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Há algumas semanas, tenho tratado neste espaço de assuntos relacionados a inovação, mas também sobre tendências de investimentos no futebol, especialmente com a recente aproximação dos fundos de private equity junto aos clubes e ligas europeias de futebol.
O dinheiro chega forte num momento de pandemia, com clubes fragilizados e investidores ávidos por valorizar seus produtos e fazer dinheiro revendendo-os no futuro.
Essa é uma mostra de que, apesar da desconfiança que se vê num relatório aqui ou numa pesquisa enviesada ali, o esporte está no radar dos investidores de longo prazo, com uma visão de resiliência mesmo diante do fantasma da mudança geracional.
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Nesta semana, juntarei dois movimentos no mundo dos esportes com um terceiro. que é mais uma provocação do que uma certeza: SPACs, figurinhas e como ganhar dinheiro com o futebol sem enfraquecer os clubes.
SPAC, mas pode chamar de cheque em branco
A SPAC (Special Purpose Acquisition Company, ou Companhia para Aquisição Específica, em português) é uma empresa que nasce com capital aberto, tendo ações negociadas em bolsa de valores, mas sem nada além de dinheiro no caixa e uma ideia na cabeça. É como dar um cheque em branco para alguém que lhe vende uma tese de investimento.
Mas por que alguém faria isso? Simples: o cheque para nas mãos de investidores com bom histórico de desenvolvimento de novos negócios. Ou seja, o cheque é em branco, mas o dinheiro parece estar em boas mãos. Em boas mãos e com prêmio: os sponsors das SPACs ficam com 20% dela após o IPO.
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Normalmente, as SPACs levantam dinheiro por meio de um IPO com a tese clara sobre onde o recurso será investido. Pode ser um negócio de tecnologia, varejo, produção de grãos e até mesmo no esporte.
A partir da oferta inicial de ações, o negócio tem um prazo para investir o dinheiro ou devolvê-lo aos investidores. Quando uma SPAC compra seu ativo-alvo, ela continua sendo uma empresa de capital aberto, mas o ativo não. E há um tempo para decidir se ele será uma empresa de capital aberto, por meio de uma fusão entre SPAC e ativo, ou será negociado.
Em 2020, 47% dos IPOs na Bolsa de Nova York foram de SPACs, segundo estudo da KPMG. É mais rápido do que fazer o IPO de uma empresa, pois ele leva entre três e quatro meses contra mais de um ano de um negócio já em andamento. Segundo o SPACinsider.com, existem 340 SPACs à procura de ativos neste momento.
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Mas o que isso tem a ver com o esporte? Tudo. Considerando que vivemos um momento em que há muita liquidez na economia, que por conta da pandemia recebeu uma enxurrada de recursos provenientes dos diversos modelos de auxílios governamentais mundo afora, é preciso buscar oportunidades para alocar esses recursos.
Segundo estimativa do Deutsche Bank, citada numa matéria do Valor sobre o momento econômico do mundo em entrevista com o investidor Jeremy Grantham, os correntistas do banco alemão planejavam investir 37% dos valores dos auxílios que recebiam em ações, o que mostra que o tamanho do ajuste foi grande, mas gerou tanta liquidez que ela acabou seguindo o curso normal e foi parar no mercado de capitais.
Muita liquidez com juros baixos significa corrida por oportunidades de negócios – e o mundo dos esportes está cheio delas.
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Primeiro porque as equipes normalmente são estruturas associativas ou empresas limitadas que estão sofrendo com a pandemia e a perda de receitas associada. Um incentivo para a venda dos ativos.
Além das equipes, negócios que orbitam no entorno do jogo também se beneficiam, pois estão se valorizando com a apreciação do core business da indústria.
Nesse sentido, há desde aquisições de participações no grupo Fenway, dono do Liverpool, até negócios envolvendo esportes e media companies, ou mesmo a aquisição da Sportradar, avaliada em US$ 10 bilhões e cujo principal negócio é compilar e analisar dados de todas as modalidades esportivas e vende-los a media companies, especialmente a sites de aposta.
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A empresa é importante porque garante integridade na gestão da informação, fundamental para o negócio de apostas. Com Ebitda da ordem de US$ 60 milhões, um IPO tradicional da companhia levaria muito tempo e levantaria muito menos capital do que por meio de SPACs.
Ou seja, a corrida atrás de ativos esportivos é grande. Ela é claramente associada a temas de desenvolvimento tecnológico e inovação. Mesmo os clubes, em que a bola da vez é justamente o desenvolvimento de conteúdos e relacionamento online com os fãs e torcedores.
Agora, uma notícia que pode ser boa ou ruim, dependendo do ponto-de-vista: as SPACs não estão de olho no Brasil. Há tantos ativos organizados e com potencial de crescimento pelo mundo que ainda estamos fora do radar dessa turma. Mas é mais um tema que mostra como a visão sobre o futuro dos esportes pode estar enviesada, dependendo do interesse de quem a divulga.
A ideia de que o esporte deixará de ser relevante no futuro e voltado para a Geração Z não combina com os inúmeros e vultosos investimentos feitos por fundos de private equity e SPACs. Isso mostra que muitas vezes o “tiozão do zap” e aquele veículo cool só querem te empurrar alguma informação pela metade, uma notícia que lhes interessa.
Álbum de figurinhas
Um exemplo disso é a Panini, tradicional editora italiana da cidade de Modena, responsável pela publicação dos famosos álbuns de figurinhas e cards de campeonatos, especialmente de futebol.
Em época de Copa do Mundo, colecionar figurinhas e preencher álbuns vira febre no Brasil. Mas esse é um negócio recorrente na Europa e nos EUA, que movimenta bastante dinheiro e interesse das crianças.
Figurinha. Não é sticker de WhatsApp, nem meme de internet. Papel colado em papel ou cards colecionáveis. Em anos sem grandes eventos, são vendidos cerca de 5 bilhões de figurinhas e cards pelo mundo, a partir de cerca de 400 competições cobertas por meio de contratos pelo mundo afora, com destaque para Itália, Alemanha, França, Espanha, EUA e Inglaterra.
Os atuais acionistas da Panini decidiram colocar o negócio à venda. Com faturamento na casa dos € 900 milhões anuais e um Ebitda de cerca de € 230 milhões – margem de 26%, portanto – vários fundos de private equity estão analisando a operação, cujo pedido de valor inicial é entre € 3 bilhões e € 3,5 bilhões. Mas fontes de mercado ouvidas pelo blog The Insider, do jornal Il Sole 24 Ore, imaginam que o valor final fique um pouco abaixo disso.
Dá para imaginar algo mais old school do que álbum de figurinhas em 2021? Pois bem, a estimativa é de que as receitas da empresa cresceram cerca de 20% em 2020 em plena pandemia. E já há contratos firmados para as próximas grandes competições de futebol pelo mundo.
Sim, meus caros, o futebol continua gerando interesse de diversas formas. E nem toda demanda precisa estar direcionada à tecnologia.
E como ganhar dinheiro com o esporte?
Juntando a história da Panini com os investimentos em esporte por meio SPAC e private equities, me parece que a grande sacada para se fazer dinheiro com o esporte não é diretamente com ele, mas por meio dele.
Ser dono de equipes te ajuda a estar dentro da indústria, a entendê-la, modificá-la, modernizá-la. Não necessariamente para tirar dinheiro diretamente dos clubes, mas a partir das diversas possibilidades de negócios geradas por eles.
Da produção de conteúdo à compra dos direitos de transmissão, passando pelo mundo das apostas (que eu não gosto, mas fazer o que) e pelo desenvolvimento de estádios e estruturas imobiliárias no entorno, terminando no tratamento e análise de dados: tudo isso pode ser feito por quem está fora das equipes, mas especialmente pelas equipes e ligas.
Não é preciso descapitalizar os clubes para fazer dinheiro, mas sim utilizá-los como mola propulsora para outros negócios.
O esporte, de forma geral, e o futebol, especificamente, têm muito a aprender com profissionais que enxergam o mundo além da ideia básica.
Podemos sempre escolher o mundo do “futebol raiz” e da tradição. Ou podemos abandonar o conformismo e ter todo o resto, mas com qualidade. Precisamos apenas que os donos do espetáculo enxerguem isso.