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Incerteza. Esse é o saldo final para as petroleiras – tanto as juniores quanto a Petrobras (PETR3;PETR4), após uma semana marcada pela redução dos preços de gasolina e diesel nas refinarias, por anúncio de reoneração de combustíveis, mas não em sua plenitude, levando ao estabelecimento de um imposto sobre exportação de petróleo cru, o que abalou e muito as companhias do setor.
Soma-se a isso o pedido do Ministério de Minas e Energia para que a Petrobras suspenda por 90 dias as vendas de ativos, impactando outras empresas do setor.
Além disso, a estatal divulgou seus resultados do quarto trimestre e de 2022 nesta semana com lucro e dividendos recordes, mas com os proventos já trazendo alguns sinais de mudanças (com a proposta de uma reserva estatutária). A semana também marcou a primeira interação maior do novo CEO da estatal, Jean Paul Prates, com o mercado.
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Ainda que haja a percepção de que as mudanças não serão “açodadas”, é certo que elas acontecerão e mudarão os principais pontos para a tese de investimentos na companhia: política de preços para combustíveis, dividendos e investimentos em capital feitos pela companhia.
Cada vez mais, ganham espaço no noticiário especulações de mudanças nas políticas da companhia, o que gera volatilidade para os ativos, ainda que a estatal tenha negado quaisquer discussões no momento, o que também afeta o mercado como um todo.
Conforme destaca a Levante Ideias de Investimentos, o fim desta semana acabou trazendo sinais trocados para os investidores brasileiros. Enquanto ainda há a percepção de vitória da equipe econômica sobre a questão dos combustíveis, na outra mão segue sendo alimentado o fluxo negativo de notícias e declarações – o que acaba contaminando o humor dos investidores.
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Mesmo com a vitória sobre o tema dos combustíveis sendo visto como positivo para o mercado em geral (por conta do restabelecimento das receitas), a notícia sobre o imposto parcialmente compensatório de exportações de petróleo cru, com alíquota de 9,2%, foi visto como bastante negativo para o clima de investimentos no geral, além do impacto efetivo nas petroleiras.
A PRIO (PRIO3) apareceu como a mais afetada financeiramente pela notícia, de acordo com diversas casas de análise, sendo seguida por 3R (RRRP3) ou Petroreconcavo (RECV3) e Petrobras. O Morgan também destacou o impacto para a Enauta (ENAT3).
Além disso, a possibilidade do imposto “durar para sempre” foi encarada como real. A princípio, o imposto, instituído por Medida Provisória (MP) vigora pelos próximos quatro meses e caberá ao Congresso decidir se ele será instituído ou não. Os riscos potenciais de um imposto prolongado são uma grande preocupação para o mercado uma vez que, por muitas vezes, as medidas fiscais são mais difíceis de eliminar do que de introduzir.
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Neste sentido, na véspera, um relatório do Bradesco BBI trazendo sinais de que o Congresso rejeitaria a ideia de perpetuar o imposto de exportação trouxe uma visão positiva para o setor, já que os impactos seriam limitados.
Porém, apesar da leitura positiva, os analistas também ressaltam que, ainda que o imposto não se perpetue, ficarão cicatrizes”. “A percepção de risco para o setor deve aumentar, pois ele pode ser alvo de outras medidas, se o governo julgar assim necessário”, avalia.
Para o Morgan Stanley, além do imposto em si, um movimento tributário arbitrário pode ser muito negativo para o clima de investimento upstream (exploração e produção de petróleo).
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“O setor de petróleo upstream no Brasil tem sido um motor de investimentos diretos nacionais e estrangeiros, apoiado em uma estrutura regulatória estável e um regime tributário estável. Embora a implementação de um imposto de exportação de petróleo não interfira nos contratos de concessão ou no ambiente regulatório, levanta uma bandeira amarela na frente tributária”, avaliam os analistas.
O imposto sobre vendas externas de uma commodity também foi considerado um sinal preocupante para outros setores do Brasil, grande exportador de matérias-primas, como soja e minério de ferro.
Assim, os bastidores políticos sobre o tema devem seguir pautando o noticiário das companhias juniores. Para os próximos quatro meses, a XP espera que as empresas de petróleo e gás no Brasil façam uma corrida para armazenagem, pois tentarão adiar ao máximo as exportações, esperando que esses impostos não se tornem permanentes (o que pode frustrar as expectativas do governo em relação às receitas).
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Os analistas da casa esperam uma reação feroz das empresas de petróleo e gás nos próximos quatro meses contra esta proposta, nos debates que irão ocorrer no Congresso. “Acreditamos que o argumento de menos investimento em E&P [Exploração e Produção] pode pesar na decisão”, avaliam.
Em teleconferência com analistas após divulgação do resultado do quarto trimestre de 2022, Décio Oddone, CEO da Enauta, afirmou “que o evento de criação do imposto de exportação foi inesperado, foi infeliz”.
O executivo comentou que o Brasil tem grande tradição de respeito a contratos e previsibilidade, e essa tradição foi que permitiu que os grandes leilões do pré-sal fosse bem-sucedidos. “Daí a surpresa com a medida que foi tomada. A gente tem ouvido que é uma medida temporária em função da situação fiscal e a expectativa de que as empresas estão com lucros elevados, como se fosse um imposto de renda adicional temporário. É o cenário que estamos trabalhando”, disse.
Roberto Monteiro, CEO da PRIO, disse que a tributação pode afetar os investimentos no setor. “É óbvio que fazer uma tributação de (cerca de) 10% em cima de nossa receita não tem como dizer que é favorável ao investimento. Nunca pagamos dividendos. A gente sempre reinvestiu nosso resultado em aquisição de ativos e investimentos produtivos para aumentar vida de campo, gerar emprego e até mesmo pagar mais impostos lá na frente. É difícil dizer que isso ajude a companhia a trazer mais investimentos”, comentou.
Ambos veem a tributação ainda em caráter temporário. Emiliano Gomes, diretor jurídico da PRIO, também comentou sobre a questão e argumentou que a medida provisória ainda está sendo estudada. “Todo setor reunido através das entidades de classe que representam nossos interesses ainda estão avaliando tanto os impactos como as mediadas a serem tomadas”, disse.
Soma-se a esse ambiente de maior incerteza (inclusive jurídica) a suspensão da venda dos ativos da Petrobras por noventa dias. “Há potencial de ações contra a Petrobras por cancelar transações assinadas de forma proposital”, afirmou Giovani Loss, sócio da área de Óleo e Gás do Mattos Filho, à Reuters.
Há pelo menos quatro contratos assinados de venda de publicados ao mercado, mas ainda pendentes de conclusão, somando mais de US$ 2 bilhões.
Um dos maiores foi a venda de 22 concessões de um grupo de ativos na Bacia Potiguar, no Rio Grande do Norte, para a 3R Petroleum (RRRP3), por US$ 1,38 bilhão. Nesse caso, a 3R chegou a anunciar ter acertado um empréstimo de US$ 500 milhões para concluir a transação. Analistas têm destacado maior probabilidade de que a venda do ativo seja concluída, dado o passo avançado da operação.
Embora a empresa não tenha formalizado a suspensão pedida pelo governo, Prates, presidente da Petrobras disse na véspera que “está tudo suspenso para análise”.
Dividendos, PPI, investimentos: o fim de uma era?
Além de falar sobre a suspensão da venda de ativos pela estatal, Prates também falou sobre outros temas importantes para a estatal na véspera, dia da repercussão dos resultados e dos dividendos recordes da companhia, números estes que trouxeram críticas do governo.
Na quarta, a Petrobras registrou lucro líquido de R$ 188,3 bilhões em 2022, o maior da história da empresa e das companhias de capital aberto, além de um pagamento total de dividendos de R$ 215,8 bilhões referentes ao ano passado. Deste total, R$ 35,8 bilhões dos proventos foram relativos aos últimos três meses do ano, ainda que com algumas ponderações e com a visão de “fim de uma era” de alta remuneração aos acionistas.
Junto à proposta de pagamento de R$ 35,8 bilhões referente ao quarto trimestre, o Conselho de Administração sugeriu que os acionistas avaliem a criação de uma Reserva Estatutária para reter até R$ 6,5 bilhões do resultado do exercício social, alegando que o montante proposto ultrapassa a aplicação da fórmula prevista na Política de Remuneração neste valor. A proposta trouxe mais uma incerteza em um ambiente já conturbado para a companhia. “A questão-chave também é se essa proposta de dividendo será efetivamente paga. O governo tem o poder de vetar qualquer pagamento na Assembleia Geral de Acionistas a ser realizada no final de abril”, aponta o Bradesco BBI.
Em teleconferência com analistas, Prates afirmou que a companhia terá ainda robustez no pagamento de dividendos aos seus acionistas em 2023, pois planeja registrar lucros a altura do auferido no último ano, mas os desafios a serem enfrentados serão ainda maiores.
“São circunstancias diferentes, é um desafio maior, até porque não vamos necessariamente sair vendendo ativos por decisões governamentais como foi feito antes, não vamos nos desfazer de refinarias ou de regiões inteiras simplesmente porque o governo quer”, disse o executivo.
Analistas se debruçam sobre qual deve ser a próxima política de dividendos da empresa, alvo de especulações desde o começo da semana. A Levante espera que o futuro conselho, indicado pelo novo governo, passará a autorizar somente o mínimo de distribuição de dividendos, de 25% do lucro líquido, além de retomar grandes projetos de investimentos.
Além disso, conforme aponta a casa, o governo deixa claro, com todas as letras, que a política de preços da Petrobras será alterada. Prates criticou o PPI (Política de Paridade de Importação), afirmando que o atual critério é uma “abstração”, e que favorece à concorrência. Prates defendeu mudanças tanto na política de preços quanto na de dividendos. “Nesse contexto, esperamos tempos mais negativos para as ações da estatal brasileira”, afirma a casa.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez coro às críticas, classificando a distribuição recorde de dividendos no ano passado como “inaceitável”. Já o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que uma mudança no PPI é atribuição do Ministério de Minas e Energia, mas que colocará técnicos à disposição para encontrar alternativas que atenuem variações nos preços internacionais.
Lula, aliás, disse ontem que a empresa deve ser de interesse estratégico para o Brasil e, portanto, metade dos dividendos do ano passado poderia ter sido distribuída e a outra metade deveria ser de investimentos. Afirmou ainda que o governo, como acionista majoritário da Petrobras, tem poder de decisão daqui para frente.
Ao analisar a fala de Lula ao “pé da letra”, o Bradesco BBI apontou que, se interpretar que seus comentários se traduziriam em um pagamento pela metade do previsto pela política atualmente em vigor, isso significa que o dividend yield (dividendo sobre o valor da ação) poderia chegar a perto de 15% este ano.
“Isso seria justo, já que a Vale (VALE3), empresa de commodities do setor privado na América Latina, com riscos embutidos mais baixos, está pagando de 7% a 8% [rendimento de dividendos], enquanto as principais IOCs [petroleiras estrangeiras] estão pagando cerca de 10% com recompras”, avaliam os analistas.
Há também leituras relativamente positivas para as falas do CEO da Petrobras de ontem, ainda que elas não tenham dirimido as incertezas que estão no radar.
“Saímos positivamente impressionados da primeira teleconferência do CEO. Prates respondeu a todas as perguntas e forneceu uma visão bastante equilibrada sobre dividendos, capex e preços de combustível. Achamos que é um bom começo, mas nos perguntamos se o acionista controlador oferecerá equilíbrio semelhante adiante”, apontaram os analistas do Morgan Stanley.
Entre os pontos, a fala do CEO de que a política de dividendos precisa ser equilibrada, mas pode permanecer robusta, além da fala de que a transição energética é muito importante, mas que a Petrobras não se precipitará em novos empreendimentos, foram lidas como positivas pelo banco.
O CEO também apontou que o fundo de estabilização de combustível pode ser parte da solução, mas minimizou a importância do fundo de estabilização neste ponto do ciclo, destacando que essa foi uma discussão mais relevante quando os preços do petróleo estavam em níveis de pico. Ainda pode ser parte da solução para o governo administrar os preços dos combustíveis, mas não a única solução, na avaliação dele.
A mensagem de venda de ativos, por sua vez, foi mais negativa, embora não surpreendente, apontaram os analistas do banco. Prates foi mais veemente contra a estratégia de vender refinarias e sair completamente de algumas regiões onde operava historicamente.
Já o investimento em fertilizantes e petroquímicos pode ser uma possibilidade. O CEO acredita que os petroquímicos (especialmente à base de gás) podem ser o último uso de hidrocarbonetos no contexto da conclusão da transição energética global no longo prazo. As decisões de investimentos em fertilizantes e petroquímicos exigirão uma análise criteriosa e, assim como a estratégia de transição energética, não serão precipitadas, sinalizou.
Também para o Bradesco BBI, Prates destacou um cenário que não parece apontar para uma mudança brusca/rápida na alocação de capital, com a Petrobras se tornando mais equilibrada entre hidrocarbonetos e recursos de energia renovável.
Por outro lado, as incertezas relacionadas à política de dividendos e precificação de combustíveis permanecem e provavelmente ainda pesarão sobre as ações. “Em termos de política de preços, acreditamos que a probabilidade de um fundo de estabilização de combustíveis diminuiu, com o aumento da probabilidade de uma política mais discricionária. Em termos de dividendos, acreditamos que uma nova política irá flexibilizar o payout, dificultando a previsão”, avaliam os analistas da casa.
Neste sentido, a recomendação de boa parte das casas de análise para a Petrobras é neutra. O Morgan, por exemplo, tem recomendação equalweight (exposição em linha com a média do mercado) para os ADRs (recibo de ações da empresa negociados nos EUA) PBR (equivalente aos ordinários), com preço-alvo de US$ 13 (ainda um potencial de valorização de 20,8% em relação ao fechamento de quinta).
“Esperamos volatilidade contínua à medida que a nova administração e o Conselho assumam seus postos e comecem a compartilhar sua visão e estratégia para empresas estatais. As decisões recentes sobre impostos sobre combustíveis e a criação de um imposto temporário sobre a exportação de petróleo levantaram a bandeira amarela do setor e aumentaram o a percepção de risco de intervenção nas estatais”, avaliam. Para os analistas, é uma questão de tempo para as políticas da Petrobras mudarem, mas é preciso ter mais visibilidade sobre o quão prejudiciais elas podem ser para a lucratividade e geração de caixa.
O Bradesco BBI também tem recomendação equivalente à neutra para Petrobras, com um preço-alvo de R$ 26 para os ativos PETR4 (upside de 5,5%). Com uma percepção de risco maior para o setor em geral, o banco destacou a Vibra (VBBR3) como a empresa brasileira como a top pick em óleo e gás.
A XP, por sua vez, segue com recomendação de compra para a ação (“uma das majors de petróleo e gás mais baratas do mundo”), mas reconhecendo que esta é uma tese de investimento de alto risco.
Olhando para as empresas do setor em geral, a análise é de que a percepção de risco para investir em ações aumentou após os eventos recentes (principalmente os de terça), mesmo que os impostos de exportação não se tornem permanentes nos próximos quatro meses, mas veem uma grande parte já precificada para as empresas juniores.
Por enquanto, os analistas da casa mantém suas projeções para as companhias, com recomendação de compra para Prio, 3R Petroleum e PetroReconcavo, com preços-alvos em R$ 41,60, R$ 79,30 e R$ 33,80, respectivamente.
“Como antes, continuamos gostando de uma estratégia de igual peso entre as 3 juniores sob nossa cobertura, mas agora, ainda mais do que antes, gostamos de diversificar a exposição de óleo e gás com outras ações no exterior e na própria commodity”, avaliam.
O BTG Pactual também apontou que a percepção de risco do setor aumentou, mas a sua preferência relativa permanece, com opção a se expor a empresas juniores de petróleo versus Petrobras, pois vê uma grande possibilidade de pagamentos menores de dividendos na estatal e mudanças em seu plano de negócios. “Entre as petrolíferas júniores, RRRP3 e RECV3 são as opções mais seguras, a nosso ver”, avalia.
Com sinais de que mudanças virão, mas a passos mais lentos, e com a percepção de que cada vez mais os investidores devem ficar de olho em Brasília para entender a tese de investimentos também para outras companhias além da Petrobras, a expectativa é de volatilidade para as ações do setor.
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