Conteúdo editorial apoiado por

Previdência privada como garantia de empréstimo? Veja como medida pode virar realidade no Brasil

Texto em discussão no Congresso busca ofertar garantia de baixo risco com redução das taxas para concessão do crédito

Gilmara Santos

Publicidade

A Comissão de Assuntos Econômicos, do Senado Federal, aprovou recentemente novas garantias para a tomada de empréstimos no Brasil. São elas:

O texto segue em regime de urgência para a análise do Plenário e, se aprovado, vai para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O senador Rogério Carvalho (PT-SE), relator do texto, explica que o objetivo do PL 2250/2023 é oferecer uma garantia de baixo risco que permita a redução das taxas de concessão dos empréstimos.

Continua depois da publicidade

Segundo o governo, pessoas que não possuem um imóvel ou outro bem poderiam se utilizar das novas garantias para terem acesso ao crédito.

O projeto pretende evitar que os titulares de produtos financeiros alcançados pela norma tenham que sacar os recursos dos planos de Previdência em condições desfavoráveis quando precisarem de dinheiro de forma emergencial.

Rogério Carvalho destaca ainda que, no caso de planos de previdência aberta, seguros de pessoas com cobertura por sobrevivência e Fapi com opção de alíquotas regressivas, os resgates antecipados “podem ser extremamente onerosos em função da incidência de imposto de renda”.

Continua depois da publicidade

Dyogo Oliveira, presidente da CNseg (Confederação Nacional das Seguradoras), lembra que o mercado nacional dispõe de aproximadamente R$ 1,2 trilhão em reservas de previdência, seguros de pessoas (regime de capitalização) e títulos de capitalização.

“O projeto de lei aprovado pela CAE é positivo e vem em linha com o que já acontece hoje na previdência complementar fechada. Beneficiários de fundos de pensão já conseguem obter empréstimos mais em conta, garantindo sua sustentabilidade financeira, sem abrir mão da poupança para a aposentadoria. O mesmo será possível, se aprovado o PL 2250/2023 para a previdência privada aberta”, explica Alexandre Teixeira, CEO da pensiiontech uFund.

Estudo da pensiontech uFund mostra que o percentual de juros cobrado neste tipo de financiamento fica abaixo do de outras modalidades de crédito, como o consignado (INSS e privado).

Continua depois da publicidade

“Também apuramos que a diferença de prestação a ser paga quando comparada com a do parcelamento do cartão é bastante alta. Quem tem previdência complementar fechada já pode financiar automóveis, imóveis, bens de consumo, viagens com juros bem menores porque o próprio patrimônio do participante acumulado no fundo de previdência serve como garantia do empréstimo”, salienta Teixeira.

“[A medida] permite uma redução expressiva do custo e da burocracia que a constituição das garantias tradicionais impõe, através de hipotecas de imóveis e alienação fiduciária de veículos, por exemplo”, complementa o especialista.

Para André Beschizza, especialista em direito previdenciário, a utilização da previdência privada como garantia pode ser benéfica por permitir que “as pessoas tenham acesso a empréstimos com taxas mais favoráveis, sem precisar comprometer seus outros ativos ou recorrer a modalidades mais arriscadas de crédito”, acrescenta.

Continua depois da publicidade

Segundo Dyogo Oliveira, a projeção é que a modalidade tenha taxa anual entre 15% e 20%. Por comparação, o financiamento de veículo, que tem o próprio bem como garantia, possui taxa de 26% ao ano. E o crédito consignado para o setor privado, de 36,9% ao ano, e, para o setor público, de 20,6% ao ano.

Com 71,9 milhões de brasileiros inadimplentes, número estimado pelo Mapa da Inadimplência e Negociação de Dívidas da Serasa, uma taxa de juros menor pode contribuir para reduzir o problema que tanto atrapalha o planejamento financeiro das famílias, ressaltam os especialistas consultados.

Recursos bloqueados

Enquanto os valores estiverem em garantia, o tomador do empréstimo não poderá resgatar o dinheiro destinado à previdência até a quitação da dívida ou substituição dessa garantia por outra, em comum acordo com as instituições.

Já a portabilidade, que ocorre quando o consumidor decide mudar de entidade administradora dos planos de previdência, dependerá da anuência da instituição que conceder o crédito.

Segundo a Agência Senado, o PL prevê que o prazo de quitação da dívida contraída também não poderá ser maior que o previsto para começar a receber os valores como aposentado.

No caso da cobertura de risco (morte, por exemplo), o prazo final será o período de vigência. O mecanismo poderá ser usado apenas em empréstimos concedidos por instituições financeiras, vinculadas ou não à entidade operadora do plano de previdência, seguro, título de capitalização ou instituição administradora de Fapi.

“Hoje não há um dispositivo legal que traga segurança jurídica para a concessão, como garantia em operações de crédito, do direito de resgate assegurado aos participantes de planos de previdência complementar, aos segurados de seguros de pessoas, aos cotistas de Fapi e aos titulares de títulos de capitalização”, ressalta Carvalho em entrevista concedida à Agência Senado.

Fique atento

Pedro Afonso Gomes, economista e presidente do Corecon-SP (Conselho Regional de Economia de São Paulo), destaca que a vantagem do PL seria a redução de juros, que são elevados para o consumidor pessoa física. No entanto, comenta ele, “temos exemplos de situações em que foram ampliadas as garantias para os bancos e não houve redução de taxa de juros”.

Um exemplo é a lei da alienação fiduciária, que consiste na transferência da propriedade do bem financiado ao credor como forma de assegurar que este receberá o que lhe for devido. Segundo Gomes, a medida não culminou com a redução do custo dos financiamentos.

“Com a Lei da Recuperação Judicial e Falência, de 2005, a gente achava que o custo do crédito cairia, mas isso não ocorreu. Em recuperação judicial, são poucos os casos em que a instituição oferece crédito e muito menos com juros mais baixos”, salienta.

Gomes reforça que a compra de um ativo, como um imóvel, exige planejamento. “Se o consumidor não se planejar, todo o processo vai ser desvantajoso podendo entrar em empréstimos desnecessários”, alerta o economista.

Gilmara Santos

Jornalista especializada em economia e negócios. Foi editora de legislação da Gazeta Mercantil e de Economia do Diário do Grande ABC.