Ânimo vai continuar? O que monitorar após a forte alta da Bolsa e a queda do dólar na última semana

De um lado, a visão de juros contidos pelo Fed animou, enquanto o risco fiscal segue no radar; semana será de definições

Lara Rizério

(Shutterstock)
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A semana que passou, ainda que mais curta para o Ibovespa por conta do feriado de 2 de novembro, foi de forte ânimo para os ativos de risco.

O Ibovespa fechou a semana com um forte ganho de cerca de 4,3% em reais e 6% em dólares, aos 118.160 pontos, marcando a melhor semana do ano desde abril.

Quase todos os papéis do índice entregaram retornos positivos, com destaque para Locaweb (LWSA3), Vamos (VAMO3), GPA (PCAR3) e Alpargatas (ALPA4), mais voltadas ao mercado doméstico e com ganhos de pelo menos 15% no período. As exceções ficaram com Suzano (SUZB3), São Martinho (SMTO3) e RD, ex-Raia Drogasil (RADL3), consideradas mais defensivas.

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O dólar também fechou a semana em queda de 2,2%, a R$ 4,90. Os mercados globais tiveram uma semana fortemente positiva, com o S&P 500 tendo sua melhor semana desde novembro de 2022.

Entre os fatores que levaram a esse movimento, na quarta-feira (1), o tom do Federal Reserve para o corte de juros animou o mercado. Com decisão de manutenção da taxa de juros de curtíssimo prazo (Fed Funds) nos Estados Unidos no patamar entre 5,25% – 5,50% ao ano, amplamente esperada pelo mercado, o presidente do Fed citou o aperto das condições financeiras como uma das justificativas para tal decisão.

“Sem o ‘economês’, ele quis dizer que o nível da taxa de câmbio, preços de ações, taxas de juros de prazos longos dentre outros instrumentos financeiros também estão servindo como fatores restritivos à economia, o que espera-se que ajude a conter a inflação. Caso não seja suficiente, voltou a repetir que estão preparados a seguir com uma nova elevação na taxa de juros. A leitura dos investidores é de que a autoridade monetária está tentando ao máximo evitar nova alta de juros, uma vez que a estratégia de manutenção sem deixar claro o final do ciclo não é bem uma novidade ao longo destes últimos meses”, destacou em relatório Lucas Queiroz, analistas do Itaú BBA.

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Na sexta-feira, o payroll reforçou essa visão, mostrando a criação de 150 mil empregos em outubro, abaixo da expectativa de geração de 180 mil postos de trabalho, e confirmando uma significativa desaceleração mensal, após abertura de 297 mil empregos na leitura de setembro (número já revisado, de 336 mil). Além disso, a taxa de desemprego subiu para 3,9%, de 3,8% em setembro, ficando acima da projeção de estabilidade para o indicador. Por fim, o salário médio por hora aumentou 0,21% em outubro ante setembro, abaixo da previsão de aumento de 0,30%.

“No conjunto, os números que foram divulgados apontaram para um mercado de trabalho nos EUA perdendo força. Isso reforça a perspectiva dos investidores de que o banco central norte-americano não precisará mais subir juros nas próximas reuniões”, avalia a Ágora Investimentos.

Enquanto isso, no Brasil, no mesmo dia do Fomc, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (o Copom) do Banco Central do Brasil reduziu a taxa básica de juros – a taxa Selic – em 0,50 p.p. (ponto percentual) para 12,25% ao ano.

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No comunicado, a diretoria do BC sinalizou uma maior preocupação com o cenário externo, após os impactos do conflito no Oriente Médio e do aumento dos rendimentos dos Treasuries, enquanto houve novamente reforço da importância do cumprimento das metas fiscais, a fim de ancorar as expectativas de inflação. Contudo, o Comitê ainda manteve a sinalização de manutenção do ritmo nas próximas reuniões, o que é visto como um fator bastante positivo para a Bolsa e principalmente para as ações de consumo doméstico.

Depois da alta registrada para o Ibovespa e o real na semana passada, a questão que fica no mercado é se esse movimento deve perdurar, sendo que importantes eventos desta semana deverão ser monitorados pelo mercado.

“A confiança do mercado poderá ser abalada pelos dados, que podem mostrar uma economia mais resiliente e uma inflação ainda mais rígida. Contudo, a baixa frequência das divulgações relevantes neste sentido agem no sentido de impulsionar o ciclo positivo recém iniciado”, avalia Queiroz, do BBA.

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Entre os próximos eventos a serem monitorados, a inflação ao consumidor (CPI) de outubro será revelada no dia 14 de novembro nos EUA, seguida de dados do varejo. Além disso, Powell fará discursos nesta semana, na quarta e na quinta, sendo monitorado de perto pelo mercado.

No Brasil pós-corte da Selic para 12,25%, um cenário externo com perspectiva de melhora e dados de inflação local mais benignos, o cenário à frente pode se mostrar favorável a um ciclo maior ou mais acelerado de redução da taxa básica, avalia o analista do BBA.

“Por outro lado, a volta da discussão em torno da meta fiscal traz cautela no curto prazo e pode impedir um aumento na magnitude de corte já na próxima reunião, em dezembro. Assim, em linha com o discurso mais ponderado do Copom, nossa equipe econômica revisou para 9,5% a taxa terminal deste ciclo, projetando manutenção do ritmo de corte em 0,5 p.p. nas próximas reuniões”, complementa.

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Cabe ressaltar que o ruído causado pelas declarações do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que não deverá cumprir as metas fiscais e que ter um déficit de – 0,25% ou – 0,5% do PIB não tem qualquer problema, continuou a incomodar os investidores que agora avaliam qual será o tamanho do déficit do próximo ano, aponta a Genial, também reforçando que isso eleva as expectativas quanto ao patamar final da Selic no atual ciclo de queda.

Enquanto isso, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e seus auxiliares têm buscado convencer o Palácio do Planalto de que é preciso “mais tempo” para perseguir a meta fiscal, segundo o Valor Econômico.

O prazo pedido pela equipe econômica, nas últimas conversas com a cúpula do governo para se certificar se será ou não possível obter a receita necessária para cumprir o déficit primário zero no próximo ano, é março de 2024. Março é quando o Executivo divulga o 1º Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias de 2024. A proposta é rechaçada, no entanto, pela Casa Civil, que tem tentado influenciar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na direção contrária.

Ao tentar postergar o debate para o ano que vem, o objetivo da equipe de Haddad é ter em mãos informações certeiras sobre um possível desequilíbrio orçamentário e, consequentemente, a necessidade ou não de contingenciamento. Na prática, isso significaria aprovar o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024 sem alteração no déficit.

A equipe econômica do BBA, com base na comunicação recente do Copom, nos desafios presentes no ambiente internacional e no aumento recente de incerteza sobre o cenário de consolidação fiscal, passou a esperar redução menor da taxa Selic, para 11,75% a.a. (antes 11,50%) no fim de 2023, e 9,50% (antes 9,00%) ao final do ciclo, em 2024.

O que vai prevalecer?

Cabe ressaltar que algumas casas também passaram a ver maiores dificuldades para a Selic abaixo de 10% até o ano que vem, o que seria um obstáculo para maiores altas da Bolsa. Em pesquisa realizada em agosto com gestores, o Bank of America destacou que a maioria dos participantes consultados esperavam que investidores mudem para ações apenas quando a taxa Selic atingisse 10% ao ano, enquanto 32% avaliam que será necessário um juro ainda menor para esse movimento acontecer.

Este seria um desafio para maiores altas da Bolsa, enquanto uma possível melhora no cenário externo pode ser um alívio para os investidores.

De acordo com o estrategista-chefe da Eleven Financial, Raphael Figueredo, as condições técnicas de mercado melhoraram consideravelmente desde a última sexta feira. “As chances de o mercado permanecer em alta nesta semana são elevadas, mesmo que algumas correções intermediárias aconteçam pelo caminho. Dólar deverá continuar operando em queda, o que ajudará na alta das commodities bem como no bom comportamento dos mercados emergentes”, avalia.

Queiroz, do BBA, também aponta que, após um ciclo de baixa nos mercados durante os meses de agosto a outubro, com impactos sobre todas as classes de ativos locais, os acontecimentos dos últimos dias sugerem mudança de direção.

“Se a razão para a tendência baixista nos últimos meses foi a continuada elevação nas taxas de juros americanas, esta possível reversão iniciada na semana que se passou abre caminho para valorização da nossa moeda, queda das taxas de juros futuros e valorização no mercado acionário, em movimento semelhante ao ocorrido durante o período compreendido entre os meses de março a julho”, avalia.

Para o câmbio, a equipe econômica do BBA manteve a projeção de taxa de câmbio em R$ 5,00 por dólar em 2023 e de R$ 5,25 por dólar em 2024.

“Dólar forte globalmente e menor diferencial de juros, com cortes na taxa Selic projetados até o final do ano que vem, devem pressionar a moeda. Apesar do viés de depreciação, principalmente via o componente global, mantemos a avaliação de que existem atenuantes para a dinâmica do câmbio. Do lado doméstico, o prêmio de risco segue próximo das mínimas registradas no pós-pandemia e o fluxo de dólares segue positivo, principalmente com o bom desempenho da balança comercial, puxado por exportações mais fortes e fluxo de investimentos estrangeiros”, aponta.

Já para o mercado acionário, olhando para frente, a XP Investimentos divulgou em relatório da semana passada prever que o Ibovespa fechará o ano de 2024 aos 136 mil pontos, com cenário-base com taxa de juros de longo prazo em 6%, múltiplo Preço por Lucro (P/L) em 9 vezes, e múltiplo dívida líquida por Ebitda (EV/Ebitda) – lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização – em 5,5 vezes. O avanço seria de cerca de 20% frente o fechamento de outubro.

“Continuamos a ver o múltiplo do Brasil como descontado, com o P/L em 7,4 vezes [atualmente], um desconto significativo em relação à sua média histórica de 11 vezes”, afirmam Fernando Ferreira e Jennie Li, estrategistas da XP.

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.