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A Medida Provisória nº 627, publicada em 12 de novembro de 2013, foi prometida pelo governo em outubro. Seria a norma que asseguraria que os lucros e dividendos distribuídos pelas empresas brasileiras de 2008 a 2013 não seriam tributados como determinado por Instrução Normativa editada pela Receita Federal em setembro (IN RFB nº 1.397/13).
A MP, porém, trouxe algumas surpresas. A maior delas: a garantia de não tributação retroativa dos dividendos depende da decisão das empresas de antecipar para 2014 (ao invés da data programada, 2015) os efeitos de outras normas que podem potencialmente aumentar sua tributação ou, no melhor cenário, a burocracia a que estarão sujeitas.
É uma verdadeira chantagem legislativa. Ou como poderia dizer Don Corleone, no célebre filme O Poderoso Chefão, “é uma oferta que não poderemos recusar”… A tributação determinada pela instrução normativa é ilegal. É um absurdo que as empresas sejam “incentivadas” a aderir a normas “voluntariamente” para evitarem uma tributação ilegal.
Um pouco de história….
Em 2008, as normas societárias e contábeis foram substancialmente alteradas no processo de convergência aos padrões internacionais (International Financial Reporting Standards – IFRS).
Como as mudanças afetavam o reconhecimento contábil de receitas, despesas e custos, para evitar que também tivessem impactos fiscais, foram neutralizadas pelo Regime Tributário de Transição (RTT). Ele determina que os métodos e critérios de reconhecimento de receitas, custos e despesas na apuração do lucro tributável sejam aqueles vigentes em 31 de dezembro de 2007.
O lucro obtido com base na contabilidade anterior a 2008, a ser considerado na apuração do IRPJ, da CSLL e do PIS/Cofins, corresponderia ao chamado “lucro fiscal”, que existiria paralelamente ao “lucro societário”, apurado conforme as normas contábeis em vigor.
Em fevereiro deste ano, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) editou parecer defendendo que o lucro isento de tributação para sócios e acionistas é somente o “lucro fiscal”, calculado conforme o RTT. Se distribuído valor maior, com base na contabilidade societária da empresa, a diferença será tributável.
Em setembro, a IN nº 1.397/13 confirmou o entendimento adotado pela PGFN, além de ter aplicado o mesmo raciocínio a diversas outras finalidades, como o pagamento de juros sobre capital próprio.
O repúdio do mercado a esta tributação retroativa fez com que o governo voltasse atrás e prometesse editar norma garantindo a isenção dos lucros passados.
É neste contexto que nasceu a MP nº 627/13.
Ela tem a pretensão de adequar a legislação tributária às normas contábeis em vigor (ou seja, normas IFRS), estabelecendo ajustes na apuração do IRPJ, da CSLL e de PIS/Cofins. De modo geral, a MP buscou uma transição sem grandes impactos fiscais. Há preocupação, contudo, que alguns ajustes possam gerar aumento de carga tributária, como as alterações promovidas nas bases de cálculo de PIS/Cofins e no aproveitamento fiscal do ágio (esta discussão será objeto dos próximos posts).
As novas regras valem apenas a partir de 1º de janeiro de 2015, havendo a possibilidade de os contribuintes optarem por sua antecipação para 1º de janeiro de 2014.
E aqui está a chantagem legislativa: somente quem antecipar o término do RTT para 1º de janeiro de 2014 terá afastada a tributação dos lucros e dividendos societários distribuídos entre 2008 e 2013 em excesso ao “lucro fiscal” apurado segundo as normas do RTT (isto é, segundo os critérios e métodos contábeis em vigor em dezembro de 2007).
Os contribuintes que não optarem ficarão, no entender do Fisco, sujeitos à tributação descrita na instrução normativa, detalhada a seguir.
Você pode estar em dívida com o Fisco: o seu lucro não é mais isento
As empresas que distribuíram de 2008 a 2013 dividendos em excesso ao “lucro fiscal” e não optarem pela antecipação do término do RTT para 2014 darão origem, no entender do Fisco, à seguinte tributação:
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(i) investidor pessoa física residente no país: IRFonte às alíquotas da tabela progressiva (de zero a 27,5%), com posterior tributação em sua Declaração de Ajuste Anual do ano-calendário do recebimento;
(ii) pessoas jurídicas domiciliadas no país: IRPJ e CSLL;
(iii) residentes ou domiciliados no exterior fora de paraíso fiscal: IRFonte de 15%; e
(iv) residentes ou domiciliados no exterior em paraíso fiscal [1]: IRFonte de 25%.
Os tributos supostamente devidos, enquanto não atingidos pela decadência, serão cobrados pelo Fisco, como regra geral com juros (Selic) e multa (75%).
Para os investidores pessoas físicas residentes no Brasil, a responsabilidade da empresa investida pelo IRFonte existirá apenas até o último dia útil de abril do ano-calendário seguinte à distribuição. A partir de então, a empresa poderá ser cobrada apenas por juros e eventual multa. O imposto passará a ser devido, com juros e multa (75%), pelo investidor pessoa física.
A tributação dos valores distribuídos de 2008 a 2013 é ilegal, uma vez que a Lei 9.249/95 assegurou a isenção dos lucros e dividendos calculados com base na legislação societária então em vigor.
Resumo da ópera: fique de olho na escolha – pela antecipação ou não do término do RTT – a ser feita pelas empresas nas quais investiu… mesmo que já não invista mais.
1. Residente ou domiciliado em país ou dependência com tributação favorecida a que se refere o art. 24 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996.