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O dinheiro circula de forma veloz no mercado financeiro. Num ambiente com excesso de liquidez e taxas de juros baixas, ele busca oportunidades e retornos sempre mais atraentes, mesmo que isso traga maiores riscos.
Essa regra vale para uma série de indústrias. Mas, no caso brasileiro, uma das que menos tem visto a entrada de dinheiro é a indústria do esporte. Se compararmos ao mercado americano então, vira covardia. E isso, de certa forma, coloca a indústria brasileira do esporte num lugar de menor relevância em termos globais.
Uma das grandes fontes de investimento em novos negócios é o chamado “venture capital”, formado por fundos de investimentos que colocam recursos como capital em novos negócios, que ainda estão em fase de desenvolvimento e maturação, mas com grande potencial. Obviamente, são investimentos que trazem mais risco. Mas quando há mais risco, há mais retorno.
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Essa forma de investimento é muito comum os EUA, que tem um mercado de capitais desenvolvido e cujos investidores buscam incessantemente formas de remunerar melhor seu dinheiro. No caso dos fundos de venture capital, é comum aportarem recursos em diversos negócios, aceitando que a maioria não vai dar certo, mas contando com o sucesso de um ou dois investimentos, capazes de multiplicar os aportes, compensando as perdas em outros ativos.
Segundo estudo da EY americana, baseado no sistema de informações Crunchbase, só nos três primeiros meses de 2021, as empresas americanas financiadas por fundos de venture capital receberam aportes de US$ 64 bilhões. Entre os principais negócios, estão empresas de delivery de comida, corretoras de imóveis e ações online, e até a Space X, empresa aeroespacial de Elon Musk, criador da automotiva Tesla.
Esses valores representam 43% do total de US$ 148 bilhões que os fundos de venture capital aportaram em 2020. Ou seja, há uma possibilidade não desprezível de termos aumento de aportes em 2021 em relação a 2020. Seria o quarto ano consecutivo com mais de US$ 100 bilhões de investimentos feitos por esses fundos em novos negócios.
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Nessa linha, o que vem se destacando nos investimentos relacionados ao esporte é a busca de oportunidades através das SPACs (acrônimo para Special Purpose Acquisition Company) empresas que nascem para recolher dinheiro dos investidores e aplicar na aquisição de negócios. Já comentei sobre como os SPACs funcionam em outra coluna. Em 2020, foram lançados US$ 83 bilhões em SPACs nos EUA – neste ano, esse valor já foi atingido no primeiro trimestre. Atualmente, segundo a Reuters, existem US$ 131 bilhões em 408 SPACs à procura de investimentos. Cerca de 1/3 desse valor está relacionado a SPACs buscando oportunidades no mundo do esporte, de aquisição de clubes a investimentos em sportechs (startups do esporte) relacionadas a bem-estar, análise de dados, relacionamento com fãs, entre outros segmentos do esporte.
Abre o Parêntese:
Nesta semana, foi anunciado que o app de comércio eletrônico GOAT recebeu um aporte de US$ 175 milhões, avaliando o negócio em US$ 3,7 bilhões. A avaliação anterior havia sido em setembro, quando o aumento de capital da época atribuiu US$ 1,75 bilhão como valor do negócio. O que o app faz? Ele é uma espécie de marketplace onde são negociados tênis, usados ou novos. O segredo? Usar inteligência artificial para garantir a autenticidade de produtos que podem valer mais de US$ 2 mil. Agora, estão expandindo para a Ásia e a Europa e ampliando o leque de produtos, indo além dos tênis e chegando à alta moda. Tênis, esporte, streetwear, tech, startup, venture capital, tudo interligado.
Fecha o parêntese
No Brasil, o mundo do venture capital ainda está começando. Segundo matéria da Folha de S. Paulo, baseada em estudo do Distrito Dataminer, empresas brasileiras receberam US$ 3,5 bilhões em aportes de venture capitals em 2020, valor 17% maior do que os US$ 2,97 bilhões de 2019.
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Por enquanto, esses valores não estão chegando de forma relevante ao esporte no Brasil. Mais da metade dos recursos aportados em 2020 foram direcionados às fintechs (startups do setor financeiro). Estima-se que as sportechs tenham recebido pouco mais de 5% do valor, ou US$ 175 milhões.
Entretanto, falamos de um mercado em expansão. Há casos como o da Arena Hub, um centro de inovação e fomento de sportechs, que ajuda inclusive a levantar investimentos para os projetos que ela assessora, com foco em toda a cadeia “fora-de-campo” do esporte, como engajamento de fãs, performance, espaços inteligentes, eSports, inteligência de negócios, entre outros.
Além deles, há casos particulares, como a OutField Capital, que tem atuado nos segmentos de esporte e bem estar, ou a Bossa Nova Investimentos, que criou um fundo de R$ 5 milhões para sportechs. Temos também a iniciativa da Sportheca, um grande hub de inovação ligado ao esporte capitaneado pelo Eduardo Tega.
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Todos esses acessos têm acontecido nos segmentos que giram em torno ao esporte de alta performance. São desenvolvimentos que permitem aos clubes e federações extraírem mais valor dos seus negócios à medida em que forem sendo incorporados às gestões.
Vale também dizer que muitas empresas da economia tradicional têm feito movimentos na busca de oportunidades envolvendo o esporte, como é o caso da SBF, que comprou a NWB, produtora de conteúdos como o canal Desimpedidos. É uma forma de acessar o esporte a partir dos negócios que orbitam em torno do core business, que é o jogo e a competição.
Tudo muito bom, tudo muito bem. Mas ainda estamos muito atrasados em relação a diversas coisas, especialmente no core business. Os clubes e federações ainda estão muito distantes dessas inovações. Por mais que vários estejam trabalhando ideias, como apps de relacionamentos com torcedores, NFT ou pesquisas, o movimento ainda é muito lento. E por vários motivos.
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Primeiro, porque muitos clubes veem esses investimentos como custo, gasto, quando na verdade trata-se justamente de investimento. São valores aportados que possibilitarão oportunidades de fazer dinheiro no futuro, de valorizar a relação com seus torcedores e, consequentemente, a marca do clube. Não é incomum ouvir de dirigentes a pergunta “Quanto vocês pagam para entrar no clube?”, como se fosse um favor abrir as portas da centenária agremiação em estado de calamidade financeira a uma empresa ainda em desenvolvimento.
Mal sabem os clubes que grandes conglomerados estão em processo avançado de terceirização de suas áreas de desenvolvimento tecnológico para startups, criando grandes hubs onde o objetivo final é absorver as melhores ideias. Obviamente, incentivando financeiramente esses desenvolvimentos.
O segundo motivo é a incapacidade que as gestões formadas por conselheiros vitalícios têm de entender o momento e oxigenar as estruturas dos clubes. Sistema arcaico, sem mobilidade, sem ideias. “Sempre foi assim” é o mote por trás disso.
E o terceiro e mais importante: o esporte brasileiro, mas o futebol de forma mais destacada, precisa de dinheiro, e precisa aproveitar o excesso de liquidez do mundo para receber investimento que permita estabilizar a situação financeira dos clubes e elevar sua competitividade. “Ah, mas lá vem ele falar de clube empresa de novo”. Sim e não. Em outro momento, falarei sobre o desastroso PL 5516 aprovado no Senado, e como ele será ineficaz na busca de qualquer aporte de recurso no futebol. Mas o que está em jogo é a variável TEMPO.
Enquanto o mundo dos esportes segue evoluindo, recebendo aportes, dinheiro, tecnologia, desenvolvendo os negócios que orbitam em torno do jogo – mas também o próprio jogo, através de aquisições e investimentos em clubes – no Brasil seguimos muito distante dessa realidade. E quanto mais o tempo passar sem mudanças radicais, maior a distância para centros mais desenvolvidos. Em algum momento, seremos definitivamente um país que apenas forma atletas no futebol ou que possui ligas e campeonatos pouco atraentes em outros esportes. Nesse momento, nem mesmo os negócios que surgem ao redor do esporte terão relevância. O impacto será em todo o ecossistema. Estejam preparados para isso.
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