Americanas (AMER3): os próximos passos da varejista e o que os balanços revisados disseram sobre o setor

Morgan Stanley destaca competição mais racional e segue vendo Mercado Livre como principal beneficiário

Lara Rizério

Americanas (Foto: Facebook)

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Na manhã da véspera, a Americanas (AMER3) reapresentou seus resultados e demonstrações financeiras de 2021 e 2022, considerando os impactos da fraude financeira que a companhia sofreu.

A companhia também divulgou um fato relevante anunciando seu guidance, bem como organizou uma teleconferência para apresentar os ajustes realizados e o plano estratégico para frente.

O lucro líquido de R$ 544 milhões anteriormente divulgado para 2021 mudou para prejuízo de 6,2 bilhões, enquanto 2022 terminou com prejuízo de R$ 12,9 bilhões. O lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações (Ebitda, na sigla em inglês) de 2021 passou de R$ 2,1 bilhões positivos a R$ 3,4 bilhões negativos e o de 2022 ficou negativo em R$ 6,2 bilhões.

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A Americanas também informou nesta quinta-feira que terminou 2022 com dívida líquida de R$ 26,3 bilhões, crescimento de mais de R$ 12 bilhões comparado com 2021, e patrimônio líquido negativo de R$ 26,7 bilhões.

Já as previsões para 2025 incluem Ebitda de mais de R$ 2,2 bilhões, com uma alavancagem medida pela relação dívida líquida/Ebitda menor de 0,75 vez.

A empresa também estimou voltar a patrimônio líquido positivo até o final de 2025, mas considerando um desconto de R$ 5 bilhões nas dívidas que vêm negociando.

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Em análise sobre os ajustes realizados, os analistas da XP apontam que a fraude financeira foi realizada através de cinco principais instrumentos, que impactaram as demonstrações financeiras da companhia:

i) Contratos falsos de VPC (Verba de Propaganda Cooperada): eles se refletiram na redução do custo de mercadorias vendidas e no saldo de fornecedores no balanço patrimonial;

ii) Contratação de operações de risco sacado para sanar as necessidades de liquidez da companhia: houve reflexo no aumento do saldo de fornecedores, neutralizados pelos contratos de VPC da mesma magnitude;

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iii) Cobranças financeiras de risco sacado e capital de giro foram incorretamente contabilizadas: tais lançamentos reduziam o saldo de fornecedores no balanço ao invés de serem reconhecidas como despesas financeiras na demonstração de resultados

iv) Capitalização de despesas operacionais, como salários e fretes;

v) Operações de capital de giro de curto prazo eram contratadas para apresentar uma posição de caixa irreal ao final de cada trimestre: houve reflexo no aumento da conta de fornecedores, neutralizadas pelos VPCs na mesma magnitude.

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A Americanas está trabalhando para aprovar seu plano de reestruturação até o final de 2023, concluindo todas as etapas até o 1T24.

Sobre o guidance para 2025 e o plano estratégico para alcançá-lo, a estratégia será baseada na força do varejo físico, que se provou resiliente mesmo em um momento desafiador, e complementado pelo canal digital, serviços financeiros da AME e oferta de Ads.

Dentre as mudança a serem implementadas, no varejo físico, a busca é por ter um sortimento mais customizado e otimizado por loja (migrando alguns produtos para o 3P, ou marketplace, e adicionando novos), bem como reforma de lojas.

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No digital, o foco é em um sortimento similar do 1P (estoque próprio) das lojas físicas, usando o 3P para complementá-lo com categorias nas quais a Americanas não é referencia (como linha branca e eletro).

Os analistas da XP destacam que um passo importante foi dado, porém tem mais por vir. “Os executivos da Americanas concluíram um trabalho extenso para entregar uma fase importante do plano de restruturação, mas notamos que os auditores não certificaram os demonstrativos dado o alto nível de incertezas, enquanto a aprovação do plano ainda está pendente. Além disso, existem riscos relacionados a melhorias operacionais, enquanto continuamos a ver o macro desafiador e um cenário de competição mais acirrada daqui para frente”, avalia.

Olhando para frente

Para os próximos passos do processo de recuperação judicial, a Americanas informou na noite da véspera que apresentou, nos autos do processo de recuperação judicial da empresa e suas subsidiárias, pedido de convocação de assembleia geral de credores a ser realizada, em primeira convocação, no dia 19 de dezembro de 2023 e, em segunda convocação, no dia 22 de janeiro de 2024, para deliberação sobre o Plano de Recuperação Judicial.

A administração da companhia espera que o plano de recuperação judicial seja aprovado no início de 2024, embora a empresa reconheça que o cronograma não é definitivo. Pelo cronograma estimado, quinze dias após a aprovação do plano, os acionistas de referência da Americanas injetarão capital na empresa via financiamento DIP.

De quinze a noventa dias após a aprovação, a empresa espera realizar os pagamentos aos fornecedores de acordo com o seu plano. Sessenta a noventa dias após a aprovação, a empresa teria uma recapitalização, incluindo potencialmente R$ 12 bilhões de dívida capitalizada e uma injeção de capital de R$ 12 bilhões dos acionistas de referência. A gestão vai se concentrar na geração de fluxo de caixa e na rentabilidade, incluindo uma melhor captura de sinergias entre canais de varejo.

Sobre o guidance para 2025, a meta implica em uma margem Ebitda de 8,5%, aponta o Morgan Stanley – enquanto o plano da empresa pode implicar uma margem ainda maior, dados os comentários da administração sobre a redução das receitas devido à racionalização do seu foco em categorias.

“O plano de margem para 2025 se compara à nossa margem Ebitda estimada para o Magazine Luiza MGLU3 de 7,9% esperada em 2025 (4,4% em 2023). Observamos que a visão da Americanas para atingir esses níveis inclui vários fatores positivos em torno do crescimento orgânico, reformas de lojas, maior receita de serviços financeiros e lucratividade digital incremental – que acreditamos que poderia ser difícil de executar simultaneamente”, avalia o Morgan.

Números da Americanas e implicações para a indústria

De acordo com o Morgan Stanley, os novos dados da Americanas destacam ainda mais a “natureza subsidiada” das operações pré-2023 da Americanas.

Assim, olhando para o cenário atual, vê de forma positiva a maior racionalidade do mercado e aponta o Mercado Livre (MELI34) como o principal beneficiário dessa mudança de cenário.

“Os resultados reapresentados da Americanas revelam que a empresa estava operando com uma margem bruta consolidada 12,5 pontos percentuais (pp) menor em 2021 do que a apresentada anteriormente: 17,3% (margem bruta de 17,0% no digital), versus 29,8% divulgado anteriormente”, aponta.

Embora tenha havido uma melhora em 2022 (para 19,5%), os registros mostraram uma margem bruta online de apenas 1,3% – “acreditamos que isso demonstra de forma incremental a natureza subsidiada da operação online da Americanas sob a equipe de gestão anterior. No geral, os detalhes incrementais nos dão conforto de que a saída da Americanas de uma postura de vendas online altamente subsidiada contribuiu para um cenário mais racional de comércio eletrônico no Brasil”, apontam os analistas.

Para os analistas do Morgan, isso apoia ainda mais a visão de que nem todos os volumes de vendas que foram deixados pela Americanas serão recapturados por outros participantes do setor.

O Morgan aponta que, embora a empresa não tenha divulgado o volume bruto de mercadorias (GMV, na sigla em inglês) online, a receita do varejo digital caiu 27% na base anual em 2022; isso se compara à expectativa pós-3T22 do banco de que a receita online em 2022 iria cair 12% ano a ano (com base no GMV caindo 6% e uma taxa de aceitação do mercado de 10%).

“Acreditamos que os novos dados implicam que o GMV online do 4T22 para Americanas foi menor do que esperávamos anteriormente – apoiando assim uma base de ‘comparação mais fácil’ da indústria no 4T23. Nossas previsões para a indústria de comércio eletrônico no Brasil apontam para um crescimento anual de + 6% no 4T23, contra + 2% no 3T23 e -1% no primeiro semestre deste ano”, aponta o banco.

No acumulado do ano, o Mercado Livre tem sido o maior beneficiário incremental das mudanças de participação no e-commerce no Brasil por conta do efeito Americanas, com maior recuperação da no marketplace (3P) versus volumes de estoque próprio (1P), avalia.

“Embora as operações 3P do Magalu MGLU3 e Casas Bahia BHIA3 tenham apresentado crescimento incremental, os resultados acumulados no ano mostram menos evidências de recuperação de participação 1P. À medida que a Americanas se concentra ainda mais em estreitar as suas categorias, vemos o Mercado Livre (com um amplo mix de categorias) como a mais bem posicionada para ganhos incrementais contínuos de participação”, conclui o Morgan.

Tanto a XP quanto o Morgan têm a cobertura das ações da Americanas sob revisão.

(com Reuters)

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Lara Rizério

Editora de mercados do InfoMoney, cobre temas que vão desde o mercado de ações ao ambiente econômico nacional e internacional, além de ficar bem de olho nos desdobramentos políticos e em seus efeitos para os investidores.