Inflação de custos, por lockdown na China e guerra, contamina resultados do 1º trimestre

Aumento de custos vem sendo absorvido, em parte, pelas empresas, impactando suas margens operacionais, para não perder receitas

Augusto Diniz Rodrigo Petry

(Shutterstock)
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Preocupação global, que deve levar os bancos centrais do Brasil e dos EUA essa semana a elevarem suas taxas de juros, a aceleração da inflação neste ano vem atingindo em cheio os custos das empresas, já impactando seus resultados, sobretudo após a eclosão da guerra Rússia-Ucrânia e novo lockdown na China.

Esse aumento de custos, inicialmente, vem sendo absorvido, em parte, pelas empresas, impactando suas margens operacionais, como forma de evitar uma redução adicional das receitas. Entretanto, os impactos daqui para frente podem se ampliar, caso a desestruturação das cadeias produtivas se estenda por mais tempo.

Fabricante de calçados, a Grendene (GRND3) atribuiu o menor volume de produtos embarcados (sell in) no primeiro trimestre ao cenário adverso. “É uma questão de conjuntura econômica… de inflação alta”, disse o diretor de Relações com Investidores da companhia, Alceu Albuquerque.

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Impacto inflação

“É aquela inflação que, para o consumidor de baixa renda, é uma inflação extremamente maléfica, que atinge alimentos e energia, que ele não tem como fugir. Então, sobra menos dinheiro no bolso pra ele consumir”, afirmou, durante teleconferência com analistas.

O lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, na sigla em inglês) recorrente da Grendene no 1º trimestre deste ano teve queda de 57% na comparação com o mesmo período de 2021, influenciado, de acordo com Albuquerque, à pressão de custos de matérias-primas adquiridas no ano passado.

Segundo ele, quando se compara com o 1º trimestre do ano passado, “pegamos todos os carretos dos aumentos de 2021”. “A resina de PVC, um de nossas principais matérias-primas, que representa 20 a 25% de nosso custo, subiu mais de 60%”, complementou.

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Já o lockdown na China, segundo o executivo, vem atrapalhando a construção da infraestrutura necessária para garantir o crescimento da operação naquele país, no caso da GGB (Grendene Global Brands). “O lockdown está postergando a entrada da GGB na China. Estamos trabalhando fortemente pra avançar”, explicou.

Covid na China pressiona custos

Para a WEG (WEGE3), o aumento de custos pressiona o caixa da empresa e a companhia vê a cadeia de suprimentos prejudicada com a política de “Covid zero” na China. “A preocupação é muito maior com a China“, reforçou André Luís Rodrigues, diretor administrativo e financeiro da WEG, em teleconferência.

“Enquanto tiver política de Covid zero na China, a cadeia global de suprimentos vai estar pressionada”, acrescentou Rodrigues. “Pode-se sofrer (com o lockdown na China) ao longo do tempo, com escassez de matéria-prima e alta dos fretes. Até o momento não estamos sentindo, mas não quer dizer que não vamos sentir mais para a frente”, conclui.

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Adicionalmente, Rodrigues pontuou que se vive hoje um “ambiente de volatilidade”, em relação ao câmbio. “Obviamente, a gente precisa ver aonde vai se estabilizar (o dólar)”, disse. Segundo ele, há impacto sobre a receita, entretanto o custo nem sempre é ajustado na mesma velocidade do faturamento.

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Margem bruta apertada

Cenário idêntico de preocupação acontece com a Indústrias Romi (ROMI3), que observou uma redução de 3,9 pontos porcentuais em sua margem bruta no primeiro trimestre, para 30%. A empresa tem buscado repassar a inflação aos diversos produtos das suas unidades, mas as negociações têm sido “difíceis”.

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“Obviamente, tem uma pressão de custos e a gente está tentando repassar da maneira possível para os clientes. Tem uma competição, mas é uma inflação global e a expectativa é de que todos os concorrentes comecem a repassar nos preços das máquinas”, explicou Luiz Cassiano Rosolen, CEO da Romi, a analistas.

Embora as taxas de juros estejam em elevação, e o câmbio represente um desafio à competitividade da indústria nacional, os custos e a disponibilidade logística global continuam estimulando o país em geral, levando a Romi a destinar uma maior parcela da produção para o Brasil, acrescentou.

Escassez generalizada

Enquanto isso, a Embraer (EMBR3) destacou que enfrenta problemas desde a falta de semicondutores até a mão de obra. A companhia afirmou que a guerra Rússia-Ucrânia não está trazendo impacto negativo à empresa, mas disse que vários de seus fornecedores estão com dificuldades, como no caso da falta de semicondutores.

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“Estamos mantendo nossas projeções (guidances) para o ano, mesmo com todos os desafios com a cadeia de suprimentos devido à guerra e à escassez de produtos em todo o mundo”, afirmou Francisco Gomes Neto, CEO da companhia, durante teleconferência para comentar o balanço do primeiro trimestre da Embraer.

O diretor financeiro da Embraer ressaltou que há atrasos na cadeia de fornecimento, “assim como em todas as indústrias”. “Estamos trabalhando muito alinhados com os fornecedores para resolver os problemas”, disse, acrescentando que neste segundo trimestre haverá uma maior visibilidade sobre escassez de componentes.

Especulação no frete

Outro efeito da desestruturação das cadeias aparece no frete. O presidente da Dexco (DXCO3), Antônio Joaquim de Oliveira, disse que há uma demanda por painéis de madeira para exportação, mas que os fretes, afetados pela conjuntura global – guerra e lockdown – estão corroendo a rentabilidade.

“Estamos exportando mais do que prevíamos de madeira”, disse, durante teleconferência dos resultados da Dexco do primeiro trimestre, pontuando, contudo, “que esse patamar” não está se transformando em ganho de margens, por conta dos maiores custos logísticos,

Segundo ele, por conta da alta do preço do gás natural, utilizado na fabricação de revestimentos, são esperados repasses, mas sem a mesma velocidade de incremento às margem ao longo deste ano.

Custo operacional alto

No caso da Usiminas (USIM5), o cash cost por tonelada da siderúrgica no primeiro trimestre foi de R$ 4.425/t, superior em 5,1% o total do quarto trimestre do ano passado. Dentre os principais responsáveis pela variação de custos estão o carvão e o coque, além de energia e combustíveis.

Segundo Alberto Ono, CFO da Usiminas, tem se verificado redução do preço de carvão no mercado, “não muito expressivo, mas (há) viés de redução dos preços internacionais”. Porém, ele destacou que o insumo continua com valor alto.

Em relação à guerra entre Rússia e Ucrânia, Miguel Homes, vice-presidente Comercial da Usiminas, ressaltou que ambos representam cerca de 1/3 da produção de placas de aço. O executivo explicou que no início da guerra houve instabilidade e incertezas, levando o preço internacional de placa de aço à alta expressiva.

“Mas o que temos observado nos últimos dias [meados de abril] é uma volta à normalização no balanço de oferta e demanda, inclusive na estabilização do preço e do custo a nível mundial”, disse, durante teleconferência com analistas, em 20 de abril, para comentar o balanço do primeiro trimestre da Usiminas.

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Quem também observou ampliação de custos, neste momento, sobretudo de combustíveis, por conta da guerra Rússia-Ucrânia, foi a Vale (VALE3). O CFO da mineradora, Gustavo Pimenta, afirmou que a companhia já vinha se preparando desde 2021 para controlar seus gastos, se “antecipando ao mercado”.

O aumento de custos de caixa, segundo ele, seria proveniente mais da alta do petróleo. “O que temos vistos no C1 é que o impacto que estamos tendo é do custo de combustível, basicamente. Conseguimos compensar os custos de inflação, reduzindo as pressões de custo fixo em moeda local”, afirmou.

Estoques

Para enfrentar as incertezas, algumas empresas estão ampliando seus estoques, como é o caso da fabricante de medicamentos Hypera (HYPE3). Durante teleconferência, Breno de Oliveira, CEO da Hypera, afirmou que a empresa busca ampliar estoques até ter clareza de que problemas fornecimentos globalmente tenham acabado.

Desde o início da pandemia a Hypera está mantendo em alta os níveis de estoques, principalmente vindos da China e da Índia por conta do fornecimento e dos riscos logísticos, acentuados recentemente.

“Apesar do aumento de custo do capital, vale a pena evitar ao máximo os riscos de desabastecimento dos produtos, que têm margem muito alta”, afirmou Breno.

Recomposição

Para a Irani Papel e Embalagem (RANI3), o primeiro trimestre foi caracterizado pela preocupação mundial com os efeitos da inflação, potencializados pela guerra Rússia x Ucrânia. No caso da companhia, sua estratégia no período foi a de não crescer em volume e manter os preços, mantendo mais rentabilidade das operações.

“Não ceder em preços foi muito acertado. Vamos repassar em todas a linhas (de produtos) no início do segundo semestre devido à pressão dos custos”, prevê Sergio Ribas, diretor-presidente da companhia, em declarações durante teleconferência para para comentar o balanço do primeiro trimestre da Irani.

“É mais fácil recuperar volume do que preço”, ressaltou ele, destacando a importância de manter as margens. Em toneladas, o preço médio Irani registrou aumento de 24,2% no 1º trimestre na comparação anual. Em metros quadrados, o preço médio Irani registrou aumento de 23,9% no mesmo período.

Análise

O economista da FGV IBRE, Aloisio Campelo Jr., reforçou que atualmente o que mais impacta a indústria é a falta de insumos das cadeias internacionais em algumas regiões, por conta de problemas no transporte, como em Xangai (devido ao lockdown).

Com a impossibilidade da oferta se equilibrar com a demanda, acaba-se corrigindo o valor dos bens pelo preço. O economista avaliou que tal movimento pode ser considerado como pontual, entretanto, no âmbito interno, a inflação “está se estendendo” e o princípio de seu alívio e sendo postergado a cada mês.

“A inflação tem colaborado para manter os salários caindo, mesmo com o aumento da oferta de empregos nos últimos 12 meses. A inflação está indo mais rápido do que a correção salarial. Tem uma pressão inflacionária que deve segurar o consumo”, ressaltou.

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