Crescem chances de uma aterrissagem suave para a economia global, diz diretora-gerente do FMI

"Mas não podemos baixar a guarda", alertou Georgieva, em discurso de abertura das reuniões anuais do FMI e do Banco Mundial

Estadão Conteúdo

A diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva Foto: Mark Wilson/Getty Images)

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Apesar do maior temor de recessão nos países desenvolvidos nas últimas semanas, a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva, disse que vê maiores chances de a economia global fazer uma aterrissagem suave à frente. Segundo ela, a economia mundial demonstrou uma “resiliência notável” e o primeiro semestre de 2023 trouxe “boas notícias”, principalmente, por conta de uma demanda por serviços mais forte do que o esperado e “progressos tangíveis” na luta contra a inflação.

“Isto aumenta as chances de uma aterrissagem suave para a economia global. Mas não podemos baixar a guarda”, alertou Georgieva, em discurso de abertura das reuniões anuais do FMI e do Banco Mundial, em evento, na Costa do Marfim.

Citando as novas projeções econômicas que o FMI deve divulgar na próxima semana, durante os encontros, ela admitiu que o ritmo de expansão global segue bastante fraco, aquém da média de 3,8% antes da pandemia. E as perspectivas de crescimento global no médio prazo enfraqueceram ainda mais, conforme ela.

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Embora a recuperação dos choques dos últimos anos continue, é lenta e desigual, avaliou. “Um impulso mais forte vem dos Estados Unidos. A Índia e várias outras economias emergentes, incluindo a Costa do Marfim, são pontos positivos”, disse Georgieva.

Por outro lado, ela lembrou que a maioria das economias avançadas está atravessando um momento de desaceleração econômica. “E na China a atividade econômica está abaixo das expectativas e muitos países enfrentam um crescimento anêmico”, destacou a diretora-gerente do FMI.

Ela voltou a alertar, contudo, para os riscos em torno de uma fragmentação global, com os países agindo cada vez mais por si só na esteira dos recentes choques globais, a pandemia e a guerra na Ucrânia. Além de uma ameaça às já fracas perspectivas de crescimento global, o movimento é um desafio especialmente para países emergentes e em desenvolvimento, destacou.

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“Estimamos que a perda acumulada da produção global resultante de choques sucessivos desde 2020 ascenda a US$ 3,7 trilhões em 2023”, projetou Georgieva.

Inflação e efeitos

A diretora-gerente do FMI alertou para o risco do ressurgimento repentino da inflação apertar ainda mais as condições financeiras, impactando duramente os mercados e as economias. Apesar da melhora do custo de vida em alguns países, muitos vão conseguir convergi-lo de volta à meta dos bancos centrais somente em 2025, segundo ela.

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“Combater a inflação é a prioridade número um. Graças às ações decisivas dos bancos centrais e às políticas fiscais responsáveis, a inflação está diminuindo na maioria dos países, mas é provável que permaneça acima da meta para alguns países até 2025”, enfatizou Georgieva.

Ela reforçou a discurso dos bancos centrais dos Estados Unidos e da Europa de que para que se vença a luta contra a inflação, as taxas de juros terão de permanecer mais elevadas durante um prazo mais longo. “Isso é fundamental para evitar uma flexibilização prematura da política, dado o risco de ressurgimento da inflação”, disse a diretora-gerente do FMI.

Estudo do Fundo publicado esta semana mostra a crescente importância das expectativas de inflação como motor dos aumentos de preços. Nele, inclusive, o organismo elogia a decisão do Brasil de adotar uma meta de inflação contínua no lugar da chamada ano-calendário, em vigor desde 1999.

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Comunicação dos Bancos Centrais

Nesse contexto, Georgieva disse que os bancos centrais precisam comunicar claramente os seus objetivos para ajudar a moldar a opinião das pessoas sobre a inflação. Mencionou ainda sua responsabilidade quanto à manutenção da estabilidade financeira.

“As expectativas de uma ‘aterragem suave’ ajudaram a impulsionar vários preços de ativos”, afirmou ela. “Mas uma rápida reavaliação destas perspectivas – com o ressurgimento repentino da inflação – poderá levar a um forte aperto das condições financeiras, afetando duramente os mercados e as economias”, alertou.

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Cenário fiscal

A diretora-gerente do FMI chamou atenção ainda para “riscos significativos” do lado fiscal. “Um quinto das economias emergentes e mais de metade dos países de baixo rendimento continuam em elevado risco de crise de dívida”, afirmou ela.

De acordo com Georgieva, outro estudo do FMI mostra a importância da melhoria na governança e na capacidade do Estado para contribuir com um crescimento econômico inclusivo. Tal análise aponta que um pacote de reformas centrado na redução da burocracia, na melhoria da governança e na redução das restrições comerciais poderia aumentar o Produto Interno Bruto (PIB) de países emergentes e em desenvolvimento em 8% em quatro anos, conforme ela. “Mesmo assim, é necessário fazer mais para apoiar os países emergentes e em desenvolvimento vulneráveis. É por isso que necessitamos urgentemente de reforçar a rede de segurança financeira global”, enfatizou.

Por fim, Georgieva cobrou os países membros a reforçarem os recursos junto ao FMI. O organismo tem recebido críticas sobre a necessidade de passar por uma reforma, que vêm do próprio Brasil e ainda da Argentina, que tem dívidas bilionárias com o Fundo. “Um FMI forte e com recursos adequados também significa um FMI que responde melhor às necessidades das economias emergentes e em desenvolvimento”, rebateu ela.

Desafios globais

A diretora-gerente do FMI ainda destacou os desafios globais como baixo crescimento, risco de ressurgimento da inflação e crise fiscal como pano de fundo para as reuniões anuais do organismo e do Banco Mundial que ocorrem, na próxima semana, em Marrakesh, no Marrocos. Além disso, os encontros que reúnem a comunidade internacional para debater perspectivas mundiais acontecem na sequência de terremoto que devastou a região.

“Poucas semanas após um terrível terremoto, Marrocos reunirá a comunidade internacional num espírito de solidariedade e compromisso para superar os desafios que enfrentamos”, disse Georgieva, na Costa do Marfim.

Ela lembrou ainda que as reuniões anuais ocorrem pela primeira vez na África em 50 anos, continente no qual os desafios globais podem ser vistos “sob uma lupa”. A última edição ocorreu em Nairobi, no ano de 1973. Desde então, o mundo transformou-se de muitas maneiras, conforme Georgieva. “As desigualdades dentro e entre países aumentaram e enfrentamos uma crise climática existencial”, enfatizou a diretora-gerente do FMI. “E o crescimento tem estado numa trajetória decrescente ao longo da última década”, emendou.

Segundo Georgieva, os países precisam construir pontes para que o mundo consiga engrenar em uma trajetória de crescimento forte, sustentável e inclusivo. Um ponto chave, na sua visão, é utilizar os “recursos em abundância” existentes nas economias avançadas para turbinar as anêmicas perspectivas de crescimento global à frente.

FMI e Banco Mundial chegaram a cogitar mudar o local das reuniões anuais após o terremoto que devastou a região, conforme revelou o Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado.

No entanto, após debater o tema, as duas instituições confirmaram que os encontros seriam mantidos no continente africano.

As reuniões anuais do FMI e do Banco Mundial acontecem na próxima semana, entre os dias 9 e 15 de outubro, em Marrakesh.