9 ações de empresas brasileiras de alimentos que podem ser impactadas pela guerra na Ucrânia

Cervejarias, produtoras e massas e de proteína animal tendem a ser impactadas com alta das commodities, reflexo do conflito

Mitchel Diniz

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A oscilação dos mercados nas últimas semanas, recuando a cada nova escalada de tensões entre Rússia e Ucrânia, já dava uma ideia de como os investidores iriam se comportar no momento em que uma guerra fosse oficialmente declarada. Com o início do conflito armado, muito do que se antevia foi confirmado: os preços das matérias-primas dispararam, com destaque para o petróleo, avançando com folga na casa dos US$ 100.

Além do petróleo, os países adversários têm grande relevância no segmento agrícola. Juntos, respondem por 18% das exportações globais de milho e 28% das exportações de trigo. Os preços das commodities dispararam hoje no mercado internacional, com as notícias dos bombardeios em território ucraniano.

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Para as empresas listadas na Bolsa, o conflito repercute de duas formas. “As empresas de commodities devem ser beneficiadas. O setor de petróleo e do agro se beneficiam com a alta das commodities lá fora”, explica Fernando Ferreira, estrategista-chefe da XP.

“De maneira geral, é positivo para o lado de grãos, portanto positivo para o lado dos produtores: a gente pode falar de Brasil Agro (AGRO3), grande produtora agrícola do Brasil, e as usinas São Martinho (SMTO3) e Jalles Machado (JALL3), que são exportadoras de açúcar e etanol”, afirma Leonardo Alencar, analista da XP.

Por outro lado, setores de crescimento, como as empresas de tecnologia, tendem a ser impactadas negativamente. A guerra tende a contribuir com a escalada global da inflação e, com preços mais altos, mais rígidos devem ser os Bancos Centrais mundo afora em relação a alta de juros.

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Mesmo a Bolsa brasileira sendo forte em commodities, muitas das empresas listadas são consumidoras das matérias-primas que tendem a ficar mais caras com uma situação de guerra. É o caso das empresas de alimentos, com destaque para o setor de proteína animal. Veja a seguir nove companhias desse setor que devem ser impactadas pela guerra na Ucrânia – seja negativamente ou positivamente.

M. Dias Branco (MDIA3)

A compra de trigo corresponde a quase metade da estrutura de custos da companhia e o preço do cereal vai ser determinante para a lucratividade no futuro próximo, avaliam os analistas do BBA. “De acordo com os resultados da companhia no terceiro trimestre de 2021, as despesas com trigo foram a principal linha de estrutura de custo nos três primeiros trimestres do ano passado, representando 43% dos custos de bens vendidos”, afirmam.

Com um ambiente de consumo mais adverso, como o atual, qualquer alta mais significativa no preço do trigo poderia afetar diretamente a lucratividade da companhia, pois seria desafiador repassar os custos extras. O BBA estima que cada 5% de alta nos custos com trigo teriam de ser compensados por uma alta de 2% no preço do produto final, a fim de neutralizar os impactos da inflação nos resultados da companhia.

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“Acreditamos que pode haver um aumento nos preços do trigo, mas não vemos um risco em relação a estoques físicos no momento”, dizem os analistas. O Brasil é pouco dependente das exportações da Rússia e Ucrânia – apenas 1% do trigo importado vem dessas regiões. Logo, não se trata de disponibilidade de produto, mas de impacto no preço da matéria-prima.

O BBA tem recomendação market perform (desempenho em linha com a média do mercado) para M. Dias Branco e preço-alvo de R$ 27.

Ambev (ABEV3)

Os analistas do BBA estimam que aproximadamente 10% dos custos de produtos vendidos da unidade de cervejas da companhia no Brasil estejam relacionados a milho e trigo. “De acordo com os nossos cálculos, essas commodities têm um papel-chave na estrutura de custo da Ambev e qualquer alta mais expressiva de preços poderia prejudicar o potencial de ganhos da empresa”, afirmam.

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Assim como no caso de M. Dias Branco, o BBA acredita que a Ambev teria dificuldades em repassar um aumento de custos para o consumidor final neste e no próximo ano. Por outro lado, as estratégias de hedge da companhia têm poder para atrasar os impactos de uma alta nos custos para o ano que vem.

“Isso daria tempo à empresa para preparar uma estratégia de pricing e incorporar um novo cenário de custos. Além disso, dada a flexibilidade da estratégia de hedge, a empresa poderia evitar inflação adicional, caso a variação de preços seja apenas temporária”, afirmam.

O BBA tem recomendação market perform para Ambev e preço-alvo de R$ 18.

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Camil (CAML3)

O BBA acredita que a pressão nos custos por conta da alta do trigo poderia afetar as operações da Santa Amália, empresa mineira de massas adquirida pela Camil recentemente. “Com essa aquisição, as despesas com trigo entraram na estrutura de custos da Camil. No caso de um desequilíbrio de oferta nas exportações globais, podemos esperar por pressões de custos”, escreveram os analistas.

Mesmo assim, o BBA não acredita que a situação implicaria em uma  mudança de ventos para a companhia. Levando em consideração o tamanho da Santa Amália nas operações da Camil, os analistas não esperam que um cenário inflacionário inesperada vire os negócios de cabeça para baixo. Nos cálculos do BBA, as receitas da Santa Amália responderam por 6%  do lucro da Camil  em 2020 e o Ebitda da subsidiária equivale a 5% do Ebitda total de sua controladora.

“Uma queda de 100 pontos-base na margem Ebitda de Santa Amália teria impacto negativo de 1% no Ebitda da Camil. Por outro lado, os preços do arroz poderiam se beneficiar com a inflação do trigo e seus impactos no segmento de massas. A materialização desse cenário teria um impacto neutro, de maneira geral, para a Camil”, escreveram os analistas.

O BBA tem recomendação market perform para Ambev e preço-alvo de R$ 11.

JBS (JBSS3)

A exposição a custos com milho das unidades Pilgrim’s Pride, Seara e nos negócios com carne suína poderia gerar pressão  para a companhia, segundo o BBA, levando em consideração a participação de commodities na estrutura de custos dessas subsidiárias. Porém, o ambiente de consumo ainda saudável dos Estados Unidos poderia mitigar contratempos no mercado norte-americano, permitindo um repasse de custos para o preço do produto final.

A situação no Brasil é diferente: com um ambiente macroeconômico menos sólido, os consumidores estão mais resistentes a um repasse de preços, sobretudo no segmento de processados. A parte de carne bovina, tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil, seriam menos afetadas por um aumento nos preços dos grãos, com exposição indireta a esse mercado.

O BBA tem recomendação outperform (desempenho acima da média do mercado) para JBS e preço-alvo de R$ 47.

BRF (BRFS3)

De acordo com o BBA, as tensões geopolíticas têm impactos distintos sobre a empresa: melhores preços de frango e pressão de custos relacionados ao milho. A BRF poderia se beneficiar com melhores preços de exportação de frango para regiões que costumam ser abastecidas pela Ucrânia. Pelo lado negativo, dado o papel que a Ucrânia tem nas exportações globais de milho, uma queda nos estoques poderia pressionar contratos futuros e a estrutura de custo da empresa no curto prazo.

“Na nossa avaliação, os custos com o milho poderiam neutralizar preços melhores de frango em algumas regiões”, disseram os analistas do banco. A empresa poderia se beneficiar com melhora nas vendas para o Oriente Médio, região que representou 25% das receitas da BRF em 2021. A Ucrânia atende 10% da demanda por frango desse mercado.

“Acreditamos que sanções poderiam eventualmente dar a BRF poder para praticar preços mais altos nessa região”, diz o Itaú BBA. Porém, levando em conta o impacto negativo em potencial sobre os custos da companhia, efeitos de de disrupção nos estoques de milho poderiam neutralizar vantagens competitivas. “Estimamos que a cada 10% de alta nos preços do milho, os custos sobre produtos vendidos da BRF aumentariam em 2%”.

O BBA tem recomendação market perform para BRF e preço-alvo de R$ 24.

Marfrig (MRFG3)

As operações da Marfrig tem exposição mínima à Rússia e Ucrânia, já que os negócios da companhia estão concentrados nos Estados Unidos e menos de 2% de suas receitas vêm das regiões envolvidas no conflito, de acordo com cálculos do BBA. “Não acreditamos que Marfrig será afetada diretamente”, afirmam os analistas.

Porém, a companhia pode ser afetada indiretamente, por conta de sua participação na BRF. Se o conflito tiver impacto negativo sobre o comércio global de matérias-primas, o impacto em BRF poderia resvalar no valor de mercado de Marfrig.

O BBA tem recomendação outperform para Marfrig e preço-alvo de R$ 26.

Minerva (BEEF3)

Os analistas do BBA também enxergam impactos limitados para Minerva. Atualmente, 6% das receitas consolidadas da companha vêm da região onde o conflito está acontecendo. De acordo com o balanço do terceiro trimestre da companhia, em 12 meses, menos de 4% das exportações da empresa vão para essa parte do mundo, enquanto 12% das receitas da divisão Atena vêm da mesma região.

“A Minerva tem alguma exposição aos países envolvidos na escalada de tensões, mas não são os destinos mais importantes para as exportações da companhia”, escreveram os analistas.

A demanda global por carne bovina ainda está em alta e rotas poderiam ser ajustadas para compensar disrupções relacionadas a Rússia e Ucrânia. “A suspensão de compras de carne bovina brasileira pela China é um exemplo recente de como é possível realocar exportações sem prejudicar a rentabilidade de forma relevante”, diz o BBA.

O BBA tem recomendação outperform para Minerva e preço-alvo de R$ 17.

SLC Agrícola (SLCE3) e Brasil Agro (AGRO3)

Na avaliação da Ativa Corretora, empresas brasileiras exportadoras de grãos tendem a ganhar valor de mercado com o conflito no Leste Europeu. SLC Agrícola (SLCE3) e a Brasil Agro (AGRO3) são empresas citadas na análise.

A Ativa, contudo, chama atenção para riscos sobre os preços de fertilizante no setor agrícola. A Rússia foi responsável por mais de 20% das importações brasileiras do insumo no ano passado e a expectativa é que os preços possam subir em uma situação de guerra, elevando os custos dessas empresas também.

“No entanto, vale lembrar que a volatilidade dos fertilizantes não costuma ter efeito de curto prazo no resultado dessas empresas, uma vez que elas costumam fazer a compra desses produtos com bastante antecedência. Atualmente, empresas como a SLC Agrícola e a Brasil Agro só teriam seus resultados significativamente impactados por essa volatilidade caso ela persistisse por um período mais longo”, diz a análise da corretora.

De acordo com a Ativa, caso a situação seja resolvida até o final deste ano, o risco ao mercado com fertilizantes tende a não se concretizar.

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Mitchel Diniz

Repórter de Mercados