Brasil em alta, México em baixa: Como Trump, Big Mag e “seguro calote” explicam o novo cenário nos mercados

Nos últimos dois anos, "seguro-calote" brasileiro recuou, enquando o mexicano avançou, mas o Brasil vai seguir atraindo investidores mesmo com o corte dos juros?

Mário Braga

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SÃO PAULO – A percepção do mercado sobre os dois principais centros financeiros da América Latina mudou e parece sinalizar que o Brasil desbancou o México e se tornou o novo queridinho dos estrangeiros. E diversos fatores evidenciam essa transformação, desde evidências técnicas – como o prêmio pago pelo “seguro-calote” destes países nos mercados internacionais – até itens mais populares como um “Big Mac”. A grande questão que fica é: diante da projeção de juros em queda no Brasil e juros em alta no México, por que os gringos estão trazendo o dinheiro de lá para cá? O InfoMoney explica a lógica por trás deste movimento em quatro pontos. Acompanhe:

O seguro-calote
A olhar primeiro pelos fatores técnicos: os CDS são os “Credit Default Swaps”, que de forma prática mostram quanto um investidor está disposto a receber se um país não honrar seus pagamentos – quanto mais alto, maiores as apostas de um “default”. Na última quinta-feira (5), estes “seguros-calote” do Brasil com vencimento em 5 anos atingiram os 264 pontos – menor nível desde setembro de 2014. Na mesma data, o título equivalente mexicano atingiu os 161 pontos, após a mínima de 70 pontos em setembro de 2014. Apesar de ainda mais “seguros” que o Brasil, o “spread” entre o CDS mexicano e o brasileiro está em 103 pontos-base, muito menor do que os 349 pbs de vantagem que havia entre estes títulos em setembro de 2015.

Essa sinalização de que o Brasil não é mais um País tão arriscado em relação ao México fica ainda mais evidente ao se observar a cotação de cada uma das moedas ante o dólar. No caso do Brasil, a taxa de câmbio despencou do pico de R$ 4,10 no começo de 2016 para os atuais R$ 3,20, sinalizando uma forte apreciação do real. Já no México, a situação é exatamente a oposta: embalado pelo temor do “efeito Trump” na economia do país, o peso mexicano já recuou 17% ante o dólar desde novembro, quando o republicano foi eleito presidente dos Estados Unidos.

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O efeito Big Mac
Um efeito prático do impacto dessas variações cambiais se dá sobre o preço de um dos sanduíches mais famosos do mundo, o “Big Mac”. Por se tratar de um produto de baixa complexidade e vendido quase que de forma similar em todo o mundo, era de se esperar que seus preços fossem equiparáveis. No entanto, levantamento da Bloomberg aponta que o tradicional hambúrguer atualmente custa R$ 16,90 no Brasil e 44 pesos no México, o que equivale a US$ 5,24 e US$ 2,05, respectivamente.

Ou seja: a moeda do México está tão desvalorizada que o valor de um Big Mac por lá não compraria nem a metade de um hambúrguer por aqui.

Os juros antagônicos
Se o “spread” menor dos CDS de Brasil e México e o movimento de cada uma das moedas ajudam a explicar que estamos atraindo o capital “ocioso” dos estrangeiros neste começo de ano, a política monetária completamente antagônica de cada um destes países atualmente causa certa estranheza a tudo isso: se a taxa básica de juros brasileira seguirá em queda em 2017 enquanto os juros mexicanos deverão subir (acompanhando inclusive o BC norte-americano), o Brasil não deveria ficar menos atraente para o estrangeiro, já que a remuneração da nossa renda ficará cada vez menos vantajosa do que outrora?

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Em 2016, a taxa básica de juros no México subiu 200 pontos-base, para 5,75% ao ano, enquanto a do Brasil recuou 50 pontos-base, para 13,75% ao ano. A tendência de ambas taxas deve ser mantida em 2017, segundo aponta o relatório de política monetária do Itaú Unibanco. A equipe do banco projeta que o Banxico suba os juros no México para até 6,25% ao ano, enquanto o Copom deve cortar a Selic para 10% até o fim do ano.

Se as projeções se confirmarem, o “spread” nominal entre as taxas de juros dos dois países passaria dos atuais 8 pontos percentuais para 3,75 pontos porcentuais – lembrando que no começo de 2016 essa distância era de 10,5 p.p.. Seria o suficiente para tirar a atratividade brasileira do dinheiro estrangeiro? Até o momento, não é isso que estamos vendo.

O alívio fiscal 
Para Eduardo Velho, economista-chefe da INVX Global Partners, a resposta sobre a atratividade do Brasil apesar da queda de juros contratada para 2017 está no cenário de longo prazo. O corte da Selic, apesar de diminuir a rentabilidade dos investimentos do ponto de vista financeiro, é vista positivamente pelo mercado porque contribui para a estabilização da relação dívida/PIB (Produto Interno Bruto) e diminui as preocupações de que o governo perca o controle da dívida pública.

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Segundo ele, se as preocupações sobre a solvência de um país chegam a um ponto em que a percepção de calote é muito elevada, nem mesmo com a elevação de juros é possível atrair mais capital externo. “Por isso, a queda da Selic vai melhorar este cenário, dar a percepção de um risco fiscal muito menor lá na frente, com a recuperação da capacidade de pagamento do governo e a diminuição do risco cambial, que afasta os investidores”, explica, reforçando que a normalização do cenário macroeconômico interno reduz a volatilidade da cotação do real e dá mais segurança aos estrangeiros para investir no País. 

O economista da INVX Global, no entanto, faz a ressalva de que para este cenário se concretizar, é necessário que as reformas estruturais sejam aprovadas pelo Congresso. “A melhora da percepção do investidor vai depender muito dos fatores domésticos”, disse. O mesmo vale para o México: Velho explica que a política protecionista de Donald Trump pode ter efeitos negativos importantes sobre a balança de pagamentos do país. “O fechamento da economia dos EUA pode levar a um tombo de investimentos estrangeiros no México, o que que levaria à redução das exportações e a um menor influxo de divisas cambiais – nestes casos, a moeda e o CDS respondem, só que de forma negativa”, conclui.