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No início dos anos 2000, a indústria de luxo crescia rapidamente – e a Burberry estava ficando para trás. Fundada no Reino Unido em 1856, a marca tinha um enorme legado, mas não conseguia mais se conectar com o consumidor. Em 2006, a ex-executiva de varejo da Apple, Angela Ahrendts, entrou como CEO e realizou um turnaround da empresa.
Dentre suas primeiras medidas estavam: limitar o número de roupas e acessórios carregando o padrão quadriculado clássico da Burberry a 10% do total da oferta; minimizar o impacto que itens falsificados tinham causado às vendas; recomprar licenças de perfume e produtos de beleza que a marca tinha vendido e comprar a franquia espanhola que, naquela altura, estava gerando 20% das vendas do grupo.
Além disso, um dos seus maiores legados foi ter sido uma early adopter da tecnologia numa indústria que era ainda muito conservadora nesse aspecto. Ela ficou por lá até 2014 e retornou à Apple após uma gestão bem-sucedida que viu a capitalização de mercado da Burberry triplicar no período, e alcançou os seguintes resultados:
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O diretor criativo Christopher Bailey também teve participação importante nesse processo de turnaround. Ele foi responsável pela renovação da estética da marca e, especialmente, pela sua capacidade de conectar com o consumidor jovem – britânico e internacional. Ele foi tão bem-sucedido que, quando Ahrendts deixa a empresa, Bailey foi apontado CEO, acumulando este cargo com aquele de Chief Creative Officer, um movimento um tanto quanto surpreendente.
Bailey fica no cargo de CEO até 2017, quando foi substituído por Marco Gobbetti, ex-chefe da Celine. Ele aumentou os preços dos produtos e modificou a distribuição, de modo a priorizar os canais próprios em detrimento do negócio de margens mais baixas de revendedores.
Além disso, como é comum no setor de luxo, a indicação de um novo CEO geralmente implica uma troca na direção criativa da companhia. E assim foi: Gobbetti trouxe Riccardo Tisci, com quem tinha trabalhado na Givenchy, para assumir o cargo de diretor criativo.
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Um designer de altíssima reputação pelo trabalho que fez à frente da Givenchy entre 2005 e 2007, Tisci acabou sendo uma decepção na Burberry. Sua abordagem foi criticada pelo aparente descompasso com a heritage da marca. A partir disso, é quase impossível gerar brand momentum e aumentar brand equity. E, no setor de luxo, heritage é tudo. O melhor dos mundos é combinar inovação com um respeito à história da marca, o que Tisci e Gobetti foram incapazes de fazer.
No final de 2021, sem ter feito progresso significativo, Gobetti decidiu entregar o cargo e aceitar a posição de CEO da marca italiana Salvatore Ferragamo. Johnatan Akeroyd foi apontado como o novo CEO da companhia, assumindo o cargo em abril de 2022. Ele deixou o posto de CEO da Versace, que ocupava desde 2016. Antes disso, passou 12 anos como CEO da Alexander McQueen (subsidiária da Kering). Antes disso, foi store manager e comprador da Harrods.
Seu objetivo seria o mesmo de seu predecessor: melhorar a lucratividade do negócio e retomar o status que a marca já teve dentro do mundo da moda, buscando a ascensão da Burberry ao patamar de reconhecimento e exclusividade das marcas dos grupos LVMH e Kering. A centenária marca britânica não ocupa mais um lugar relevante no alto luxo, e é justamente isso que desejam reconquistar.
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A China representaria também um dos pontos focais do novo CEO. O país representa aproximadamente um terço das vendas do grupo, o que criou uma dependência forte. Isso se complicou em 2021 quando a empresa começou a sofrer um boicote por parte do consumidor chinês por se pronunciar a respeito do escândalo de Xinjiang, inclusive perdendo sua parceria com a Tencent como desdobramento desse caso. Seus embaixadores romperam laços com a marca e sua presença digital foi massivamente reduzida. Para piorar, os lockdowns mais severos no país dificultaram a recuperação.
Em setembro de 2022, Akeroyd e Burberry anunciaram que o britânico Daniel Lee substituiria Tisci como diretor criativo da marca. Lee tinha 36 anos e, desde junho de 2018, atuava como diretor da Bottega Veneta, onde teve sucesso ao revitalizar a coleção de ready-to-wear para homens e lançar uma linha de artigos para casa. Sua missão na Burberry tem sido focar em elevar a heritage britânica, parte importante de consolidar um posicionamento mais high-end para a marca – o que tem direta implicação nas margens. Sua primeira coleção foi um sucesso, e a segunda acabou de ser lançada.
Como resultado do trabalho de ambos, de 2021 para cá a margem operacional da empresa demonstra progresso, agora girando no patamar dos 20% – ainda abaixo dos seus pares LVMH e Kering, que têm margem operacional de 26%. No último ano fiscal, a receita rompeu a barreira dos £ 3 bilhões e o retorno sobre capital investido (ROIC), que girava em torno de 20% antes da pandemia, melhorou significativamente desde o low de 2020 (6%) e chegou a 17%. A ação, desde o primeiro dia de Akeroyd no posto em primeiro de abril de 2022, deu retorno de 11,3% – contra 9,8% da LVMH e -23,6% da Kering. Retorno satisfatório em meio a um ambiente desafiador para o mercado de luxo.
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Hoje, ainda não é claro se o turnaround liderado por Akeroyd e Lee funcionará. As mudanças implementadas ainda não tiveram impacto suficientemente grande nos números para mover a ação, a situação na China não apresentou nenhum avanço material e tampouco a Burberry voltou a ocupar um espaço privilegiado no zeitgeist da moda de luxo mundial. A empresa, no entanto, apresenta dois aspectos muito importantes para mudar esse quadro: uma marca mundialmente conhecida, mas com amplo espaço para expansão e um balanço limpo, sem dívidas. A execução, tanto da parte criativa quanto operacional, é que vai determinar o sucesso do plano de turnaround.
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