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Por Gabriel Salvatti*
Muito se fala sobre a necessidade de o Brasil abrir sua economia, revisando a legislação e as regulamentações vigentes, de modo a estimular a competitividade. Sou favorável a um mercado pautado pela livre iniciativa e cooperação mútua, em que as preferências dos indivíduos estabelecem os vencedores e a concorrência estimula o desenvolvimento. Nações com padrões elevados de desenvolvimento social e qualidade de vida, como Estados Unidos, Nova Zelândia e Suíça, progrediram não pela efetividade do controle estatal sobre os mercados, mas por terem acreditado em uma economia livre.
Aqui no Brasil, a lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019, conhecida como Lei da Liberdade Econômica, trouxe um importante avanço nesse sentido, principalmente, estabelecendo limites à burocracia. O capítulo III, por exemplo, prevê garantias fundamentais à livre iniciativa que limitam as intervenções estatais e a regulação excessiva. Porém, ainda há muito a melhorar. Nosso país ocupa a lamentável posição 144 no ranking de liberdade econômica da Heritage Foundation (que analisa 180 nações). Considerando apenas as Américas, estamos na posição 25 em uma lista com 32 países, muito abaixo de vizinhos como Chile, Colômbia, Peru e Uruguai.
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Esse estudo é apenas um entre tantos que expõem os fatores que retiram o Brasil do mapa de investimentos globais e que, também, desfavorecem a iniciativa empresarial interna. Uma economia controlada pelos interesses do grupo político no poder não se desenvolve, e quem sofre as consequências é a população – assolada por problemas sociais como a pobreza, o desemprego, um sistema de saúde precário, educação de baixa qualidade e violência assustadora. Entendo que um livre mercado, com base no exemplo chinês, não é a única resposta para todos os desafios sociais que enfrentamos. Porém, esse é o arranjo econômico que historicamente tem conduzido países ao progresso e que tem aumentado significantemente o padrão de vida geral. Não se pode tolher da humanidade esse direito.
Se o livre mercado é capaz de produzir tantos resultados, que barreiras ele encontra no Brasil? O que nos mantém em situação tão desfavorável? Quais são os inimigos da liberdade econômica em nosso país? Vejamos.
A lei. Para ser livre, o mercado deve se organizar sem interferência legal, cabendo ao sistema jurídico o papel de oferecer ao indivíduo os meios de processo, caso se sinta lesado por outrem. Em nosso país, todavia, é recorrente a intromissão do legislador e do judiciário no funcionamento dos mercados. Temos leis que determinam quantas horas uma pessoa deve trabalhar e que valor deve receber por seu trabalho. Há leis que monopolizam a instituição em que o cidadão deve depositar seu fundo previdenciário. O Estado, de forma contínua, assume protagonismo intervém em acordos de natureza privada. Durante a pandemia do covid-19, já tivemos interferências nos preços dos supermercados, dos alugueis e das mensalidades escolares, apenas para citar alguns exemplos. Sob o argumento de que as pessoas são incapazes de escolher por conta própria, estabelecendo acordos voluntários, o resultado é o atraso no desenvolvimento social e a insegurança jurídica que afasta o investidor.
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Aliada à intervenção legal, temos a burocracia. Segundo estudo do Banco Mundial, o Brasil é o país onde mais se perde tempo cumprindo obrigações legais, com quase o dobro necessário no segundo colocado nesse índice. O ranking de facilidade de fazer negócios (Doing Business) da mesma instituição coloca o Brasil na posição 124 de 190 países. Vivemos um império da burocracia e a livre iniciativa não tem como prosperar Reclamamos dos baixos níveis de serviço oferecidos no setor de telecomunicações, dos preços de passagens aéreas e das altas taxas praticadas pelos bancos, mas não percebemos como é complexo investir e competir nesses setores. Sem estímulo à concorrência, quem paga é o consumidor, taxado pela burocracia do Estado que diz protegê-lo. Não precisamos de tamanha regulação em um sistema que deveria ser ajustado pelas preferências das pessoas.
No entanto, nem todos são prejudicados por essa dura realidade. Há quem se favoreça nesse cenário e eles estão empenhados em impedir que as coisas mudem. Em um ambiente onde o Estado tem o poder de interferir de forma tão profunda nos mercados, quem se favorece são aqueles que se aproveitam das dificuldades criadas. A aversão imposta pela insegurança jurídica e pela burocracia desfavorece a competição e prejudica a todos, exceto aqueles que possuem representantes na justiça ou que conseguem influenciar as regras do jogo. Sobre esse ponto, enquanto houver meios legais de obter influência política no mercado sempre haverá quem tente obter vantagem. Logo, é fundamental que o poder de intervenção estatal na economia seja vetado, retirando das mãos dos oportunistas as ferramentas que eles tanto gostam de manusear.
Contudo, a interferência estatal não tende à redução enquanto os indivíduos não assumirem o protagonismo na economia. A visão paternalista do Estado pelas pessoas precisa mudar, pois é justamente através dela que os burocratas se mantêm no comando. Não é coerente defender uma economia livre e clamar socorro ao poder público quando chegam as crises. É fundamental acreditar na eficiência do mercado principalmente quando a situação se torna difícil. Deve-se entender que não vamos progredir elegendo políticos melhores, esperando que eles resolvam nossos problemas. O caminho do sucesso passa fundamentalmente pela iniciativa individual, através de nosso trabalho e de nossas empresas. Se há um inimigo perigoso para a economia livre, esse é a covardia e a omissão dos indivíduos que formam uma sociedade.
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Vivemos um momento específico em que as dificuldades econômicas impostas pela crise pós-pandemia serão utilizadas como uma grande oportunidade de emplacar ainda mais intervenção estatal nos mercados. Lembremos que não são políticos apaixonados pelo protagonismo ou burocratas obcecados pelo controle que resolverão o problema econômico. Apenas a eficiência dos mercados é capaz criar as soluções que precisamos em um momento tão desafiador.
*Gabriel Salvatti é associado II do Instituto Líderes do Amanhã, formado em Sistemas de Informação e MBA em Controladoria e Finanças pela FGV. Ele é sócio e gerente de soluções na Inflor Consultoria em Sistemas.