PLC 79: o Senado sentou na reforma da banda larga

Tida pela equipe econômica e por diversos especialistas como passo fundamental para a modernização do setor de telecomunicações, o PLC 79 tramita vagarosamente no Senado, para desespero do governo.

Pedro Menezes

Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

(Agência Senado)
(Agência Senado)

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Os debates sobre o PLC 79/2016 se arrastam. Caso aprovado, o projeto muda a relação das empresas de telecomunicações com o Estado, gerando bilhões de reais em investimentos nos serviços de internet banda larga.

Quando escrevo que o PLC 79 pode gerar investimentos em banda larga, não se trata de uma suposição minha sobre as consequências econômicas da lei. Os bilhões de reais são uma consequência direta do projeto, pois resultariam de acordos entre a ANATEL e as empresas do setor. A expansão da banda larga seria contrapartida pela redução de custos regulatórios relacionados à rede de telefonia fixa, cada vez mais obsoleta.

O que muda com o PLC 79

A operação de bens públicos por empresas privadas pode ser firmada através de diversos instrumentos jurídicos. Concessões, muito comuns entre as empresas mais antigas do setor, são contratos firmados entre o Estado e as empresas, com diversas contrapartidas e exigências.

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Boa parte dos serviços da Oi se dão através de contratos de concessão. Por isso, a empresa é obrigada a fazer manutenção de orelhões em todo o país. Apesar da tecnologia já estar obsoleta, e poucos usarem orelhões, é uma das obrigações decorrentes do atual contrato de concessão.

A autorização é outro tipo de relação entre empresas e Estado que já é aplicada nas telecomunicações. Neste caso, há menos obrigações para a empresa, que pode adaptar seu serviço conforme a demanda. Diversas empresas do setor, como a NET, já operam principalmente por contratos de autorização.

Segundo a ANATEL, na maioria dos países “a prestação de banda larga se dá em regime de autorização, em que a livre iniciativa e o estímulo à competição e ao surgimento de modelos de negócio inovadores são a regra”. O PLC 79 tem como principal consequência a possibilidade de conversão dos contratos de concessão em vigor, que passariam ao regime de autorização.

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Para que a conversão seja feita, a ANATEL deve precificar o ganho econômico gerado aos acionistas privados, obrigando as empresas a um investimento correspondente no serviço de banda larga.  A alteração não retiraria inteiramente as obrigações das empresas. Nas regiões mais carente, onde há menos competição e oferta, o PLC 79 prevê que o serviço continue obrigatório. Mesmo assim, o número de obrigações regulatórias cai consideravelmente.

O projeto, longo e complexo, envolve ainda outras mudanças. Uma delas, já vigente na maior parte dos países desenvolvidos, é a criação de um mercado de radiofrequências. Isto é, as empresas do setor que usam menos radiofrequências do que contrataram poderão comercializar este excesso num mercado secundário, aumentando a eficiência das empresas e a qualidade do serviço para o consumidor.

Apesar de se tratar de um projeto técnico, cheio de filigranas complicadas, as consequências para o consumidor não podem ser desprezadas. Através da redução de preço, ganhos de eficiência, da melhoria do serviço através de novos investimentos e tecnologias, quem consome internet – um meio de lazer e fator de produção essencial no século 21 – tendem a ganhar com a aprovação do PLC 79.

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O Senado sentou em cima do projeto – e esta demora pode sair bem cara

No Senado, o projeto foi distribuído para a relatora Daniella Ribeiro (PP-PB), irmã do deputado e relator da reforma tributária na Câmara, Aguinaldo Ribeiro. O projeto anda a passos de tartaruga, sem grandes novidades desde fevereiro, quando foi designado para a relatora.

Essa lentidão pode custar muito cara ao país, por diversos motivos. Um deles é objetivo e direto: como os contratos de concessão tem prazo para acabar, o investimento que a ANATEL pode exigir como contrapartida para transformar o contrato em autorização diminui a cada dia.

Entre 2015 e 2018, a manutenção de orelhões custou R$ 1,1 bilhão às empresas de telecomunicações, segundo a ANATEL, com baixo retorno na qualidade do serviço consumido pela maioria dos brasileiros. Esse custo segue sem mudanças enquanto as empresas não fecharem acordo com a ANATEL, uma operação que depois ainda precisará de aval do TCU.

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O PLC 79 prevê que a ANATEL exija, em investimentos, valor equivalente ao ganho econômico imediato do setor privado com a mudança de concessão para autorização. A contrapartida faz sentido para as empresas, pois elas poderão transformar gastos em tecnologias obsoletas em melhoria na produtividade no serviço de banda larga. Quanto mais demorar a aprovação, menores serão os investimentos o Estado pode exigir em troca da conversão da concessão em autorização.

Outro fator temporal, talvez ainda mais importante do que o anterior, é o leilão da rede 5G, previsto para 2020. Quanto mais cedo o PLC 79 for aprovado, maior será a segurança jurídica e competição no 5G, permitindo que as empresas participem do leilão depois de um planejamento mais aprofundado sobre como atuar no novo setor de telecomunicações. O leilão é importantíssimo para a expansão e atualização tecnológica do serviço de internet no país.

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Por que tanta demora?

Os ganhos do projeto não são distribuídos igualmente. A Oi tem, ao mesmo tempo, a maior quantidade de obrigações relacionadas a telefonia fixa e a pior situação financeira dentre as grandes empresas do setor. Com uma mudança, seria possível dar sobrevida à Oi através de novos investidores, sedentos para transformá-la numa gigante da banda larga.

Por mais que outras empresas se beneficiem com o PLC 79, a maioria também perde se a Oi for capaz de se manter ativa. Por isso, nos últimos dias, ganharam força os rumores sobre um suposto lobby de concorrentes da Oi, especificamente a Claro.

O vice-presidente de relações institucionais da Claro, Fábio Andrade, emitiu no início do mês um parecer defendendo que o projeto passe pela comissão de economia do Senado antes de ir ao plenário. Apesar de ser representante dos interesses de uma empresa, Fábio também representa a “sociedade civil” em cargo de caráter consultivo no Conselho de Comunicação Social do Senado, através do qual emitiu o parecer.

Representar uma empresa, cabe lembrar, não é errado. Não há qualquer indício de crime nesses atos de Fábio. Mas o caráter de urgência desse projeto, que é discutido há pelo menos 3 anos, deve ser mais importante do que qualquer interesse privado. O Senado, afinal, deve ter o interesse público como norte.

O potencial do PLC 79 já foi estimado nas dezenas de bilhões, num país extremamente carente de investimentos, mas esse valor diminui a cada dia. Por se tratar de um serviço consumido por grande parte da população, o aumento de eficiência no setor gera ganhos para praticamente todos os brasileiros.

Quanto tempo o Senado pretende perder em sua lenta análise o projeto?

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Pedro Menezes

Pedro Menezes é fundador e editor do Instituto Mercado Popular, um grupo de pesquisadores focado em políticas públicas e desigualdade social.