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*Por Christian Gazzetta
Na esteira das finanças descentralizadas (DeFi) e dos tokens não fungíveis (NFTs), os jogos em blockchain se destacaram no ecossistema cripto no início de 2021, lançando as bases para transformar a economia dos jogos eletrônicos. Neste artigo, exploramos as principais motivações para esse desenvolvimento.
Indústria tradicional de jogos: tamanho, crescimento e concentração de renda
A indústria de jogos eletrônicos conta hoje com receitas anuais próximas aos US$ 200 bilhões, com mais de 2 bilhões de jogadores – mais de 25% da população mundial.
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A pandemia contribuiu para o crescimento generalizado dessa demanda: durante a quarentena, 93% dos menores de 18 anos relataram passar mais tempo jogando; entre os maiores de 60, 42% dedicam mais de 20h por semana e as procuras dessa faixa de idade aumentaram 200%.
E não é só tempo que os usuários investem. As desenvolvedoras de jogos monetizam com a venda dos jogos e de itens, personagens e outros ativos in-game. O Call of Duty: Warzone é um bom exemplo da importância dessas microtransações para o setor: mesmo sem custo inicial para os jogadores, o jogo faturou US$ 2,3 bilhões apenas no primeiro trimestre de 2021.
Mas esses custos não são bem recebidos pelos jogadores: 60% acham que jogar já é caro demais.
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É verdade que se pode ganhar dinheiro em competições – os prêmios em dinheiro somaram US$ 144 milhões em 2021 -, mas esse ganhos são extremamente concentrados: enquanto uma divisão igualitária entre os 17 mil competidores teria rendido US$ 8.808 para cada, o jogador mediano ganhou apenas US$ 747 ao longo de todo o ano – no mesmo período, os cinco jogadores mais bem remunerados receberam pelo menos US$ 3,5 milhões cada. Há outros tipos de rendas para jogadores, como as de streaming, patrocínios e bônus, mas todas estas são concentradas nessa mesma elite.
Essa assimetria não é de todo ruim: assim como acontece com o mundo dos esportes e da música, por exemplo, os grandes astros recebem valores quase inimagináveis para a maior parte dos praticantes, o que incentiva aprimoramentos constantes e não impede o ecossistema de se desenvolver.
Mas a concentração de renda do setor também se explica pelo mecanismo econômico preferido dos estúdios de desenvolvimento: em geral, os ativos digitais dos jogos, como moedas, personagens e itens, que podem ser comprados para aumentar as chances de vitória, são vendidos apenas em mercado primário pela própria desenvolvedora. Para impedir o mercado secundário dos ativos in-game, as empresas chegam até a banir os jogadores que revendem seus itens.
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O primeiro problema desse modelo é conhecido como pay-to-win: comprando os melhores itens disponíveis, os jogadores com maior poder aquisitivo podem alcançar desempenho superior o bastante para impor uma barreira intransponível mesmo para os melhores entre os demais. E, como não há mercado secundário, as desenvolvedoras de jogos podem manter os preços artificialmente altos.
Outra questão é o travamento de uma economia com grande potencial para os jogadores dedicados, que contam com poucas possibilidades de monetizar seu tempo de jogo fora das competições.
A boa notícia é que, nesse mercado, há muito espaço para novidades: o público é, em geral, jovem e interessado em tecnologia; grande parte dos jogos têm vida útil relativamente curta, até que o interesse se esgote ou até o lançamento de uma nova versão; e a entrada de gigantes como Facebook e Google indica que ainda há muito espaço a ser preenchido.
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Play-to-Earn
Axie Infinity, o principal jogo em blockchain atualmente, foi lançado em 2018 com uma proposta simples para destravar a economia dos jogos virtuais: conceder aos jogadores a propriedade e os direitos sobre os ativos in-game, permitindo um mercado secundário em que se possa monetizar o tempo de jogo.
Para isso, todos esses ativos são registrados na rede Ethereum e circulam livremente entre as carteiras dos jogadores, que podem, inclusive, vender diariamente as riquezas acumuladas no jogo. E é exatamente isso que milhares de pessoas estão fazendo: principalmente em regiões com maior inflação ou desemprego, jogadores realizam tarefas diárias no jogo e convertem os ganhos em moeda local ou dólar – essa demanda contribuiu para a média de um milhão de jogadores por dia desde junho de 2021.
Como cada novo jogador precisa comprar personagens – os Axies – em um mercado aberto, a febre do jogo gerou um ciclo de alta dos preços e das receitas geradas, que já se firmaram em patamar acima de protocolos como UniSwap, OpenSea e Aave, e de importantes plataformas como Bitcoin e Binance Smart Chain.
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Com tanto apelo, a solução inspirou projetos semelhantes, que hoje já somam algumas centenas. Esses jogos compartilham o objetivo de proporcionar ganhos para os usuários, mas se desdobram em diferentes estilos, temas e redes blockchain, com maior concentração no Ethereum, Polygon, Solana e Binance Smart Chain.
No que se refere aos desafios desse novo ecossistema, o principal é a sustentabilidade, já que os jogos devem ser capazes de gerar receitas relevantes mesmo sem a entrada de novos jogadores ou em momentos de baixa dos principais criptoativos.
Mas, o momento é animador: com as validações provenientes desses projetos, esperamos ver um amadurecimento dos modelos econômicos, do comportamento dos jogadores e investidores e, consequentemente, dos métodos de valoração dos ativos in-game.
*Redator da Hashdex formado em Economia pela UFRJ, se dedica a aprender e ensinar sobre cripto desde 2017. Nos últimos anos, dirigiu grupos de estudo e palestrou em eventos como a Bitconf, além de organizar debates e palestras com representantes de entidades como IBM, CVM, ITS Rio, Mercado Bitcoin e Foxbit.
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