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De um lado, sinais de oferta cada vez mais apertada. De outro, temores de recessão global. Os preços do petróleo têm se equilibrado no último mês em meio a essas sinalizações, com o contrato mais líquido do brent fechando abaixo de US$ 100 o barril em meados de julho, mas depois voltando a ficar acima deste patamar com as restrições no mercado. Estas restrições, por sinal, ganharam força com a invasão da Ucrânia pela Rússia e as sanções ocidentais a Moscou.
Bruno Pascon, cofundador e diretor da CBIE Advisory (Centro Brasileiro de Infraestrutura), destacou em entrevista ao InfoMoney que, neste embate de diferentes forças, a oferta mais restrita seguirá impactando mais o mercado da commodity, principalmente na segunda metade do ano, em que a temporada de furacões no Atlântico deve ganhar força e impactar ainda mais a oferta.
O CBIE é uma consultoria em energia, que presta serviços a várias empresas do setor de óleo e gás há mais de 20 anos. Um dos seus sócios fundadores é Adriano Pires, que foi indicado pelo governo para assumir o comando da Petrobras no fim de março deste ano. Pires, contudo, recusou o convite por não ser possível conciliar o trabalho de consultor com a presidência da estatal.
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Pascon aponta que, se o cenário de redução de oferta se concretizar, a previsão é de um petróleo operando a um limite superior de US$ 114 o barril neste ano. Já olhando para o longo prazo, a partir de 2026, as estimativas do CBIE foram elevadas de um intervalo de US$ 60 a US$ 65, para US$ 70 a US$ 75 o barril.
O petróleo em alta, por sua vez, poderia ser algo a beneficiar mais o Brasil e não ser primordialmente uma fonte de pressão com os preços dos combustíveis subindo e elevando as tensões sociais. O país poderia ser muito beneficiado se investisse em infraestrutura e diminuísse a sua dependência de exportação do petróleo refinado, avalia. Para isso, é preciso garantir demanda firme, com maior investimento de empresas privadas entre as refinarias. O Brasil está perdendo oportunidades, aponta.
O diretor do CBIE também traçou possíveis cenários para a Petrobras (PETR3;PETR4) com a eleição dos primeiros colocados nas pesquisas, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o atual presidente Jair Bolsonaro (PL).
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Nos cenários “extremos”, Bolsonaro privatizaria a Petrobras (inclusive, tem manifestado recorrentemente esta intenção), enquanto Lula estatizaria totalmente a empresa, atualmente de economia mista, contando com controle estatal, mas capital privado. Mas, nos cenários mais intermediários, com o atual presidente, a companhia seguiria com a venda de refinarias (conforme tratado estabelecido em Termo de Compromisso de Cessação, ou TCC, assinado com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, o Cade), enquanto com o petista a companhia investiria mais por conta própria na área de refino. Um ponto em comum seria a continuidade da exploração e produção do pré-sal, avalia.
Cabe ressaltar que nesta semana, em entrevista ao UOL, Lula falou sobre a Petrobras e criticou a política de preços da estatal. Ele disse que, se vencer a eleição, buscará transformar a empresa na maior, ou ao menos na segunda maior, petroleira do mundo. “Eu pretendo mudar a política de preços da Petrobras. Eu pretendo fazer com que os preços da Petrobras sejam em função dos custos nacionais, dos gastos nacionais, porque nós produzimos em real e pagamos salário em real”, afirmou.
Confira abaixo os principais destaques da entrevista com Bruno Pascon:
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Petróleo: oferta apertada dará maior apoio aos preços
“O balanço de oferta de petróleo está muito apertado. Qualquer movimento que ocorra pode gerar projeções um tanto quanto espaçadas, desde US$ 380 num cenário de estresse que o JPMorgan sugeriu até um cenário de voltar a US$ 45 em 2023 como o Citi mencionou, dependendo da retração da demanda a depender da recessão global.
A nossa projeção média de preços é de US$ 94 por barril brent este ano, US$ 86 o barril em 2023 e, dependendo até quando for a guerra, o cenário é de limite superior de US$ 114 no ano, com algum tipo de redução da produção russa ao longo do segundo semestre.
Também é no segundo semestre a temporada de furacões do Atlântico, que afetam em particular EUA e México, e que vai de junho a novembro. A Administração Nacional Oceânica e Atmosférica prevê de 14 a 21 tempestades, sendo dois terços de alta intensidade, acima da média histórica, e 3 a 6 grandes furacões.
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O ano de 2005 foi uma das 4 vezes na história que os EUA precisaram usar reserva estratégica de petróleo, de um milhão de barris. Esses grandes furacões podem trazer desde um movimento de precaução para estocar combustíveis e de diesel até danificar estruturas de produção e de refino.
No longo prazo, a partir de 2026, as nossas estimativas foram elevadas de US$ 60 a a US$ 65, para US$ 70 a US$ 75 o barril. Esse preço de equilíbrio maior ocorre primeiro porque o cenário de inflação nos EUA a 2% não existe mais, não no médio prazo, e nem para a Europa, o que inflaciona os custos de produção de petróleo e gás. Além disso, o efeito do esforço ESG (melhores práticas ambientais, sociais e de governança corporativa), necessário para o processo de descarbonização, também tem exigido prêmios maiores para o mercado de petróleo [reduzindo a oferta de energia fóssil mais rápido do que a demanda migrando para fontes renováveis].”
Crise energética e guerra na Ucrânia
É algo que não tem paralelo na história, é uma crise energética e de segurança alimentar se levar em consideração que não é só petróleo e gás, são fertilizantes e grãos. É uma pressão de preços que vai muito além do choque de petróleo que ocorreu em 1970, é uma crise muito maior. O preço de energia elétrica já está passando US$ 500 megawatt-hora (MW/h) na Europa, o normal é US$ 50, US$ 55. Ou seja, quase dez vezes mais, o que traz um problema social gravíssimo.
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E não há bala de prata. O gasoduto Nord Stream 2 foi contratado, mas Alemanha revogou a autorização por conta das sanções, sendo que, tirando Reino Unido, Holanda e Noruega, a maior parte da Europa não consegue atender demanda doméstica de energia.
O diesel já disparou além do petróleo, já estão estocando o combustível para o inverno pela necessidade de calefação (com o diesel funcionando como um substituto de gás natural).
Não é comum o preço do diesel ficar muito acima do petróleo, mas a demanda está muito além devido exatamente à falta de oferta de gás. No final do ano, com a chegada do inverno, a demanda vai atingir um pico, sem que haja um substituto imediato. A pressão de preços gera preocupação social e, infelizmente, não há solução de curto prazo. Pode até haver uma redução do consumo, mas isso não acontecerá no inverno.
A demanda de gás natural continuará muito alta, enquanto ainda não estão previstas entradas de grandes capacidades novas no mercado entre 2022 e 2024. Assim, a visão é de um mercado global de gás muito apertado até pelo menos 2025-2026. Todo mundo que tiver gás não contratado contará com a demanda infinita, os preços estão muito mais altos que os históricos.
Mas o petróleo pode alcançar um equilíbrio oferta e demanda mais rápida que o gás. A demanda pelo gás não cair na mesma velocidade que a demanda de petróleo cairá.
Não é à toa que o gás é a fonte da transição energética, é uma das poucas commodities que vai aumentar a demanda até 2040. É o combustível fóssil que menos polui e menos emite, não tem intermitência. Ou seja, ainda tem uma vida bastante longa.”
Brasil: perdendo oportunidades
“O cenário é triste porque o Brasil é exportador líquido de petróleo cru, mas importa petróleo refinado porque não consegue processar todo o petróleo que a gente produz.
Hoje cerca de 43% de todo o petróleo cru do Brasil é exportado porque não há capacidade de refino suficiente nem moderna para processar o pré-sal. O Brasil é assim exportador líquido de petróleo e importador líquido de combustível.
Se não investir em capacidade de refino para que possa processar mais o petróleo doméstico, o Brasil nunca vai conseguir reduzir a dependência do mercado internacional.
Infelizmente há esses gargalos de infraestrutura e no gás o cenário é ainda pior. O pré-sal já é 71% da produção de gás do Brasil e estamos desperdiçando via reinjeção quase 70 milhões de metros cúbicos por dia, sendo que a importação da Bolívia é de 20 milhões. Poderíamos fazer a produção doméstica se houvesse capacidade de escoar esse gás. O Rota 3 (gasoduto) atrasou de novo. Falta infraestrutura, refinaria, gasoduto de escoamento e de transporte.
Para que possa investir nesta estrutura é preciso de demanda firme de longo prazo. Sem estes investimentos, infelizmente dependemos do exterior para abastecer o mercado doméstico. É uma pena porque poderíamos hoje ter autossuficiência tanto em petróleo combustível quanto em gás natural, só não temos por falta de infraestrutura.”
Importância da Petrobras em vender refinarias
“A importância é enorme por dois motivos. Esse fantasma da intervenção de preços existe porque a Petrobras é uma sociedade de economia mista. Toda vez que fala de fantasma de intervenção de preços há uma fuga do investidor para evitar comprar refinaria no Brasil uma vez que, para ele, a paridade internacional de preços não se discute, é dada como líquida e certa.
Ao vender as refinarias, há alguns efeitos. Vendendo para a iniciativa privada, ela vai adotar preços de mercados, a própria Acelen (privada), na Bahia, com 14% da capacidade de processamento do Brasil, tem prática de preços diferente da Petrobras.
É fácil fazer isso? Não. Toda vez que tem um reajuste de preços por lá, não é fácil para explicar para o consumidor. Além disso, é o segmento que conta com o sindicato mais forte.
Se transferir 50% do parque de refino, metade do mercado vai para a iniciativa privada, não vai adotar interferência de preços.
A partir deste movimento, vai trazer mais investimentos e precisamos de mais refinarias. Na próxima década, calculamos que o Brasil vai precisar de 400 mil barris dia a 750 mil de capacidade de refino nova, atualmente temos 2,1 milhões. Assim, seria necessário de 20% a 35% de aumento de capacidade. Quanto mais puder trazer investidor via competição, via concorrência, preço de mercado, é um ganho para o Brasil.
Teríamos refinarias mais modernas, que processariam petróleo brasileiro, elevariam produção de óleos lubrificantes, uma demanda que importa muito de fora e vamos reduzir essa dependência externa de diesel e gasolina,
A Petrobras assinou em julho de 2019 o compromisso de vender 50% de refinarias, mas não há uma data limite [divulgada], o que traz uma complexidade maior para esse processo. Ao mesmo tempo em que ela não vai querer vender a refinaria a preço baixo porque pode sofrer uma ação de improbidade administrativa, todo esse barulho de intervenção não atrai tantos compradores para o refino.
Sempre vai ser essa disputa entre a corporação que não quer vender nada e essa vontade de desenvolver o mercado. Quanto maior concorrência melhor, tanto para o consumidor quanto para a formação de preços.
Mas, com mais investimento, ela vira menos refém. Se elevar a capacidade de refino, vai permitir que processe mais petróleo, reduzindo a importação. É positivo para balança comercial, haverá mais royalties e também menor dependência de preços internacionais.
Estamos sempre acostumados a falar de paridade de importação porque não consegue atender toda a demanda doméstica com a nossa produção local, mas há também a paridade de exportação. Ou seja, se o Brasil fosse autossuficiente tanto para petróleo cru quanto em derivados, exportaria o que sobrasse, trazendo efeito nos preços internacionais.
Até o final da década, já teve um aumento de produção de petróleo e gás. O Brasil está vindo de 3 milhões de barris de petróleo por dia (bpd) para 5 milhões, com projeção de quase 6 milhões até o final da década, colocando o país entre os 5 maiores produtores.
O pré-sal já é 80% da produção do Brasil e é um dos petróleos mais baratos a custo de US$ 30 o barril, o que é mérito da Petrobras. Se puder ter uma produção cada vez maior no Brasil, para que reduza dependência de importações, isso vai trazer preços menores para a população brasileira.
Guerra e Covid mudaram o tema da transição energética para segurança energética e alimentar. Assim, quanto menos puder depender de importações para atender o mercado doméstico, melhor.
O Brasil é privilegiado porque não tem problema de fontes primárias de energia. Se tivesse visão de segurança energética para reduzir essa tendência de diesel, gás, o preço poderia estar muito menor do que hoje e o governo estaria com uma receita fiscal ainda maior, o que teria um impacto bruto na balança comercial. Mais royalties e receita no gás, esse gás reinjetado não dá receita para o governo atualmente. Isso tudo é política pública.”
Redução do ICMS e Petrobras no pós-eleição
“As medidas de redução de imposto são muito bem-vindas e positivas, ainda que o cenário ideal fosse de que a mudança tivesse sido feita numa reforma tributária ampla. Combustível e energia elétrica não podem ser tratados como bens supérfluos, faz todo sentido que tributação seja limitada a 17%, 18% e não a 29% porque são bens essenciais à população. Obviamente há uma leitura de mercado de ser uma medida populista, mas é algo que já deveria ter acontecido faz muito tempo.
Essas medidas acabam trazendo um impacto eleitoral positivo para o governo. Num cenário de Bolsonaro reeleito, será o status quo, as vendas de refinarias continuam, mantendo compromisso assumido com o Cade no TCC [para desinvestir em refinarias].
Com o Lula, o refino talvez não passe para a iniciativa privada e haja mais investimentos nelas, mas a Petrobras focada no pré-sal vai ser o grande objetivo dela num governo Lula ou Bolsonaro. O que muda é quais ativos vão ser vendidos, se vai ser de fato uma sociedade de economia mista, se vai estatizar de vez ou privatizar.
A gente [CBIE] defende a privatização, acha que o melhor cenário seria uma Petrobras privatizada, não faz sentido no mundo que se vive hoje governo ser dono de empresa de petróleo, o governo tem que investir em educação, segurança pública, etc. Esse é um cenário de governo Bolsonaro, obviamente não vejo um cenário de privatização com governo Lula.
O cenário extremo com Lula seria a Petrobras totalmente estatizada, com um papel ainda grande no setor de petróleo e gás. Em vez de deixar de ser monopolista, ela teria parcela significativa como um todo.
Já com Bolsonaro, no cenário “extremo” a Petrobras seria privatizada, mais enxuta e focada no pré-sal, deixando que a iniciativa privada faça os investimentos em refinarias, mas não que isso impeça que a petroleira faça esse tipo de investimentos.
Mas acho que acabará ficando no meio do caminho. Vejo meio improvável o cenário de Lula estatizar, seria caro. No momento de preocupação fiscal, juro a quase 14%, mercado preocupado com queda de teto de gastos, querer fazer um desembolso para estatizar a Petrobras comprando participação de investidores privados seria complicado, com um impacto fiscal muito grande.”
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