O Supremo Tribunal Federal (STF) marcou entre 19 e 26 de maio o julgamento que abrange a demissão sem justa causa, situação em que um empregador desliga um funcionário sem uma justificativa.
O STF vai julgar a Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 39 (“ADC 39”) e a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1625 (“ADI 1625”), que foi liberada pelo ministro Gilmar Mendes na última quinta-feira (4) após pedido de vista (mecanismo usado no Judiciário para travar o julgamento de um caso para melhor análise do tema).
Do total de votos, oito ministros já votaram e ainda faltam três votos: o do próprio Gilmar Mendes, de André Mendonça e de Nunes Marques.
O que está em jogo?
O processo, que tramita na Corte há mais de 25 anos, discute a validade do decreto (nº 2.100/96) do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que cancelou a adesão do Brasil à Convenção n° 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Embora inclua a demissão sem justa causa, o que está em julgamento, na verdade, é se o presidente da República pode revogar uma adesão a uma convenção internacional, neste caso da OIT, sem prévia autorização do Congresso Nacional.
Isso porque o FHC assinou em 1996 um decreto que suspendia a adesão do Brasil à Convenção 158 da OIT, que trata de situações de “Término da Relação de Trabalho por Iniciativa do Empregador” e delimita os casos de demissões sem justa causa.
Assim, se o STF entender que houve irregularidade na forma como o ex-presidente tomou a decisao de sair do acordo, o Brasil voltaria a fazer parte da convenção.
A relação com a demissão sem justa causa no processo se dá porque essa convenção tem recomendações para que se evite esse tipo de situação. Os países signatários não podem permitir que os empregadores demitam seus empregados sem uma justificativa comprovada. A ideia é regulamentar a rescisão de contrato para evitar demissões por discriminação ou perseguição, por exemplo.
O tema gerou muita confusão, mas a convenção não acaba com a demissão sem justa causa. A OIT recomenda que, para as hipóteses em que não haja um motivo para a demissão, o país-membro garanta alguma forma de preservação do emprego ou indenização compensatória, além de aviso prévio e seguro-desemprego.
No Brasil, a legislação já prevê isso para os casos disciplinares, mas não para as motivações de âmbito econômico, tecnológico e estrutural. Nesse sentido, se o Brasil voltar a aderir à Convenção 158, seriam necessárias mais indenizações e instrumentos de proteção ao emprego.
Especialistas entendem que a legislação do Brasil é até mais protetora do que a própria convenção, já que prevê demissão por justa causa apenas em um dos quatro casos sugeridos pela OIT.
Por fim, a demissão sem justa causa continua sendo lícita: empregador não precisa justificar a demissão e o empregado recebe todas as verbas rescisórias. E mesmo se o processo for aprovado, a convenção precisaria ser regulamentada, o que exigiria: 41 dos 81 senadores e 257 dos 513 deputados federais. Isso significa que uma mudança drástica está distante.
Para entender melhor as nuances do processo, uma reportagem do InfoMoney separou 5 respostas sobre o caso.
Retomada do julgamento
No fim do ano passado, a ministra Rosa Weber, atual presidente do STF, determinou que os julgamentos já interrompidos com pedido de vista devem retornar automaticamente à pauta da Corte em 90 dias úteis (cerca de cinco meses) após a publicação da emenda.
Por isso, com essa nova regra, a expectativa era de que a demissão por justa causa fosse julgada a partir de junho deste ano. Na última semana, no entanto, o ministro Gilmar Mendes antecipou esse calendário e marcou o julgamento em plenário virtual para esse período entre 19 e 26 de maio, que se inicia na próxima semana.
Vale lembrar que o processo pode se estender por mais tempo, porém, já que pode não ser cumprido por um novo pedido de vista ou por meio de um destaque — quando há um pedido para o julgamento ser no ambiente físico e não no plenário virtual.
Votação
Oito ministros já votaram sobre uma das ações (ADI 1625) do tema, mas estão divididos em três linhas de voto. A maioria entende que seria inconstitucional o presidente, sozinho, revogar a adesão à Convenção 158. Porém, segundo especialistas, a tendência é de que a decisão seja aplicada apenas para casos futuros, desconsiderando essa convenção da OIT.
Como o processo está em andamento há muitos anos, a composição do STF se alterou muito desde os primeiros votos concedidos. Dos oito votos já concedidos, cinco deles são de ex-ministros: Joaquim Barbosa, Ayres Brito, Nelson Jobim, Maurício Côrrea (Relator) e Teori Zavascki — inclusive os dois últimos faleceram em 2012 e 2017, respectivamente.
Além deles também já votaram Rosa Weber, atual presidente do STF, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski (este último já aposentado). Ainda faltam os votos de André Mendonça, Gilmar Mendes e Nunes Marques.
Não votam os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia por sucederem os ministros que já saíram.
A situação atual do julgamento é a seguinte:
- 3 votos para: a ação é totalmente procedente (Joaquim Barbosa, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski), ou seja, tirar o país da Convenção 158 seria inconstitucional;
- 2 votos para: a ação é parcialmente procedente (Maurício Corrêa e Ayres Britto), ou seja, para o Brasil deixar a Convenção 158 seria necessário passar pela aprovação do Congresso; e
- 3 votos para: a ação é totalmente improcedente (Nelson Jobim, Teori Zavascki e Dias Toffoli), ou seja, o decreto segue válido, mas os ministros em questão sustentaram que será preciso que o Congresso aprove decretos semelhantes em todos os outros casos futuros, a contar da definição do tema pelo Supremo.
Leia também