Qual impacto de aval do STF à execução extrajudicial de imóvel com dívidas ao consumidor?

Supremo decidiu que os bancos podem tomar imóveis dados como garantia em empréstimos imobiliários extrajudicialmente em caso de inadimplência

Maria Luiza Dourado

Publicidade

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que autoriou a retomada de imóveis por bancos sem a necessidade de acionar a Justiça em casos de inadimplência em financiamentos imobiliários mantém intactas as regras do jogo, sinalizam especialistas consultados pelo InfoMoney.

O Supremo decidiu no dia 26 de outubro que os bancos podem tomar imóveis dados como garantia em empréstimos imobiliários extrajudicialmente em caso de inadimplência. O debate girou em torno dos contratos de mútuo com alienação fiduciária, modalidade em que o imóvel é dado como garantia do empréstimo até o pagamento integral das parcelas.

A conclusão do STF foi que a execução extrajudicial nos contratos com a chamada alienação fiduciária, prevista na Lei 9.514/1997, em vigor há 26 anos, não viola os princípios do devido processo legal e da ampla defesa. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 860631, com repercussão geral (Tema 982).

Continua depois da publicidade

“Nada muda em relação ao procedimento envolvendo contratos com alienação fiduciária que já ocorre no Brasil”, explica Marcelo Tapai, especialista em direito imobiliário. “Essa decisão valida que a execução extrajudicial é legal e, dentro do rito do Judiciário, acaba com a possibilidade de ter sua constitucionalidade questionada novamente. Ninguém pode entrar com recurso contra.”

Impactos no mercado e ao consumidor diretamente também são limitados, na visão de Daniel Gava, CEO da proptech Rooftop. “O funcionamento da execução extrajudicial no Brasil tem sido o mesmo desde 1997. Então não vejo impacto sobre juros ao consumidor. O jogo continua igual. Seria diferente se a decisão tivesse sido contrária. Aí sim o crédito imobiliário seria profundamente remexido”.

Antes da alienação fiduciária, a modalidade de hipoteca dentro do crédito imobiliário era muito mais comum no Brasil. Na hipoteca, mesmo após o crédito contraído, o bem permanece no nome do devedor; não existe transferência da sua propriedade para o nome do credor – transferência essa que é a premissa da alienação fiduciária e que conferiu mais segurança jurídica para os bancos a partir da sua implementação, em 1997.

Continua depois da publicidade

Devedor ainda pode procurar a Justiça?

Sim. A decisão do STF, no entanto, não significa que o devedor está desamparado, segundo Gava. “Ela não afasta o controle judicial em caso de nulidade ou infração por parte do credor”.

Isso significa que, caso o devedor acredite que o haja alguma nulidade ou infração por parte do credor, ele ainda poderá procurar a Justiça e mover uma ação contra o mesmo, buscando a anulação da execução do imóvel.

O Marco das Garantias tem alguma coisa a ver com isso?

Não. A decisão do STF endereça somente o questionamento da constitucionalidade sobre a execução extrajudicial presente na Lei 9.514 de 1997. Já o Marco das Garantias, Projeto de Lei 4.188/2021, que aguarda sanção presidencial (não está em vigor), traz como grande novidade a possibilidade de execução extrajudicial de carros.

Publicidade

No primeiro texto do PL, houve uma tentativa de permitir a execução extrajudicial de bens móveis em geral, ou seja, autorizar que bancos e outros credores retomasse o bem sem necessidade de recorrer à Justiça – como já acontece com os imóveis.

Após alterações no Senado, o texto que aguarda a sanção presidencial traz a possibilidade de uso da execução extrajudicial para recuperar dívidas ligadas a apenas veículos automotores alienados fiduciariamente. Caso sancionado sem alteração, será possível que credores (como bancos ou seguradoras) retomem o carro em processo realizado perante os Detrans, por meio de empresas especializadas em registro centralizado, que fariam todos os atos de processamento da execução.

“Essa sim é uma decisão que, se sancionada, muda as regras do jogo, já que atualmente o processo de recuperação de um bem móvel, como um carro, depende do ajuizamento da ação de busca e apreensão. É necessário localizar devedor e contatá-lo, além localizar o bem. É um processo muito mais moroso”, afirma Gava.

Continua depois da publicidade

(Com informações do Estadão Conteúdo e Agência Senado)

Maria Luiza Dourado

Repórter de Finanças do InfoMoney. É formada pela Cásper Líbero e possui especialização em Economia pela Fipe - Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas.