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Desvalorização do peso deixa o brasileiro “mais rico” na Argentina? Entenda limites (e ilusões) do câmbio

Perda de valor do peso faz um real comprar mais unidades da moeda do país, mas hiperinflação argentina limita os ganhos com o câmbio

Monique Lima

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Menos de duas semanas atrás, no dia 11, uma sexta-feira, um real comprava cerca de 58 pesos, pelo câmbio oficial da Argentina. O valor já era alto quando comparado aos 35 pesos de janeiro deste ano. Mas acabou parecendo até baixo apenas três dias depois, quando um real passou a ser capaz de comprar mais de 70 pesos argentinos, na segunda-feira seguinte (14).

Com cada real valendo 72 pesos nesta quarta-feira (23) – ainda reflexo da decisão do banco central argentino de desvalorizar a moeda em 20% após a vitória do direitista Javier Milei nas primárias presidenciais do dia 13 – é comum ver brasileiros convencidos de que terão uma pequena fortuna nas mãos ao viajar para o país.

Segundo André Galhardo, economista e consultor da Remessa Online, o real, de fato, tem mais valor do que o peso no país vizinho, mesmo com a inflação galopante de 113,4% no acumulado de 12 meses até julho – até porque a desvalorização não aconteceu apenas agora em agosto. A moeda argentina já tinha perdido cerca de 75% do valor frente ao real ao longo do ano.

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“Nos últimos meses, a desvalorização do peso foi drástica. O aumento dos preços chegou em um nível de hiperinflação por lá, mas, ainda assim, a perda de valor da moeda consegue ser mais rápida do que a mudança dos preços, o que faz com o real tenha vantagem frente à moeda local”, diz Galhardo.

Não significa, no entanto, abundância infinita para o brasileiro que vai ao país a turismo. A desvalorização inesperada deste mês, combinada com a inflação desenfreada dos meses anteriores, fez com que os argentinos perdessem a referência de preços internos. Com isso, os reajustes são tão flutuantes quanto a variação do próprio câmbio.

“A ilusão do câmbio pode levar o turista a achar que tudo é uma maravilha”, diz Paulo Feldmann, professor da FIA Business School. “Mas a moeda está muito desvalorizada porque os preços subiram muito. É assim que a inflação funciona.”

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Big Mac é a referência

Para o professor da FIA, um bom parâmetro para entender se os produtos e serviços estão caros em um país é o índice Big Mac, feito pela revista britânica The Economist. O índice existe desde 1986 e, com base na teoria da paridade do poder de compra, avalia se a taxa de câmbio de diferentes países está em seu nível “correto”.

Como um Big Mac pode ser encontrado em qualquer país, com os mesmos ingredientes e forma de preparação, o preço do produto é usado como medidor da taxa de câmbio.

A última atualização divulgada em agosto deste ano, tem como referência o mês de junho. A metodologia prevê que o dólar dos Estados Unidos é o padrão, assim como o preço do Big Mac no país.

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Em junho, um Big Mac custava US$ 5,58 nos EUA e 1.650 pesos (US$ 5,99) na Argentina. Segundo o índice, a diferença de preços sugere que o peso argentino está 7,4% acima do seu valor “justo” em relação ao dólar.

Já no Brasil, o preço do Big Mac – de R$ 22,90 (US$ 4,81) – indica que o real está 13,7% abaixo da taxa de câmbio adequada, segundo a The Economist.

“O índice mostra que o Big Mac hoje é mais caro na Argentina do que no Brasil. Isso é um sintoma de que produtos e serviços básicos estão caros no país”, diz Feldmann.

E acrescenta: “O turista tem que estar ciente de que o real tem mais valor que o peso, mas isso não necessariamente se reflete em poder de compra.”

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Real, dólar ou peso?

João Victor Simões, especialista em operações internacionais da Blue3, afirma que existe uma diferença de precificação entre setores. “Existe uma diferença entre o que é precificado em pesos e o que é precificado em dólares”, diz Simões.

Segundo ele, experiências turísticas como passeios em vinícolas, visitas guiadas e hotéis mais conceituados vão custar mais caro porque são precificados em dólares, para atender os turistas. Já passeios comuns, idas a restaurantes e compra de roupas podem ficar mais acessíveis do que no Brasil, porque são precificados em pesos.

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No melhor dos cenários, o especialista afirma que é bom ter as três moedas (real, dólar e pesos) para negociar e avaliar as melhores opções locais. Real e dólar, de modo geral, se saem melhor porque valem mais do que o peso, mas há locais e serviços que é possível negociar com pesos.

Antes de viajar, a dica é converter o menor valor possível para dólares ou pesos, somente para as despesas iniciais de quando se chega ao país. O restante pode ser convertido direto na Argentina, para ter taxas de câmbio melhores.

A conversão de reais para pesos é fácil de fazer nas casas de câmbio. Já a busca por dólares é mais complicada. O primeiro problema é a escassez de dólares no país, que resulta em filas grandes e falta de disponibilidade na hora de trocar nas casas de câmbio. Outra questão é a cotação oficial, que paga menos do que o câmbio paralelo, chamado de “dólar blue”.

Pelo câmbio oficial, um dólar equivale a 346 pesos argentinos no dia 23 de agosto. Já pelo câmbio paralelo, são 725 pesos por dólar, segundo o jornal local El Cronista. Acontece que o dólar blue é ilegal, negociado por cambistas de rua e casas de câmbio ilegais.

“Ao negociar dólar blue, o turista precisa saber que não é regulamentado. Não tem como ter 100% de certeza de que aquele dinheiro é válido, que não são notas falsas”, diz Simões. “É uma saída para conversões melhores, mas não é recomendado.”

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Vale a pena cartão de crédito?

Outra opção é o dólar MEP, uma cotação exclusiva para turistas, para transações com cartões de débito ou crédito internacionais. Segundo o El Cronista, o dólar MEP estava avaliado em 665 nesta quarta-feira (23) – muito próximo do valor do “dólar blue”.

Cartões de débito internacionais, de contas dolarizadas, têm vantagens com o dólar MEP. Ao enviar reais para uma conta em dólar de mesmo CPF, o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) é 1,1%. A taxa de serviços das corretoras fica em torno de 2%. Isso soma 3,1% de custos com a operação para ter dinheiro em dólar, que pode ser usado tranquilamente no país.

Já os cartões de crédito brasileiros, que podem ser usados internacionalmente, podem deixar a fatura mais cara do que o previsto. Os custos maiores começam com o IOF, que é de 5,38% na conversão de uma compra em dólar ou peso para real. As taxas de serviços dos bancos tradicionais também são maiores, de até 6%, elevando o custo total para mais de 10%.

As bandeiras Mastercard e Visa operam com dólar MEP. Entretanto, com algumas diferenças. A Mastercard calcula a compra inicialmente com o dólar comercial, depois de 72 horas ela faz o estorno com a diferença de câmbio. Já a Visa opera direto com o dólar MEP.

Uma dica para entender se as compras em cartões valem ou não a pena é fazer uma pequena compra, de valor baixo, para entender como a bandeira do cartão irá converter os valores e aplicar as tarifas. Se o cartão de débito ou crédito fizer a conversão para dólar MEP, os especialistas indicam que é a opção mais segura e próxima da cotação blue para aproveitar a viagem.

Porém, é bom ter quantias em papel-moeda também, principalmente se a viagem for para outras cidades que não a capital Buenos Aires. Uma dica para economizar neste caso é perguntar nos estabelecimentos qual conversão eles usam para dólar: blue ou oficial. Se for blue, é possível negociar e pagar mais barato.

“É trabalhoso, exige pesquisa e planejamento, mas, para o turista, o timing é indiferente. Porque não existe nenhuma perspectiva de melhorias significativas no país nos próximos meses”, diz Galhardo, da Remessa Online.

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