A saída silenciosa de Wojcicki do comando do YouTube

Troca de CEO acontece logo depois de mudança no mercado de anúncios e competição do TikTok acenderem sinal de alerta na plataforma

Maria Antonia Viuge Roberto Vinhaes

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

(Francois G. Durand/Getty Images)
(Francois G. Durand/Getty Images)

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No último dia 16 de fevereiro, a Alphabet anunciou que a CEO do YouTube, Susan Wojcicki, vai deixar seu posto.

A executiva foi uma das primeiras funcionárias da Google e amplamente responsabilizada pela ascensão do conglomerado para se transformar no que é hoje – e ela tem apenas 54 anos. Sua garagem foi a primeira sede da companhia. Como disse a revista The Economist: “Wojcicki é o mais próximo de ‘aristocracia de Mountain View’ que se pode ser sem ter o sobrenome Brin ou Page”.

Wojcicki fez o pitch para a aquisição do YouTube em 2006, fechada por US$ 1,65 bilhões naquele ano. Ela assumiu seu comando da plataforma em 2014 e, durante seus nove anos de comando, o YouTube mais do que duplicou seus usuários mensais, para um total de 2,6 bilhões de usuários mensais ativos, e opera por meio de um modelo eficiente de compartilhamento de receitas com os criadores de conteúdo.

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Esse modelo tem se provado uma alternativa de sucesso quando comparado aos streamers que financiam seu conteúdo e monetizam seu business apenas por meio de assinaturas.

Ela foi responsável por lançar programas de assinatura como YouTubeTV e YouTube Music, que trouxeram um novo perfil de receitas para a companhia e mudaram a estratégia da divisão.

Ao longo desse tempo, ela teve também que liderar a empresa em momentos delicados, como incidentes violentos que encontraram inspiração em conteúdo presente na plataforma, assim como características do algoritmo de recomendação que sugeria conteúdo perigoso para os usuários.

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Foram vários momentos de crise nesses nove anos, mas a companhia conseguiu preservar e ampliar sua posição competitiva e a credibilidade com os anunciantes. Não é um feito qualquer.

A saída de Wojcicki depois de 25 anos de Google vem após uma sequência de resultados fracos da divisão.

O mercado de anúncios, no geral, tem enfrentado desafios diante de novas medidas de proteção de dados dos consumidores. Isso tem resultado em menor precisão dos anúncios e menor retorno nos orçamentos de publicidade dos anunciantes.

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Agora, empresas cujas receitas e lucros dependem da venda de anúncios, e, portanto, da eficácia deles, estão repensando seus modelos.

O YouTube não ficou imune. O gráfico abaixo mostra a desaceleração das receitas desde 2021:

Em abril de 2021, como parte de uma reformulação de sua política de privacidade, a Apple introduziu novas regras de coleta de dados dos usuários de seu sistema operacional.

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Antes, apps como o YouTube eram capazes de vincular um código identificador único a um aparelho iPhone e, com ele, atribuir interações com anúncios — como impressões, cliques e instalações — a esse usuário específico. Sem esse código, os anunciantes são menos capazes de criar perfis de interesse dos usuários e de medir com precisão a conversão de uma campanha publicitária.

O caso é ainda mais grave para o YouTube porque o plano de crescimento da plataforma passa por torná-la mais “shoppable”, isto é, elevar seu apelo comercial por meio da introdução de novos formatos de anúncios que encorajam o usuário a agir. Isso inclui imagens clicáveis de produtos na tela dos vídeos e links que conectam os usuários diretamente para sites de parceiros onde produtos podem ser comprados.

Esses formatos de anúncios, no entanto, dependem da precisão no posicionamento, medição e personalização de campanhas, todos atributos machucados pelas novas regras de privacidade da Apple.

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Além disso, não se pode desprezar a pressão competitiva do TikTok, que vem alterando o campo de competição entre as big techs. De acordo com a Insider Intelligence, o TikTok se tornou a terceira maior rede social do mundo, ficando atrás apenas do Instagram e do Facebook.

Além de representar uma competição direta a esses participantes, na medida em que compete pela atenção do usuário, a ascensão da plataforma chinesa é o principal motivo do surgimento do “shorts”, um formato de vídeo curto com duração máxima de 60 segundos, que foi introduzido em setembro de 2020 e funciona basicamente como uma cópia do negócio chinês.

Apesar de ter uma média de 50 bilhões de visualizações por dia, a introdução do novo formato impactou diretamente o modelo de negócios do YouTube, visto que sua monetização por meio de anúncios é diferente do modelo tradicional.

Com vídeos mais curtos e uma facilidade maior para o usuário “pular” um conteúdo, os anunciantes ainda estão tendo que se adaptar ao novo formato e inventar formas de capturar a atenção do usuário, está cada vez mais volátil.

Como resultado, a monetização do novo modelo é baixa se comparada a de vídeos longos, o que ressalta o forte impacto que o TikTok teve nas receitas da plataforma de vídeos da Alphabet.

Mas a troca de CEO, apesar de motivada por esses desafios, na nossa visão, parece mais sinalizar uma passagem de bastão previamente desenhada do que uma mudança estratégica baseada em resultados recentes.

É especialmente importante marcar uma transição de poder após a divisão perder um executivo importante em Robert Kyncl, que tinha mais de dez anos de história na companhia e atuava como Chief Business Officer. Em janeiro deste ano, Kyncl assumiu o posto de CEO do Warner Music Group.

O sucessor escolhido é Neal Mohan, que atua como Chief Product Officer do YouTube desde 2015 e está na companhia desde 2007. Acreditamos que Mohan não representa um grande redirecionamento da plataforma e sim a continuidade do trabalho que vinha sendo feito, mas consciente de que os resultados entregues nos últimos anos são insuficientes.

O novo CEO terá que encontrar soluções para reaquecer as receitas do YouTube, fortalecendo o elo entre criadores, plataforma e usuários, mantendo anunciantes satisfeitos e se protegendo de ameaças competitivas.

Nos parece que o YouTube ainda tem um longo e rentável caminho a percorrer, com ampla oportunidade de crescimento. A performance recente não está condizente com o potencial da plataforma e a Alphabet parece estar de acordo com isso – promovendo mudanças importantes para endereçar as preocupações de investidores.

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Maria Antonia Viuge

Sócia e analista sênior da Nextep Investimentos. É economista formada pela UFRJ e pela Kingston University London

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Roberto Vinhaes

Roberto Vinhaes é sócio da Nextep Investimentos. Engenheiro formado pela PUC-Rio, foi um dos fundadores da Investidor Profissional, a 1ª gestora independente de fundos do país