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“Allegro ma non troppo”

Por que vejo um certo exagero na velocidade de retomada do Ibovespa – mas continuo otimista com a Bolsa
Por  Guilherme Affonso Ferreira -
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Depois de quatro anos seguidos de Ibovespa superando o CDI (2016: 38,9% e 14%, respectivamente; 2017: 26,9% e 10%; 2018: 15% e 6,4%; 2019: 31,6% e 6%), a crença dominante entre os players do mercado de capitais, no final de 2019, era de que 2020 seria o quinto ano de ascensão.

E havia bons motivos para isso. Uma reforma da Previdência de bom tamanho foi aprovada no segundo semestre de 2019. Além disso, perspectivas do encaminhamento de novas e importantes reformas, além da queda das taxas de juros, embasavam esse otimismo.

O Ibovespa fechou 2019 aos 116 mil pontos e começou o ano da maneira que se havia projetado: em 24 de janeiro, o índice quase superou os 120 mil pontos.

Em fevereiro, quando as mazelas da Covid-19 começavam a atingir a Europa (até janeiro, acreditava-se que o surto estava restrito à região de Wuhan, na China), o índice começou a ceder e fechou o mês em 104 mil pontos.

Foi em março que o mercado brasileiro se deu conta da gravidade, extensão e implicações econômicas da pandemia. No dia 19 de março, batemos a mínima de 62 mil pontos. No dia 23, tivemos o “low” de fechamento, em 64 mil pontos. Desde o “high” em 24 de janeiro, foi uma queda de quase 50%.

Escrevo este artigo 75 dias depois deste momento, tendo o mercado já reagido de maneira vigorosa (mais de 50% de alta desde a mínima), estando atualmente ao redor dos 95 mil pontos.

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Importante lembrar que um indicador, depois de cair 50%, precisa subir 100% para voltar ao mesmo ponto. Já andamos mais da metade do caminho de volta.

Constatado que os males da crise são inquestionáveis (previsão de queda do PIB em torno de 6%, desemprego atingindo níveis recordes de duas casas e um déficit público de mais de R$ 500 bilhões neste ano), a pergunta que resta é se há motivo para uma retomada tão vigorosa.

Logo nos primeiros dias de isolamento, escrevi, neste canal, as razões que acreditava que seriam mitigadoras da crise para as boas empresas que sobrevivessem. Todas elas continuam verdadeiras:

  • Taxas de juros irrisórias para a tradição do país, criando um desinteresse pelo mercado de renda fixa;
  • Ambiente competitivo diminuído ao final da crise, favorecendo aquelas empresas que conseguissem atravessar com boa saúde financeira; e
  • Uma enorme liquidez por todo o mundo (o Brasil não é exceção), provocada pelas injeções de recursos do Estado, que provocarão uma apreciação generalizada dos ativos, em especial a Bolsa.

Como a retomada na Bolsa está sendo mais rápida do que entendo prudente, gostaria de listar fatores negativos que conviverão com esses mitigadores que mencionei:

  • Uma grande dificuldade de nos livrarmos das “muletas oficiais” e suas consequências para o déficit público – quanto mais tempo convivermos com elas, mais difícil fica;
  • Dificuldade de financiamento da dívida pública que não sabemos ainda a quanto vai chegar. Esse desafio fica maior ainda no ambiente de juros baixos que gostaríamos de preservar;
  • Queda acentuada do PIB, em especial dos setores industrial e de serviços, com a dificuldade natural de retomada da atividade; e
  • Desemprego acentuado no fim da pandemia e a complexidade de inserir essa massa de desempregados dentro da “nova economia”.

Fiquei agradavelmente surpreso com a reação da enorme massa de “novos CPFs” que ingressou na Bolsa no começo deste ano e não saiu correndo ao primeiro estampido.

Se isso tivesse acontecido, seria como alguém desistir da faculdade porque o “trote” foi muito severo. Não ocorreu e, mais do que isso, o contingente não parou de crescer.

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Por fim, ressalto que, mesmo vendo um certo exagero na velocidade de retomada do Ibovespa, como o título sugere, continuo otimista. Destaco, porém, o que já disse em artigo anterior: a queda foi generalizada, mas a retomada deverá ser seletiva.

Temos setores que sofreram pouco ou quase nada nesta crise, mas existem outros que vão levar muitos anos para se recuperar – alguns estão condenados para sempre.

Minha sugestão é que os investidores sejam bastante seletivos nesse processo. A decisão de vender uma ação ou de comprar uma outra deve ser tomada olhando pra frente e não no retrovisor.

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Guilherme Affonso Ferreira Guilherme Affonso Ferreira é sócio-fundador e chairman da Teorema Capital. Além disso, é conselheiro de empresas como Arezzo, B3 e M Dias Branco. Foi diretor-presidente da Bahema no período em que a companhia foi acionista relevante do Unibanco (1986 a 2008) – e obteve um retorno de 50% ao ano, em dólares, com as ações do banco. Também foi conselheiro da Petrobras de 2015 a 2018, participando do programa de recuperação da companhia.

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