SÃO PAULO – O mês de setembro de 2020 foi marcado por um agudo aumento da aversão ao risco, com a condução das contas públicas tirando o sono dos investidores.
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Nesse cenário, a Bolsa teve no mês passado a maior queda desde o tombo histórico de março, e até a renda fixa entregou rentabilidade negativa.
Isso porque, conforme aumenta o nível de incerteza sobre a condução da política fiscal em 2021, os investidores passam a cobrar um prêmio maior para comprar os títulos soberanos emitidos pelo governo, o que leva a uma queda nos preços dos papéis na mão dos investidores. Essa dinâmica é conhecida como marcação a mercado.
No mês passado o nervosismo e a consequente volatilidade nos mercados foi tão exacerbada pelos sinais desencontrados do Planalto com a equipe econômica que até mesmo o Tesouro Selic, o título público mais conservador, teve queda.
O Tesouro Selic é um título pós-fixado que acompanha a variação da taxa de juros, e, em tese, se a taxa de juros não cai, não teria por que o rendimento do papel também cair, certo? Errado.
Em setembro, o Tesouro Selic com vencimento em 2025 teve desvalorização de 0,46%, o que não ocorria desde maio de 2002, quando da eleição do ex-presidente Lula.
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Segundo Paulo Tenani, chefe de pesquisa da Aqua Wealth Management e professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV EESP), distorções como a queda do Tesouro Selic se devem ao ambiente extraordinário de juros nas mínimas históricas, como reflexo de uma pandemia sem precedentes.
Para Tenani, embora o quadro doméstico, com desemprego alto e atividade fraca justifique a estratégia, o prêmio oferecido pelo governo para os juros pós-fixados atrelados à Selic está incompatível com o nível de risco.
“E ainda mais para o estrangeiro. Com 2% ao ano, não paga nem o risco Brasil, quanto mais o risco cambial”, afirma Tenani. Assim, em períodos de maior turbulência, quando o investidor passa a pedir prêmios maiores para comprar papéis públicos, o retorno dos títulos já em negociação no mercado pode ficar negativo.
E no dia 10 de setembro, o Tesouro realizou o maior leilão da história, de R$ 46 bilhões, sendo cerca de 11,5% em títulos pós-fixados.
Com isso, a expectativa dos analistas, que já não era das melhores, ficou ainda pior, pela sinalização passada pelo governo ao mercado de quanto ainda precisa levantar para tocar a máquina pública neste momento.
“Isso levou à exigência de mais prêmio para compensar o risco futuro, principalmente nos títulos pós-fixados, que contam com menor liquidez no mercado”, diz a equipe da XP, em relatório.
Maior demanda por títulos atrelados à inflação
O investidor não está acostumado com a queda de um título pós-fixado que acompanha a taxa de juros, mas o Tesouro Selic é um ativo negociado no mercado, que assim como qualquer outro está sujeito ao equilíbrio, ou não, entre oferta e demanda, afirma Flávio Serrano, economista-chefe do banco de investimento Haitong.
Neste momento, explica o especialista, a demanda dos agentes está muito mais voltada para os títulos públicos indexados à inflação, diante do cenário de crescente risco fiscal que pode desembocar em um aumento de preços logo mais.
Por isso, a procura pelos pós-fixados, que já hoje não pagam a inflação, caiu drasticamente, e o governo se viu instado a ter de oferecer algum tipo de prêmio para conseguir fazer a colocação dos papéis, diz o economista-chefe do Haitong.
Ele ressalta, contudo, que a tendência é que haja ao longo do tempo uma correção natural nos preços do Tesouro Selic, que devem voltar a se aproximar do rendimento oferecido pela taxa básica de juros.
Se aplicar agora, o investidor pode até se beneficiar desse fechamento, afirma o especialista. Só que, em um ambiente de elevado nível de incerteza, não dá para saber quando se dará essa correção, e mesmo se ainda não virão novas quedas antes do ajuste, alerta Serrano. “O mercado é assim, não tem almoço grátis.”
E a reserva de emergência?
Seja como for, se carregar o titulo até o vencimento, o investidor terá assegurado o valor que foi prometido no momento da compra do ativo, destaca o economista. “Tem volatilidade no meio do caminho, mas o retorno está garantido.”
Segundo a equipe de análise da XP, apesar da queda em setembro, o Tesouro Selic segue como uma boa alternativa para a reserva de emergência.
O risco de crédito do papel ainda é o menor do mercado, e com liquidez diária, o que significa que o resgate pode ser feito a qualquer momento, destacam os profissionais da XP.
“Além disso, o efeito para o pequeno investidor é muito pequeno (cerca de 0,2%), por isso não há motivos para pânico.”
Tenani, da Aqua, afirma que, para o dinheiro de curto prazo, necessário para daqui menos de um ano, não há de fato muita opção no quadro atual. “O BC está penalizando o pequeno poupador nesse sentido.”
Mas sendo possível alongar um pouco mais o horizonte, até dois anos, daí então já é hora de partir para alternativas minimamente mais arrojadas, afirma o especialista, que cita títulos públicos prefixados de dois anos com 4,7% de juros.
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