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Tzirulnik: Chegou a hora de ter lei sobre mercado seguros, e não judicializar sinistros

PL está no Congresso há duas décadas e foi arquivado durante o governo de Jair Bolsonaro mas voltou a ser discutido em julho de 2023

Estadão Conteúdo

O advogado Ernesto_Tzirulnik participa de Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) para discutir o PLC 29/2017, que cria a nova lei geral de seguros. (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)
O advogado Ernesto_Tzirulnik participa de Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) para discutir o PLC 29/2017, que cria a nova lei geral de seguros. (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)

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Na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, o Projeto de Lei 29/17, que trata do mercado de seguros, promete ser uma espécie de novo marco para o setor. Por isso, o governo tem acompanhado tão de perto as discussões, a elaboração do texto e, na sequência, também a votação. Para o advogado Ernesto Tzirulnik, um dos mentores do PL, o parecer é fruto de um consenso entre o governo e o setor privado.

O texto está no Congresso há duas décadas e foi arquivado durante o governo de Jair Bolsonaro, voltando a ser discutido no meio do ano a pedido do Ministério da Fazenda. Desde então, o mercado entrou em ebulição. No final de novembro, o relatório foi apresentado pelo senador Jader Barbalho (MDB-PA). Conforme Tzirulnik, a Confederação Nacional das Seguradoras (CNSeg) e a Federação Nacional dos Corretores (Fenacor) até tentaram promover mais ajustes no texto, mas acabaram endossando o relatório final.

Para Tzirulnik, chegou a hora de o Brasil ter uma lei sólida para o setor e acabar com a judicialização de sinistros por meio de Ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adin) ou questionamentos do princípio da legalidade. “Se eu tiver essa lei, eu consigo fazer uma boa ação normativa e modificar o mercado no sentido do que é do interesse do mercado e do governo.”

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Leia abaixo os principais trechos da entrevista com Tzirulnik:

Qual a sua avaliação sobre o relatório mais recente?

É um texto que, como qualquer outro, pode ter reparos a fazer, mas fazer esses reparos agora seria voltar atrás em negociações feitas desde 2016. Houve um acordo para que o texto se transformasse em um projeto na Câmara, mas veio o governo Bolsonaro, que não queria uma modificação Legislativa. Tinha uma opção ideológica por ação administrativa, ou seja, produzir resoluções, circulares por dentro das agências reguladoras da Susep… Houve uma objeção do governo ao projeto, que já havia sido recebido e relatado muito favoravelmente pelo então apenas senador Rodrigo Pacheco. Ele avaliou que, se colocasse em votação, certamente perderia, então deixou de fora. Aí o projeto ficou até o final do governo Bolsonaro arquivado. Quando se inicia o governo Lula, Pacheco, que era presidente do Senado, tomou a iniciativa de pedir o desarquivamento.

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Por que isso é tão importante? O governo espera impulsionar a economia. E o setor privado?

Porque a avaliação é a de que precisa ter lei, e não ficar brigando por meio de Adins ou questionamentos do princípio da legalidade. Se eu tiver essa lei, eu consigo fazer uma boa ação normativa e modificar o mercado no sentido do que é do interesse do mercado e do governo. O projeto voltou a tramitar.

Desde então, o mercado entrou em ebulição…

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O mercado entrou em ebulição. E aproveitou – eu acho que aí tem também uma ação política – para reclamar e tentar ganhar alguma coisa, é normal. Mas houve condução muito austera por parte do secretário de Marcos Pinto (Fazenda), do superintendente Alessandro (Octaviano, da Susep) e, inclusive, pessoalmente, pelo ministro Fernando Haddad. O próprio mercado comenta que, em uma reunião, Haddad perguntou o que estava acontecendo, quais eram os problemas, sem firulas. E negociaram pontos.

O PL é fruto, então, de um entendimento do governo com o mercado?

(Representantes do governo) Discutiram diretamente até o último momento com o mercado. Então saiu um acordo muito firme com eles. O ministro, inclusive, falou: ‘agora você precisa chamar todo o mercado e dizer que você vai fechar e que todos vão apoiar’. A CNseg avaliou o texto como o melhor estado da arte, então não dá mais para ficar forçando. Os contratos de seguro são necessariamente redigidos pelo próprio mercado porque as seguradoras dependem dos resseguradores. Elas produzem documentos de uso internacional e vão fazendo os ajustes nacionais ao seu modo e, se cada assegurado quiser reescrever um contrato de seguro, fica para elas algo inadministrável. O ministério do Desenvolvimento está de olho nisso. E o da Fazenda também.

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Como fica agora?

O governo deixou claro para todos nós que seria uma lei e que ele poderia criar uma árvore regulamentadora válida que não contrariasse a lei. Estou há 42 anos no mercado e nunca vi isso acontecer. Isso aconteceu lá no tempo do Getúlio (Vargas), depois nunca mais. Uma ação estruturada para o desenvolvimento econômico e à sociedade sempre ficou muito ao sabor das questões de momento e as questões de momentos nascem, em geral, daqueles que estão mais próximos de seguradores e corretores, então não sai da sociedade. Enfim, acho que a opção pela legalidade no Brasil é uma opção correta, até porque todos os países têm leis especiais de contratos de seguro hoje.

Esse novo PL está alinhado com o que acontece no mundo?

O Brasil está se ajustando de uma forma muito contemporânea. É claro que existem insatisfações de seguradores, de resseguradores, de segurados, mas acho que é um texto que protege a coletividade de segurado, é uma forma que é muito elogiada por estrategistas do direito do seguro internacionais. Isso foi uma opção política lá no início da elaboração do projeto, que é criar uma estrutura com uma espinha dorsal sólida. Do jeito que está hoje, gera muitos conflitos e muita insegurança.

Onde começa essa insegurança?

Já na formatação dos contratos.

Os seguros já envolvendo os crescentes números de desastres climáticos já estão contemplados no PL?

Sim, a partir de agora a seguradora tem que se reunir e perguntar aquilo que eles (segurados) consideram como relevante. E o segurado, claro, tem o dever de falar a verdade, mas sobre aquilo que foi perguntado. Ele não tem de descobrir o que quer saber a seguradora. Quem tem que falar o que é relevante é o setor, a seguradora. A partir de agora está absolutamente tudo segurado, menos o que estiver claramente na lista de riscos excluídos.

É praticamente o oposto de hoje…

Sim.. agora você vai pegar sua apólice e vai passar a entender.

E o resseguro?

O resseguro tem um contrato diferente. Está abordado no PL. No mercado brasileiro tem um fenômeno diferente do resto do mundo, são estágios de desenvolvimentos diferentes. Tudo veio mudando desde que se começou a desmontar o monopólio, que tutelava muito o segurado. No Brasil, temos uma política de subscrição de risco que é definida pela resseguradora, não pela seguradora. Então, vem de fora a política de subscrição de riscos, que pode ser discriminatória. E a responsabilidade, a seguradora vai dizer, não é minha é porque o mercado só me oferecia isso… A seguradora é uma escrava do regulador. Na hora do pagamento, existem muitas apólices no Brasil que te dizem o seguinte: eu, seguradora, só vou efetuar pagamento a você, segurado, para um sinistro que tenha sido considerado coberto depois que eu receber. Por isso gostam muito de propor aos segurados que realizem arbitragens no exterior. Segundo as regras. Quais? as regras do mercado internacional de resseguros. As regras de equidade que eles consideram boas. As regras que no mundo desenvolvido fornecedor de ressegura prevaleça.

E o que diz o PL?

O projeto de lei diz que a arbitragem de sinistro no Brasil, envolvendo contratos brasileiros, tem que ser realizada no Brasil. E o que vai se aplicar de legislação não é aquilo que se queira no momento, é a lei brasileira. Contratou seguros sob o regime da lei brasileira? Quando tiver o problema, você vai resolver segundo a lei brasileira e não vai levar os nossos segurados para fazer arbitragem em Paris, Miami, Nova York… E a decisão tomada deve ser divulgada publicamente – ou seja, aquilo que os tribunais estatais são obrigados a fazer, que é divulgar sua jurisprudência para a sociedade saber o que está sendo decidido.