos milionários de diversas instituições financeiras ao redor do mundo”, completa. Com a participação de mais de 100 empresas do setor financeiro e de tecnologia, entre elas o Itaú, o R3 tem o objetivo de buscar soluções inovadoras para serviços financeiros. A tecnologia blockchain faz as vezes de um livro contábil, onde estão registradas todas as transações com as principais criptomoedas. Grandes bancos como JP Morgan, HSBC e Santander encabeçam projetos para implantar essa tecnologia em seus processos. A gigante brasileira BRF, do setor de alimentos, anunciou a sua utilização, em parceria com a IBM, para impedir fraudes na produção e comercialização de seus produtos.

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O bitcoin foi criado em 2009, mas se tornou popular em 2017. Embora leve a palavra moeda no nome, o conceito mais apropriado a ele é o de um meio de pagamento. Na avaliação do cofundador da empresa Wuzu, Anderson Nery, “a criptomoeda tem de ser encarada mais como um ativo”. Segundo ele, “existe um problema do lado do protocolo inicial do bitcoin em que uma operação [de pagamento] leva pelo menos 30 minutos para ser concretizada de ponta a ponta. Então é muito útil como meio de pagamento internacional”. Em outras palavras, se meia hora é um tempo longo demais para um pagamento no Brasil, torna-se vantajoso em relação às transações internacionais com moedas, que podem levar dois dias. Com investimento inicial de mais de R$ 1,5 milhão, a Wuzu é a primeira plataforma de negociação de criptomoedas brasileira com estrutura similar a de uma bolsa de valores. Segundo Nery, a expectativa é de que a empresa absorva 25% do mercado brasileiro de criptomoedas até o fim de 2018.

Além de não terem lastro nem serem garantidas pelos Bancos Centrais, as moedas como o bitcoin estão sujeitas a grandes variações. Segundo Ulrich, da XP, “quem decide comprar criptomoedas deve saber que se trata de ativos voláteis, com nível de risco acima da média. Cada criptomoeda tem suas próprias características que podem impactar no seu preço de mercado. Em geral, deve-se ter prudência e não alocar um capital de curto prazo”. No fim do ano passado, o bitcoin amargou a pior semana desde 2013 e despencou 31,4% em quatro dias. Em janeiro deste ano, a moeda chegou a acumular perdas de 35% em três dias. “O principal motivo da queda é a própria alta registrada ao fim de 2017. A cotação do bitcoin subiu em um claro momento de euforia entre investidores, especialmente em novembro e dezembro. Essa queda era esperada, e é muito salutar. É natural num mercado tão novo, para um ativo inédito em que ainda estamos aprendendo a precificar”, pondera Ulrich.

Paira sobre o recém-nascido mercado de criptomoedas a expectativa sobre uma possível regulação do setor. Soares, da Pinhão e Koiffman Advogados, defende dois aspectos indispensáveis para a organização do mercado. “Primeiro, que a regulação fomente a inovação e novos negócios. Que não regulamentem o assunto olhando no retrovisor, com base no mundo do século XX”, diz. “Segundo, e mais importante no caso do Brasil, é olharmos o que está acontecendo no mundo e buscarmos experiências que deram certo. Nosso país é célebre em criar jabuticabinhas regulatórias que nos excluem da integração internacional.” Em abril do ano passado, o governo japonês foi pioneiro ao reconhecer legalmente o bitcoin como moeda para pagamentos e aprovar as operações de 11 exchanges – empresas que disponibilizam plataformas para a negociação dessas moedas. O diretor de câmbio da FB Capital, Fernando Bergallo, diz que o maior desafio para regulação no Brasil será encontrar um modelo adequado à realidade do País. “Elas [criptomoedas] precisam de algum tipo de regulação, até mesmo para a segurança de quem as possui. Se houver problema, para quem o investidor vai reclamar?”

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São dois os caminhos mais utilizados para a compra e venda de criptomoedas. O primeiro é criar uma conta em uma exchange, onde será gerado um código, chamado de wallet. Há também a chamada operação peer-to-peer, na qual pessoas negociam diretamente, sem a necessidade de um intermediário. Os números mostram, no entanto, que o caminho via exchange parece ser o mais fácil. Criada em 2014, a Fox Bit é uma das maiores do mercado brasileiro e já negociou mais de R$ 3,5 bilhões. O crescimento do negócio somente no ano de 2017 foi excepcional, segundo a empresa. “Começamos 2017 operando R$ 1 milhão por dia, terminamos o ano negociando R$ 20 milhões diariamente”, conta Schiavon, sócio fundador da exchange.

*Esta reportagem foi originalmente publicada na edição de número 68 da revista LIDE, em 19/03/2018.