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Empresas pedem Governo 4.0: melhora no ambiente de negócios depende de estado moderno

Incentivos a tecnologia e metas reais de infraestrutura estão entre as principais demandas dos empresários

Equipe InfoMoney

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O Brasil é um sucesso quando se trata de agronegócio. As exportações do setor cresceram 13% no ano passado, em relação a 2016, somando R$ 96,01 bilhões. Comparado às demais áreas da economia o agro é exceção. No último ranking de competitividade geral elaborado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), o Brasil está em penúltimo lugar. É o 17º entre as 18 nações similares. Dos integrantes da América Latina, perde para Peru, Colômbia e México. Uma das consequências dessa falta de competitividade é o crescimento modesto. A economia nacional cresceu apenas 1% no ano passado, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O Brasil pode alcançar patamares mais altos desse ranking se tomar medidas em relação a pontos cruciais que atingem todos os negócios, como burocracia e infraestrutura, que interferem na competitividade.

É isso o que aponta a série de estudos da Federação da Indústria do Estado de São Paulo (Fiesp), realizada desde 2008. Trata-se de uma lista de 43 países responsáveis por 90% do Produto Interno Bruto (PIB), onde o Brasil ocupa o 39º lugar na classificação geral. As subcategorias abordadas na série revelam os problemas que precisam ser enfrentados com reformas políticas ágeis. Na média, durante dez anos, o Brasil manteve o título de campeão em burocracia, o 3º lugar em spread bancário e o 6º em inflação. “Esses são alguns dos indicadores que precisam ser alterados para deixarmos de ter uma economia típica de colônia, que se destaca apenas pelas exportações de commodities”, diz o vice-presidente da Fiesp, José Ricardo Roriz.

Não é necessário cruzar fronteiras para perceber os efeitos desses problemas no mercado. Basta entrar em um shopping center de qualquer centro urbano do país, onde uma camiseta feita na China custa metade do preço de um similar nacional. Ou ainda de peças de grifes brasileiras que são enviadas para serem fabricadas na Ásia e depois etiquetadas aqui. A Ellus, por exemplo, confecciona o jeans e a malha no Brasil, a alfaiataria na China e os bordados na Índia. O método virou praxe entre as confecções do mundo todo – mesmo grifes internacionais como Louis Vuitton, Burberry e Gucci – e a razão é o custo. Lá, sai mais barato.

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O que leva a esse diferencial de preços entre o produto nacional e o importado são as taxas tributárias (13,6%), sobrevalorização cambial (10,1%) e juros sobre capital de giro (6,8%). “O mundo inteiro está baixando os impostos, porque são as empresas que contratam e que investem.” O presidente Donald Trump, por exemplo, cortou de 35% para 15% os impostos para empresas americanas, apostando no aumento de empregos. “É uma tendência mundial e uma forma de dar competitividade para os produtos do país.” É uma espécie de volta do protecionismo econômico. Segundo Roriz, a redução de taxas americanas logo trará consequências negativas para o Brasil, que deve perder empresas estrangeiras e nacionais devido aos novos incentivos americanos. O Brasil está na contramão. Há perspectivas de novo aumento de impostos no ano que vem, porque as contas do governo não fecham.

“Enquanto o setor privado luta para alcançar novos patamares de produtividade, o governo perde cada vez mais o fôlego de investimento em questões cruciais”, diz Jorge Cavalcanti de Petribú, presidente do conselho da Petribú, fundada em 1729. “A usina é uma sobrevivente, já passamos por todos os tipos de governos e crises.” Mesmo estando na parte do Brasil que dá muito certo, a lucratividade poderia ser maior, segundo ele, “se houvesse mais investimentos em infraestrutura”.

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SEGURANÇA

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“Gastamos muito em segurança. Hoje roubam até o maquinário de irrigação e os cabos de eletricidade. Ao contrário do que acontece com produtores nos Estados Unidos, que deixam qualquer equipamento no campo, aqui para fazer isso eu preciso contratar vigias”, diz o usineiro. Ele também aponta a falta de investimentos em logística, estradas bem cuidadas que não causassem avarias nos veículos e portos mais ágeis e acessíveis. “Fica difícil entender porque um porto europeu cobra a metade do que pagamos aqui para despachar a carga.” Recentemente, Petribú foi visitar uma usina nos Estados Unidos que tem o dobro de tamanho da sua. “Enquanto aqui temos 200 empregados, a empresa americana funciona com 93. Além de possuírem legislação mais liberal, as pessoas lá podem trabalhar no período de safra sem folga e a usina é automatizada.” Qual a dificuldade da automatização? “O custo e a falta de mão de obra especializada”, responde o usineiro. Com capacidade de investimento reduzido do setor público em infraestrutura, a expansão da economia nacional está muito mais nas mãos do setor privado.

O Brasil é o quarto maior mercado de automóveis do mundo. Em plena crise, em 2015, o presidente da Jeep, Mike Manley, anunciou que iria quadruplicar o número de concessionárias no país, chegando a 200 lojas, e abrir uma montadora na cidade pernambucana de Goiana. Com investimento de R$ 7 bilhões para a produção do Jeep Renegade começaram as obras. A empresa montou uma fábrica com capacidade para produzir 700 carros por dia, 2,5 mil funcionários e 700 robôs. Da montadora também sai o Fiat Toro e o Jeep Compass. Trata-se da planta mais moderna da Fiat Chrysler Automobiles – conglomerado ítalo-americano com marcas como Dodge, Alfa Romeo, Ferrari, além da Jeep – no mundo.

Se o país investisse mais em produtos de alto valor agregado, também poderia se beneficiar com maiores montantes de exportação. “O Brasil é o maior produtor de café do mundo tanto em volume quanto em qualidade. Entretanto, a maior parte dos melhores cafés são vendidos para outros países ainda como produto cru, em sacas, sem torrar e embalar com foco no consumidor final. Com isso deixamos de agregar valor ao país e passamos a vender commodities. Acredito que o Brasil deve cada vez mais valorizar o produto maravilhoso que fabrica e passar a agregar valor com a torra, com marcas consistentes, e dar a devida visibilidade e mérito que a alta qualidade de cafés especiais brasileiros merece”, opina Amanda Capucho, CEO da Orfeu Cafés Especiais.

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Segundo a Associação Brasileira da Infraestrutura e das Indústrias de Base (Abdib), o investimento do setor privado em transporte, energia, telecomunicação e saneamento básico aumentou de 56,4% para 69%, entre 2010 e 2017. Na outra ponta, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) diminuiu os aportes em infraestrutura de 1,34% do PIB para 0,3%, no mesmo período.

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INFRAESTRUTURA

“A questão é que a competividade depende muito da eficiência da máquina pública”, diz Heleno Torres, professor da Universidade de São Paulo (USP). “Hoje temos gargalos gravíssimos. O aumento de produtividade depende de uma expansão energética. Já ficou provado que o sistema não aguenta picos de produtividade.” As hidrelétricas precisam ser finalizadas e outras opções energéticas, de acordo com o professor, consideradas com maior seriedade. Há outros exemplos. Em São Paulo, o Aeroporto Internacional de Guarulhos está com a capacidade esgotada. “Não dá para planejar reformas de dez em dez anos”, diz Torres. “O governo devia ter métricas de eficiência, agilidade e transparência, usando políticas motivadoras entre os funcionários como se fosse uma empresa privada. Um país com indústrias 4.0 – automatizadas –, precisa de um governo 4.0.”

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*Esta reportagem foi originalmente publicada na edição de 2018 da revista Fórum & Negócios.