Protestos na China adicionam novo fator de incerteza e impactam mercados; analistas esperam por mais volatilidade

A trajetória do mercado agora é mais incerta e dependente de notícias de curto prazo, avaliam especialistas

Lara Rizério

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Mais incertezas vem rondando a China, com uma escalada no último fim de semana de protestos no país contra as políticas de Covid-zero gerando impactos no mercado.

Autoridades de Xangai levantaram barreiras nesta segunda-feira em torno de uma área central da cidade onde centenas de pessoas protestaram no fim de semana contra medidas rigorosas da Covid-19, enquanto manifestações contra o isolamento se espalhavam pela China.

Das ruas de Xangai e da capital, Pequim, a dezenas de campi universitários, os manifestantes fizeram uma demonstração de desobediência civil sem precedentes desde que o líder Xi Jinping assumiu o poder há uma década.

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Os protestos contra as restrições do Covid eclodiram em dezenas de cidades, sendo que em algumas houve manifestações pedindo a renúncia de Xi Jinping. A revolta pública se espalhou ainda mais após um incêndio mortal em Xinjiang, onde muitos acreditam que as restrições impediram a fuga ou o resgate.

Os protestos ocorrem quando o número de casos de Covid-19 aumenta novamente na China, onde as autoridades estão preocupadas que, sem medidas restritivas, as mortes possam aumentar em meio à população inadequadamente vacinada. As novas infecções a nível nacional subiram para 38.808 no domingo, mantendo uma tendência ascendente desde o início do mês. Pequim registrou 3.860 casos no domingo, abaixo das 4.245 infecções do dia anterior, mas significativamente acima de pouco mais de 400 há duas semanas. O governo chinês está em um impasse, aponta o Bradesco BBI, pois ainda precisa impedir que a disseminação do vírus se espalhe durante os meses mais frios do inverno, enquanto lida com protestos civis contra bloqueios mais restritivos.

Neste cenário, os contratos futuros de minério de ferro em Cingapura chegaram a cair mais de 3% nesta segunda-feira, recuando após uma alta de três dias, à medida que os protestos no país, principal produtor mundial de aço, motivaram cautela.

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O ingrediente siderúrgico, no entanto, permaneceu sustentado na Bolsa de Commodities de Dalian após o anúncio de sexta-feira de um novo corte na taxa de compulsório dos bancos na China para reforçar a desaceleração da economia.

O minério de ferro de referência para dezembro na Bolsa de Cingapura caiu 1,3%, para US$ 97,90 a tonelada, depois de recuar até 3,2% no início da sessão. O contrato mais negociado na bolsa de Dalian para entrega em janeiro encerrou as negociações diurnas com alta de 2,4%, a 755,50 iuanes (US$ 104,86 ) a tonelada.

A referência de Dalian atingiu 764,50 iuanes por tonelada no início do dia, o maior nível desde 17 de junho, ampliando os ganhos da semana passada estimulados pelas esperanças de recuperação da demanda de aço enquanto a China está tomando novas medidas para sustentar um setor imobiliário doméstico em dificuldades.

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“Os traders continuam focados em mais estímulos no próximo ano”, disseram analistas da Westpac em nota. Parte do otimismo, no entanto, se dissipou em meio aos protestos.

O petróleo também tem um dia de queda, de cerca de 3% para o contrato futuro do brent com vencimento em janeiro, na casa dos US$ 81 o barril, zerando os ganhos de 2022, com os temores sobre o impacto dos protestos para a demanda do combustível para o maior importador da commodity no mundo.

Os protestos também impactaram os mercados acionários mundiais, com os futuros dos índices de ações dos Estados Unidos chegando a cair nesta segunda-feira, uma vez que protestos nas principais cidades chinesas contra a política rígida de Covid zero reacenderam as preocupações com o crescimento econômico. As ações da Apple tinham queda de 1,7% no pré-mercado, por volta das 10h (horário de Brasília), com a notícia de que a empresa terá um déficit de produção de quase 6 milhões de unidades do iPhone Pro devido à agitação na fábrica de Zhengzhou da Foxconn.

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Na Ásia, o índice CSI 300, que reúne as maiores companhias listadas em Xangai e Shenzhen, fechou com queda de 1,13%, registrando a maior perda diária desde 28 de outubro enquanto o índice de Xangai perdeu 0,75%. O índice Hang Seng de Hong Kong teve queda de 1,57%.

Na B3, as ações de mineradoras e siderúrgicas têm uma sessão de queda, com Vale (VALE3) em queda de cerca de 1%, CSN Mineração (CMIN3) em baixa de 1,7%, enquanto as siderúrgicas registram quedas mais fortes, de cerca de 5% para CSN (CSNA3), de 4,5% para Usiminas (USIM5) e de cerca de 2% para a Gerdau (GGBR4).

Visão do mercado

Para Sophie Altermatt, economista da Julius Baer, embora o recente anúncio de corte de juros sinalize a intenção das autoridades de apoiar a economia, o impacto econômico real da injeção de liquidez no sistema bancário provavelmente será bastante limitado, pois não é a falta de liquidez e de oferta de crédito que está restringindo o crescimento do crédito, mas sim a demanda interna fraca.

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“O apetite por crédito das famílias provavelmente permanecerá fraco, desde que permaneçam preocupados com possíveis lockdowns e impacto em sua renda e situação de emprego. Portanto, é crucial que a incerteza em torno da situação do Covid-19 e das políticas do Covid-19 seja removida para que a confiança e a demanda das famílias retornem”, avalia a economista.

Ela complementa que isso é certamente mais fácil de dizer do que de fazer. “As autoridades enfrentam um dilema entre impor medidas de contenção mais rígidas para impedir a propagação do vírus que atrapalha a economia e arriscar uma disseminação incontrolável de casos de Covid-19 que possa sobrecarregar a capacidade limitada do sistema médico da China”, avalia. Portanto, Sophie prevê que o caminho para a reabertura provavelmente será um processo lento e acidentado, com algumas idas e vindas, e com potencial de mais interrupções econômicas.

Com um olhar para o mercado de ações do gigante asiático, Richard Tang, analista de pesquisa da Julius Baer, aponta que os desdobramentos do fim de semana na China interromperam a expectativa de um rali de final do ano para o mercado de ações do país.

“Os movimentos potenciais nos próximos dias são difíceis de prever, já que os investidores digerem as incertezas sociais, mas com políticas econômicas e pandêmicas mais acomodatícias. Além disso, o mercado provavelmente se concentrará na Conferência Central de Trabalho Econômico da China que será realizada em dezembro para ter mais um direcionador para as suas políticas”, aponta o analista.

A trajetória do mercado agora é mais incerta e dependente de notícias de curto prazo, avalia Tang, especialmente nos próximos dias e, por isso não recomenda que os investidores façam apostas ativas.

“Com base em nosso entendimento e em algumas conversas iniciais, as opiniões dos investidores parecem ser mistas, mas os investidores externos geralmente são mais pessimistas do que os investidores externos. Os investidores externos estão preocupados com as potenciais incertezas sociais e o maior prêmio de risco para as ações como resultado. Enquanto isso, alguns investidores internos optam por ver a situação com um ângulo mais construtivo, esperando que os desafios diminuam em breve e que o mercado de ações seja impulsionado por políticas econômicas e pandêmicas claramente mais acomodatícias”, aponta o analista.

O Morgan Stanley ressalta, citando o site de notícias chinês Caixin, que, com a grande mudança na opinião pública sobre as restrições do Covid, Pequim respondeu com acomodação, comprometendo-se com uma abordagem flexível.

“Vemos esses desenvolvimentos como corroborando uma eventual saída da política de Covid-zero, apesar de uma jornada acidentada, fortalecendo nosso cenário base de uma reabertura adequada na primavera de 2023 (entre março e junho)”, avalia o banco americano.

“Dito isso, achamos que o ‘zigue-zague’ em relação à reabertura do Covid provavelmente persistirá no inverno. As restrições ainda podem aumentar dinamicamente em cidades de menor PIB em resposta ao aumento de infecções, embora sem o objetivo de reduzir os casos a zero”, avalia o Morgan.

Nesta linha, aponta o banco, mais relaxamentos incrementais ocorreram no fim de semana passado. Dentre eles, Urumqi está retomando o transporte público gradualmente a partir de 28 de novembro, após um bloqueio prolongado. Já o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) da China enfatizou (segundo reportou o Global Times no sábado) que as autoridades locais devem se abster de bloqueios arbitrários.

“Nos próximos 3 a 4 meses, esperamos que a China aumente as vacinações, aumente a disponibilidade de pílulas e instalações domésticas de tratamento da Covid e mude a narrativa oficial do número de casos para o controle de hospitalizações/mortalidades. Achamos que isso poderia abrir caminho para uma reabertura adequada na primavera”, avalia o Morgan.

Por outro lado, no domingo, o Diário do Povo, porta-voz do Partido Comunista Chinês, escreveu em artigo na primeira página manter-se “inabalável” com os controles existentes.

O Credit Suisse aponta que, no curto prazo, mais do que as medidas de corte de juros anunciadas recentemente, o principal catalisador para o crescimento econômico e do desempenho do mercado será a rapidez com que a China vai conseguir se livrar das disrupções pela Covid.

Também para os analistas do banco suíço, a expectativa permanece de que a China vai fazer flexibilizações de maneira muito gradual com idas e vindas durante o processo. Portanto, para o Credit, espera-se que qualquer reabertura significativa ocorra apenas no final da primeira metade de 2023. “Os investidores devem se preparar para uma volatilidade alta do mercado de agora em diante. Em nossa opinião, o cronograma de reabertura pode ajudar a China a evitar uma recessão”, apontam os analistas.

(com informações da Reuters)

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.