Colunista InfoMoney: Juros, Investment Grade e a Bolsa Brasileira

Com a postura do BC, reduzi a projeção de crescimento econômico para 2009; grau de investimento tem impacto positivo

Caio Megale

Dois eventos importantes marcaram a conjuntura econômica brasileira durante o mês de abril. O primeiro foi a decisão, por parte do BC, pela elevação da taxa de juros básica da economia, realizando um movimento que não ocorria desde maio de 2005. O segundo acontecimento foi o anúncio feito, no último dia do mês, pela agência de rating S&P, de que, em sua avaliação, a dívida pública externa brasileira é considerada “grau de investimento” (investment grade).

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Ambos os acontecimentos têm implicações importantes de médio e longo prazo para a dinâmica das variáveis macroeconômicas e para os preços dos ativos financeiros no País, e, portanto, merecem atenção especial.

Começando pela alta na taxa de juros, a medida tomada pelo BC não apenas inverteu a tendência de afrouxamento monetário, como também surpreendeu pela magnitude do ajuste, uma vez que a maioria dos analistas esperava elevação mais modesta, 0,25 pp, contra o 0,50 pp optado pela autoridade monetária. A decisão de iniciar um ciclo de aperto monetário na última reunião do COPOM foi justificada pela percepção de que o balanço de riscos para a inflação futura tem piorado, uma vez que o crescimento da demanda interna segue bastante forte e sem sinais claros de acomodação.

“A despeito do comportamento muito positivo da bolsa, nem todos os ventos sopram a favor”

Some-se ao forte crescimento da demanda, as pressões significativas de custos que diversos setores da economia têm sofrido, induzidas pela alta nos preços das commodities no mercado internacional (especialmente petróleo, aço e grãos), contribuindo para pressionar ainda mais a inflação corrente. As divulgações recentes parecem já acusar o golpe nas diversas medidas de inflação do País, que têm superado as expectativas do mercado. Com efeito, o IPCA para 2008 parece mesmo estar rumando para algo próximo a 5%, acima, portanto da meta estipulada ao BC.

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A pergunta que se segue é: qual o tamanho do ciclo que devemos esperar diante desta realidade? A meu ver, o BC hoje está de olho em duas dinâmicas: a evolução da demanda agregada e o comportamento das expectativas de inflação para 2009 que, ao contrário das projeções do mercado para 2008, ainda estão próximas à meta de 4,5%, mas que podem começar a ser majoradas como resposta à atividade forte e à inflação mais alta de 2008.

Isto significa que enquanto não aparecerem sinais concretos de acomodação da demanda – o que poderá vir através de um menor crescimento mundial e como resposta à própria alta de juros – a inflação de 2009 estará ameaçada, e o BC seguirá subindo a taxa de juros. Como, em minhas estimativas, esses efeitos não devem ficar claros até meados do segundo semestre, dificilmente o tamanho do ciclo será menor do que 1,5 pp, sendo mais provável 2,0 pp ou um pouco mais.

Com a postura mais contundente do BC, reduzi a projeção de crescimento econômico para 2009 em cerca de 0,5 pp para algo próximo a 3,5%, o que tem implicações negativas para os lucros esperados das empresas, e, portanto, para as ações negociadas no Ibovespa.
Por outro lado, tivemos a elevação do Brasil a grau de investimento pela agência S&P. É um reconhecimento de que a austeridade adotada na política econômica nos últimos anos deixou a economia do País mais resistente a choques externos e domésticos.

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Esta chancela abre portas para um volume maior de investidores, especialmente aqueles cujo mandato permite investir apenas em ativos de países com grau de investimento, como muitos fundos soberanos da Ásia e Oriente Médio ou alguns fundos de pensão norte-americanos, exercendo pressão adicional de apreciação da taxa de câmbio.

No médio prazo, há também um efeito de gerar maior fluxo de investimentos produtivos em direção ao país, o que contribui para o aumento no crescimento potencial da economia. Assim, diferente do aumento de juros, o grau de investimento tem impacto positivo na lucratividade das empresas, e, portanto é uma boa notícia para a bolsa.

Em minha visão, a principal conseqüência deste cenário é que o mundo crescerá bem menos em 2009, já que as economias do ‘G3’ devem continuar fragilizadas, apresentando crescimento muito baixo; enquanto isso, os emergentes se ajustam, acusando o golpe do aperto monetário e da anemia prolongada das economias centrais.

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Ou seja, a despeito do comportamento muito positivo observado no mercado acionário brasileiro, muito beneficiado pela alta das commodities no mercado internacional, e que é justificável por eventos como o Investment Grade, nem todos os ventos sopram a favor. Se o Banco Central prolongar o ciclo de alta de juros, é possível que assistamos a períodos de realização, e, portanto, o investidor deve seguir atento.

Caio Megale é sócio da Mauá Investimentos e escreve mensalmente na InfoMoney, às quartas-feiras.
caio.megale@infomoney.com.br

Caio Megale

Economista-chefe da XP Investimentos. Foi secretário de Desenvolvimento da Indústria e Comércio e Diretor de Programas no Ministério da Economia entre 2019 e 2020. Antes, foi Secretário Municipal da Fazenda de São Paulo de janeiro de 2017 a dezembro de 2018. No mesmo período, foi vice-presidente da Associação Brasileira de Secretários de Finanças das Capitais (ABRASF). Entre 2011 e 2016, foi associado do Itaú Unibanco e um dos responsáveis pela equipe de economistas do banco. Anteriormente, foi economista do Lloyds Asset Management, da Máxima Asset Management e da Gávea Investimentos. Em 2005, participou da fundação da Mauá Investimentos, da qual foi sócio e economista chefe até 2010