Para economistas, banqueiros e empresários, carta reflete “indignação da sociedade”

A repercussão alcançada pela carta, com mais de 500 assinaturas e que continua recebendo adesões, surpreendeu os próprios signatários

Estadão Conteúdo

(Gerd Altmann/Pixabay)
(Gerd Altmann/Pixabay)

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Sensação de desespero. De urgência. Vontade de ser propositivo. Os economistas que assinaram a carta cobrando medidas efetivas no combate à pandemia, ao lado de empresários e banqueiros, têm palavras diferentes para explicar o que os levou a escrevê-la e a divulgá-la no fim de semana.

Ex-presidente do Banco Central e um dos idealizadores do Plano Real, Persio Arida recorre às crônicas de futebol de Nelson Rodrigues para falar do momento atual do país no enfrentamento da covid-19: “‘Não se improvisa uma derrota’, ainda mais uma derrota desse tamanho”, diz ele, completando a frase.

No caso, afirma, o fracasso anunciado seria resultado da “postura negacionista e da falta de seriedade com que o governo federal tem enfrentado o problema”, há exatamente um ano. “É uma mistura de ideologia, com não entendimento e despreparo”, diz Arida. “O governo federal foi omisso, conivente e partícipe da situação de calamidade que vivemos hoje.”

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A repercussão alcançada pela carta, com mais de 500 assinaturas e que continua recebendo adesões, surpreendeu os próprios signatários. Afinal, eram assuntos que todos tinham tratado em artigos e palestras, ao longo do último ano.

“A sociedade tem um nervo exposto que combina a aceleração rápida da pandemia e a inoperância do governo federal com o fato de que todas as medidas de baixo custo que poderiam ter sido tomadas ou não foram ou mereceram agressão e escárnio”, diz Claudio Frischtak, sócio da consultoria Inter.B e um dos cinco autores da carta. “Existe um sentimento de cansaço da sociedade, de que é insustentável ir pelo caminho da morte.”

A carta também ganhou repercussão pelo critério técnico: como acadêmicos ou ajudando a pensar o destino de empresas e bancos nas últimas décadas, os economistas são categóricos ao afirmar que não há dúvida entre escolher preservar a vida ou os empregos.

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“A recuperação é mais rápida nos lugares em que o enfrentamento à doença é mais eficaz”, diz Ana Carla Abrão, sócia da consultoria Oliver Wyman. “O exemplo mais claro é o dos Estados Unidos: depois que o (presidente norte-americano Joe) Biden tornou a vacinação prioridade, o país está pronto para a recuperação.” O custo tanto na dimensão humanitária quanto econômica, afirma, fica “tremendamente evidente” quando se colocam as duas realidades lado a lado.

Segundo os especialistas, uma de suas principais preocupações foi fazer um texto objetivo, baseado em fatos, ao mesmo tempo em que fosse contundente. “Desenho de política pública tem de ser baseado em evidência”, diz Frischtak. Também há ali uma mensagem recorrente: as medidas mais eficientes, baratas e positivas, como vacinas, máscaras, afastamento social e coordenação nacional, deixaram de ser tomadas, em troca de gastos de bilhões de reais para tentar consertar o estrago.

“Por que o governo não se organizou para comprar vacinas como fizeram o Chile, a Turquia e a África do Sul?”, afirma Arida. “Porque não entendeu do que se tratava, porque foi ideológico, negacionista.”

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Em algumas projeções de mercado, o número de mortos no país poderia chegar a 0,5% de sua população, com a destruição de riquezas – e de vidas – sem precedente. Independentemente do número final, os economistas são unânimes em afirmar que o Brasil sairá da pandemia mais pobre, mais desigual e mais injusto.

Indicadores econômicos já mostram que o país caminha para um semestre de recessão, mas o problema vai bem mais longe. Um dos agravantes é a falta de coordenação também do Ministério da Educação, que tem deixado crianças mais vulneráveis sem alternativa para o aprendizado.

“O Brasil já é pária em relação ao meio ambiente, aos direitos humanos e pode correr risco de se tornar o País em que ninguém quer estar, por conta das novas variantes”, diz Arida.

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No mercado, a presença de controladores de empresas e bancos no grupo de signatários foi lida como a avaliação de que, por mais generosos que sejam, ao doar bilhões de reais sem qualquer contrapartida ao combate da doença não conseguirão eliminar o problema – que precisaria ser enfrentado pelo Estado.

Com a carta entregue ontem aos comandantes do Legislativo e do Judiciário – e ao Executivo, por meio do ministro da Economia, Paulo Guedes -, a expectativa é de alguma mudança de rumos. “A racionalidade recomendaria o reconhecimento de culpa do governo e um meia volta”, diz Arida. “Mas esse governo não é racional. Não tenho nenhuma expectativa positiva sobre esse governo. Aliás, nunca tive.”

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