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Por que os “gringos” estão comprando Bolsa brasileira

Com alta de juros lá fora, empresas que geram caixa têm ganhado espaço em relação aquelas que buscam crescimento acelerado. Por motivos como este, os gringos estão comprando Brasil - e bem barato
Por  Felippe Hermes -
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Importante: os comentários e opiniões contidos neste texto são responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a opinião do InfoMoney ou de seus controladores

Foi em 19 de maio de 2008 que o Ibovespa atingiu seu maior valor na história, batendo os 44.616 pontos, bastante acima, até mesmo dos valores atuais. O motivo, claro, é o fato de a máxima de 2008 ter ocorrido quando calculamos o valor do Ibovespa em dólar.

A prática não é tão difundida por aqui, mas quando falamos de alguém com capacidade de alocar recursos ao redor do mundo, câmbio importa, e muito.

Este foi o caso de gestores ali por 2008 quando, apesar do otimismo com o Brasil e o boom de commodities, o mundo se viu em meio a uma crise no sistema financeiro americano, o que por sua vez se traduz em uma crise global.

A reação dos dois governos, o brasileiro e o americano, selaria o destino da bolsa brasileira por um bom tempo.

Por aqui, apostamos em retirar do leilão da ANP os campos do pré-sal, sepultando iniciativas do mercado de capitais de financiar campanhas privadas em petróleo e gás, e ao mesmo tempo, forçando a principal empresa da bolsa, a Petrobras (PETR3;PETR4), a se endividar.

Ao mesmo tempo apostamos em uma política de campeões nacionais, aumentando significativamente a presença do governo e dos bancos estatais no crédito.

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O resultado foi o chamado “efeito crowding-out”. Parece complicado, mas é algo simples e lógico. Imagine que as empresas demandam uma quantia de 100$ em financiamento para seus projetos. Quando o governo decide elevar de US$ 20 para US$ 60 o crédito via bancos públicos, o resultado não é, ao contrário do esperado pelo governo, um aumento no total investido para US$ 140 e sim a diminuição da participação de que antes financiava estes investimentos.

O caso piora quando os bancos públicos, como o BNDES, ofertam crédito a juros negativos, menores do que a inflação. Por qual razão um investidor privado buscaria recursos na bolsa, onde a cobrança por resultados é maior, e a pressão sobre os controladores também, quando pode simplesmente buscar recursos em um banco público sem qualquer cobrança sobre sua execução? A resposta, claro, é nenhuma.

Com até 70% do crédito na economia vindo de bancos públicos e programas generosos de subsídio e incentivos fiscais, a Bolsa perdeu força. De quebra, mesmo com dinheiro quase gratuito, os empresários não aumentaram seus investimentos, afinal, o clima no país não parecia otimista, mesmo com uma alta significativa do PIB em 2010. A confusão fiscal em Brasília já se desenhava no horizonte, tornando investimentos a longo prazo inviáveis.

Como se não bastasse intervir na Petrobras, o governo também lançou mão de uma MP que mudava regras no setor mais estável da bolsa: as empresas do setor elétrico.

Já ao norte do Rio Grande, a terra do “Tio Sam”, a situação era completamente distinta. Por mais irônico que pareça, em meio a crise de 2008, o capital fugiu para os EUA, o centro do problema em questão. O motivo, claro, foi o fato de que, mesmo em crise, os EUA ainda possuíam a impressora de dólares.

O crédito farto vindo da impressora do banco central para resgatar o país da crise, levou a uma onda especulativa na bolsa, com empresas de tecnologia, pouco intensivas em capital, se utilizando dos recursos para crescer em uma velocidade acelerada.

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A última década portanto marcou uma inversão completa em relação ao início do século, com os EUA atingindo o pleno emprego e suas marcas de tecnologia ganhando mercado ao redor do mundo.

No cenário atual, há uma tentativa de busca por novos mercados. Ainda que as empresas de tecnologia, como as que compõe a famosa FAANG (Facebook (agora Meta), Apple, Amazon, Microsoft, Netflix e Alphabet, a dona do Google), continuem a crescer, a demanda por commodities e as mudanças no padrão energético global tem levado a um novo “boom” em países emergentes.

A rápida transição de fontes poluentes para fontes renováveis, como eólica e solar, tem criado uma instabilidade de suprimento. Ambas as novas fontes são conhecidas pela sua intermitência, ou seja, não geram energia de forma constante.

Como consequência, a geração total de energia pode sofrer uma variação significativa em países dependentes destas fontes, o que leva a uma procura por fontes mais ágeis de reposição, como o petróleo e gás. Este tem sido o caso do Reino Unido e Alemanha, por exemplo.

A consequência primária dessa instabilidade, claro, é a inflação, que atingiu em cheio praticamente todas as economias globais. Mesmo os EUA, que tecnicamente possuem uma proteção inflacionária por poder importar produtos baratos no mundo (afinal, basta criar dólares e trocar por produtos, o que em tese reduziria os preços nos EUA), veem a inflação atingir 7,2%, digna de um país latino-americano.

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Com inflação em alta e commodities também, os juros tendem a subir por lá, ao menos 3 vezes neste ano, segundo o Fed. Ponto positivo, ao menos por hora, para os emergentes.

No Brasil, os “gringos” investiram R$ 37,4 bilhões em ações da Bolsa, apenas em janeiro deste ano.

Outro motivo relevante, além dos resultados de empresas como bancos, Petrobras e Vale (VALE3), tem sido o fato de que nossa moeda está desvalorizada, sendo uma das mais prejudicadas na pandemia. Isso torna a bolsa brasileira barata em relação ao restante do G20.

Vale e Petrobras, as maiores estrelas da bolsa, negociam em cerca de 5 a 6 vezes seu lucro anual, um valor considerado extremamente baixo, e que atrai investidores em busca de “value”, contra growth (crescimento).

De tempos em tempos, os astros conspiram, no que resta torcer para que, ao menos dessa vez, o país colabore.

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Felippe Hermes Felippe Hermes é jornalista e co-fundador do Spotniks.com

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