Em ano de eleição, sempre há discussão sobre o que pode ou não ser feito durante a disputa eleitoral. Em 2022, o tema tornou-se o centro do debate público cinco meses antes do início do período reservado às campanhas eleitorais.
No dia 25 de março de 2022, o Partido Liberal (PL), sigla pela qual o presidente Jair Bolsonaro concorrerá à reeleição, entrou com uma ação na Justiça depois que as cantoras Pabllo Vitar e Marina and The Diamonds se manifestaram contra a gestão de Bolsonaro. Pabllo ainda levou consigo uma bandeira com a imagem do ex-presidente Lula (PT), que tentará seu terceiro mandato.
O partido solicitou ao Tribunal Superior Eleitoral que fosse proibida a manifestação política de artistas durante o festival Lollapalooza, em que Pabllo e Marina se apresentaram. Alegou que esse tipo de posicionamento configura campanha antecipada.
O ministro Raul Araújo, que estava de plantão, considerou que a demanda do PL é pertinente e determinou que o festival fosse multado em R$ 50 mil por cada manifestação política feita durante o evento.
Três dias antes, no dia 23 de março, Araújo também deu sentença favorável à manutenção de outdoors com propagandas que homenageiam Jair Bolsonaro na cidade de Rondonópolis (MT) — pelo Código Eleitoral o uso de outdoors, analógicos ou eletrônicos, é proibido até durante o período de campanha.
Para explicar como funciona o Código Eleitoral, o InfoMoney produziu um guia completo com tudo o que você precisa saber sobre campanhas eleitorais. Confira abaixo.
O que é campanha eleitoral
Campanha eleitoral é o período em que é permitido aos partidos e candidatos fazerem propaganda política visando a angariar votos durante uma eleição.
É permitido disputar eleição todo candidato cujo partido tenha o estatuto reconhecido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) até seis meses antes da realização do pleito.
São proibidas de fazer campanha eleitoral todas as candidaturas rejeitadas pelo TSE, seja por não aprovação das contas ou enquadramento na Lei da Ficha Limpa.
Candidatos que estejam respondendo a processos, que estejam em análise na Justiça, podem veicular propaganda nesse período.
Quando pode fazer campanha eleitoral
De acordo com o Código Eleitoral (Lei 9.504, de 30 de setembro de 1997), é permitido a veiculação de propaganda eleitoral após o dia 15 de agosto do ano da eleição — data limite para que os partidos registrem seus candidatos na Justiça Eleitoral.
Em 2022, as candidaturas poderão iniciar as suas campanhas eleitorais a partir do dia 16 de agosto. Está autorizada a realização de comícios, a distribuição de panfletos e adesivos, caminhadas com apoiadores e publicações na internet.
As publicações em redes sociais, blogues e sites relacionados à candidatura ou ao partido, porém, podem ser mantidas fora do período de campanha. No entanto, não é autorizado que o candidato peça voto de forma direta e explícita ao eleitor ou que ele realize enquetes, ou testes, sobre intenção de votos. Somente são permitidos conteúdos com temáticas generalista, expressem a opinião do candidato ou do partido, e registrem momentos cotidianos.
Quais cargos podem fazer campanha eleitoral?
Podem fazer campanha eleitoral os candidatos a vereador, deputado estadual (ou distrital), deputado federal, senador — no Legislativo. Além dos pleiteantes ao Poder Executivo: prefeito, governador e presidente da República.
Para os cargos do Legislativo, com exceção dos senadores, cada partido pode registrar o número de candidatos correspondente ao total de cadeiras disponíveis nas Câmaras e Assembleias mais um. Dessa quantia, as agremiações devem apresentar o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada gênero.
A escolha dos candidatos deve ser realizada entre 20 de julho e 5 de agosto do ano eleitoral. A ata com as candidaturas selecionadas deve ser publicada, com o aval da Justiça Eleitoral, em qualquer meio de comunicação em até 24 horas após a definição dos nomes.
O que não pode ser feito durante as campanhas?
As campanhas eleitorais devem seguir uma série de normas estabelecidas pelo Código Eleitoral. É proibido:
- A confecção e a distribuição pelo comitê de campanha, ou pelo candidato, de camisetas, chaveiros, bonés, canetas, brindes, cestas básicas ou qualquer bem que possa ser considerado uma vantagem oferecida ao eleitor em troca de votos;
- Realizar showmícios e eventos com a presença de celebridades com o objetivo de entreter os eleitores durante comício ou reunião eleitoral. Não é autorizada a participação de artistas mesmo que eles se apresentem de forma voluntária, sem recebimento de cachê;
- Expor propaganda eleitoral em outdoors analógicos ou eletrônicos;
- A circulação de carros de som com a execução de jingles com nível de intensidade sonora superior a 80 decibéis;
- Usar trios elétricos para divulgação de campanha. O uso desses veículos é permitida somente para a sonorização de comícios;
- Atrelar a campanha a órgãos de governo, empresas públicas ou sociedade de economia mista por meio do uso de imagens, frases ou símbolos;
- Divulgar pesquisas eleitorais fraudulentas;
- Realizar enquetes relacionadas ao processo eleitoral.
As propagandas devem deixar de ser transmitidas na televisão e no rádio 48 horas antes da votação. Não é permitido a veiculação de publicidade paga em tais veículos durante o período de campanha eleitoral.
Além disso, carreatas, caminhadas com o candidato, panfletagem e comícios só podem ser realizadas até a véspera do domingo de votação. No dia da eleição são proibidos:
- Fazer uso de alto-falantes e amplificadores de som para propagandear a candidatura;
- Abordar eleitores ou fazer propaganda de boca de urna;
- Divulgar qualquer tipo de propaganda eleitoral ou partidária;
- Fazer novas publicações ou impulsionar conteúdos em redes sociais e em endereços eletrônicos.
Caso os partidos ou candidatos cometam algum desses crimes eleitorais, os responsáveis podem ser punidos com prestação de serviços comunitários, pagamento de multa ou até mesmo detenção. A pena é definida conforme cada tipo de delito e a gravidade do ato.
Candidato que faz campanha eleitoral antecipada, o que acontece?
É considerada campanha eleitoral antecipada, manifestações ou propagandas, que peçam explicitamente o voto do eleitor em prol de um candidato, realizadas antes de 15 de agosto do ano eleitoral.
Isso porque o Código Eleitoral estabelece que entre 20 de julho a 15 de agosto devem ser feitos os registros das candidaturas. Dessa forma, se alguma campanha é iniciada antes desse período pode prejudicar os candidatos ainda em fase de oficialização pelo partido — o que comprometeria a igualdade de condições de disputa.
Além disso, deve ser comprovado que o partido, ou a federação, ou a coligação, ou o próprio candidato tenha ciência ou tenha planejado a campanha fora de época. Caso a denúncia seja considerada procedente, os responsáveis pela propaganda, e o candidato que se beneficia dela, são punidos com pagamento de multa — que pode variar entre R$ 5 mil e R$ 25 mil.
O tema, porém, causa controvérsia. Rodrigo Moreira, servidor da Escola Judiciária Eleitoral, publicou um artigo no site do TSE em que diz que não existe um parâmetro temporal para que os atos eleitoreiros sejam considerados campanha antecipada.
Não é firmado se é campanha uma peça publicitária divulgada no ano anterior à eleição ou se a regra começa a valer somente no ano do pleito, por exemplo. Apenas é determinado o período em que a campanha passa a ser permitida, 15 de agosto do ano da eleição.
Dessa forma, o entendimento de que uma fala, um evento ou uma peça publicitária é campanha antecipada fica a critério dos juízes eleitorais — o que abre espaço para decisões díspares.
Moreira também destaca que a Lei Eleitoral, ao especificar que configura campanha antecipada somente se houver pedido explícito de votos, torna mais difícil a análise pelos magistrados. De acordo com a lei, não é enquadrado em casos de campanha eleitoral antecipada:
- A participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet. Mesmo que haja a apresentação de agenda política ou projetos de governo;
- A realização de eventos fechados para discutir políticas públicas, planos de governo, alianças partidárias e organização da legenda para as eleições. É permitido que o partido utilize de suas plataformas de comunicação interna para divulgar tais atividades;
- Promover prévias partidárias. É permitido a divulgação dos candidatos apenas dentro do partido e a realização de debates entre os pré-candidatos;
- Divulgar realizações de parlamentares e debates legislativos, contanto que não haja pedido explícito de votos;
- Publicar opinião pessoal sobre questões políticas nas redes sociais;
- Realizar eventos, custeados pelo partido, para divulgar as ideias, objetivos e propostas da agremiação;
- Fazer campanha de financiamento coletivo de forma antecipada.
Como denunciar campanha antecipada?
Qualquer pessoa pode registrar denúncia de campanha eleitoral antecipada, basta acessar a central de atendimento do Ministério Público Federal (MPF).
Ao entrar no endereço eletrônico, o usuário deve clicar em “representação inicial” e fazer um cadastro. No campo “tipo de manifestação” deve ser selecionado “representação”.
Em seguida, será disponibilizado um campo para que o denunciante descreva a situação irregular da forma mais detalhada possível. É importante que a manifestação apresente: qual é o fato, quando e onde ele aconteceu.
Se houver indicação do autor do crime, o MPF também solicita a indicação de seu nome. Além disso, há um campo para que o usuário anexe documentos e provas.
O Ministério Público, então, irá analisar a denúncia e julgar sua procedência. Se considerar que não há informações suficientes ou que o relato é inconclusivo, a representação será descartada.
Havendo prosseguimento da denúncia, o MPF notificará a Justiça Eleitoral, que abrirá o processo para análise do caso. Vale destacar que a Justiça age somente se for provocada pela promotoria. Não há possibilidade de ela atuar “por ofício”, ou seja, por conta própria.
Como são captados recursos para campanha eleitoral?
Os recursos destinados ao financiamento de campanha vêm do Fundo Eleitoral — uma reserva de dinheiro público. O montante total destinado às campanhas é aprovado no ano anterior às eleições durante a análise da Lei Orçamentária Anual (LOA) pelo Congresso. Em 2021, os parlamentares aprovaram o envio de R$ 5,7 bilhões para o financiamento de campanhas.
Esse dinheiro é depositado pelo Tesouro Nacional em uma conta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no Banco do Brasil no início do mês de junho do ano em que serão realizadas as eleições. Em até 15 dias, a partir da data de recebimento dos recursos pelo TSE,o valor total do fundo deve ser divulgado no Portal da Transparência do Tribunal. Em 2022, a quantia deve ser publicada até 16 de junho.
Todos os partidos com estatuto aprovado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) recebe uma quantia do fundo. A divisão é feita da seguinte maneira:
- 2% do total é dividido entre todos os partidos com estatuto reconhecido pelo TSE;
- 35% é rateado entre as agremiações com pelo menos um parlamentar eleito para a Câmara, com base na proporção de votos que cada bancada recebeu na última eleição para a Casa;
- 48% é distribuído proporcionalmente ao tamanho das bancadas atuais da Câmara;
- 15% é repassado aos partidos com representação no Senado, também seguindo a proporção do tamanho de suas bancadas.
Também é autorizada a doação de simpatizantes, pessoas físicas, aos candidatos. De acordo com o Código Eleitoral, o dinheiro deve ser depositado em uma conta aberta pelo partido com o objetivo de reunir os valores enviados por apoiadores da sigla ou de candidatos específicos.
Como doar para campanha eleitoral de um candidato?
As contribuições não podem ultrapassar o valor correspondente a 10% dos rendimentos brutos declarados pelo doador no ano anterior à eleição.
As doações podem ser realizadas por meio de cheques cruzados e nominais ou transferência eletrônica de depósitos; depósitos em dinheiro devidamente identificados; ou mecanismo de financiamento coletivo oferecido no site da campanha do candidato, partido ou coligação — sendo permitido inclusive o uso de cartão de crédito. Em todos os casos é necessário que haja a identificação do doador e emissão de recibo eleitoral para cada contribuição realizada.
TV aberta: quais são as regras?
Na televisão, assim como nas rádios, as propagandas eleitorais começam a ser veiculadas 35 dias antes da realização do pleito. Além disso, é proibido a transmissão de publicidade paga.
As campanhas devem utilizar apenas o espaço reservado na programação para a apresentação de pequenas chamadas e para o horário eleitoral gratuito.
No total, são 70 minutos diários que devem ser colocados à disposição das campanhas, que podem utilizá-los com inserções de 30 segundos e 60 segundos veiculadas entre as 5h da manhã e meia-noite. O horário eleitoral gratuito deve ser dividido da seguinte forma:
- Campanhas de presidente e deputado federal são transmitidas às terças-feiras, quintas-feiras e aos sábados.
- Campanhas de governador, senador, deputado estadual e deputado distrital são apresentadas às segundas-feiras, quartas-feiras e sextas-feiras.
- Campanhas de prefeito e vereador são veiculadas de segunda a domingo, sendo 60% do tempo reservado aos candidatos às prefeituras e 40% às câmaras de vereadores.
A divisão do tempo entre os partidos é feita da seguinte forma: 90% do espaço é distribuído proporcionalmente ao tamanho das bancadas na Câmara de Deputados; e 10% é rateado de maneira igualitária entre todas as siglas.
Em caso de formação de segundo turno, as emissoras de televisão e rádio são obrigadas a reservar dois blocos de dez minutos diários para cada disputa (no caso de ainda haver votação para governador e presidente).
A transmissão das propagandas inicia na sexta-feira seguinte à realização do primeiro turno e deve ser encerrada dois dias antes da votação do segundo turno. A divisão do tempo para cada candidato deve ser feita de forma igualitária.
O Código Eleitoral ainda determina que candidatos que tenham carreira na televisão ou rádio deixem de se apresentar em seus programas no dia 30 de junho do ano eleitoral. Caso a regra não seja obedecida, as emissoras podem ser multadas de R$ 20 mil a R$ 100 mil e o candidato pode ter sua campanha cancelada.
Também é proibido às emissoras de rádio e TV veicular programas — como minisséries e novelas — que homenageiam ou que mancham a imagem de algum candidato durante o período eleitoral. Os conteúdos desfavoráveis a algum político só podem ser realizados por programas jornalísticos, seguindo a conduta ética esperada por tais atrações: como ter apuração objetiva e imparcial, além de dar espaço para resposta.
Além disso, o Código Eleitoral veda às emissoras a apresentação de conteúdos que manipulem áudios, vídeos, fotos, que visem a ridicularizar ou degradar a imagem de alguma candidatura ou partido. A punição para esse tipo de conduta é aplicação de multa que varia de R$ 20 mil a R$ 100 mil.
O que é permitido nas redes sociais? Tem alguma restrição?
A propaganda eleitoral na internet é permitida a partir do dia 15 de agosto do ano eleitoral. O conteúdo de promoção das candidaturas pode ser veiculado nos sites oficiais dos candidatos, dos partidos ou das coligações.
O Código Eleitoral também autoriza o compartilhamento de publicações eleitorais por aplicativos e sites de mensagens instantâneas, correio eletrônico e redes sociais. No caso das listas de transmissão (para sites de mensagens e correio eletrônico), os destinatários devem ter autorizado expressamente, por meio de cadastramento, o envio dos conteúdos.
É proibida a criação de contas em sites e redes sociais com identificação falsa, cujo objetivo seja compartilhar conteúdos eleitorais. Não é permitido o uso de ferramentas de impulsionamento para distribuir publicações que visem a desinformar sobre candidaturas rivais, mesmo que tais dispositivos sejam gratuitos.
Além disso, é proibido veicular propaganda eleitoral em sites de pessoas jurídicas, com ou sem fins lucrativos, ou de empresas e órgãos vinculados à administração pública. A punição para quem descumprir alguma dessas regras é o pagamento de multa em valor que varia de R$ 5 mil a R$ 30 mil, ou, o montante equivalente ao dobro do valor pago para a produção e difusão dos conteúdos, caso ele ultrapasse a pena estipulada na lei.