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Paulo Guedes não começou mal a sua gestão. Seu primeiro ato, a reforma da Previdência, foi um sucesso. O ministro da Economia acertou ao propor uma reforma que garantia economia de recursos superior à proposta de Temer. Além disso, o famigerado trilhão em 10 anos serviu como âncora retórica no debate. A partir daí, os parlamentares foram constrangidos a não desidratar tanto o texto. O primeiro ato de Guedes, portanto, foi um golaço. No segundo ato mais importante do ano, a reforma tributária, Guedes se perdeu, chegando ao seu pior momento.
É difícil entender a insistência do ministro com a CPMF. Não faltam evidências sobre os maus resultados desse tipo de imposto em outros países. O economista Felipe Restrepo, por exemplo, publicou recentemente um estudo completo sobre a experiência latino-americana de tributação da movimentação bancária. Como resultado, encontrou que a “tributação das transações bancárias tem um efeito significativo no crescimento econômico, principalmente por afetar negativamente indústrias expostas a fricções financeiras”.
Indústrias complexas, que utilizam diversos insumos para produzir uma máquina especializada, tendem a sofrer mais, pois precisam lidar com mais fornecedores e movimentam mais dinheiro através do sistema financeira. Tais indústrias usualmente oferecem maiores salários e melhores condições de trabalho para seus empregados.
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Outro artigo, desta vez de Pedro Albuquerque, analisou especificamente a CPMF brasileira, ao invés de experiências diversas de tributação da movimentação financeira. A conclusão do estudo é inequívoca: “A teoria econômica, a experiência internacional e a evidência brasileira revelam, portanto, que a CPMF apresenta significativas deficiências como instrumento de arrecadação”.
Albuquerque utilizou dados brasileiros para analisar algumas das principais críticas à CPMF. É verdade que a CPMF gera um peso-morto na economia, diminuindo a eficiência e bem-estar da população? Um imposto sobre movimentações financeiras tende a desbancarizar a economia, incentivando o uso de dinheiro vivo para fugir do imposto? Em ambos os casos, os resultados indicam respostas positivas.
Quando comparamos o artigo de Albuquerque com a proposta de Guedes, a situação fica ainda pior. Segundo os cálculos realizados no artigo, a CPMF teria sua receita máxima com uma alíquota de 0,59%. Ignorando trabalhos acadêmicos sérios, Guedes propõe uma alíquota de 1%, que geraria mais ineficiência econômica, mais peso-morto, sem qualquer ganho de arrecadação por isso.
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Sendo um liberal, concordo com Guedes em muitos assuntos. Sua proposta de volta da CPMF, porém, é indefensável. A escola de economia da Universidade de Chicago, onde Guedes completou seu doutorado nos anos 70, é famosa pelo respeito à evidência empírica e ceticismo quando alguém tenta reinventar a roda da política econômica. É difícil entender por que Guedes age mais como Dilma do que como Friedman no debate tributário.
É claro que Guedes nunca falou em volta da CPMF. Apesar disso, é fato que ele propõe um imposto sobre transações financeiras, quase idêntico à antiga contribuição provisória criada por FHC.
Felizmente, Bolsonaro não gostou da ideia. Ontem, ao demitir Marcos Cintra e reiterar que não vai recriar a CPMF, o presidente animou economistas sobre a possibilidade de uma reforma tributária sem barbeiragem.
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Isto é o que mais surpreende neste pior momento de Paulo Guedes. Durante as eleições, o “Posto Ipiranga” foi vendido como solução para as antigas más ideias econômicas de Bolsonaro. Caso o presidente tentasse alguma barbeiragem, Guedes o controlaria. Em entrevista à revista Piauí, ele chegou a comparar o então presidenciável do PSL a um animal disposto a ser domado. Nove meses depois da posse, é Bolsonaro quem precisa domar Guedes para evitar suas péssimas ideias para a reforma tributária. Por essa, ninguém esperava.
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