Dados da inflação dos EUA em novembro sugerem um Fed ainda cauteloso na comunicação

Núcleo da inflação subiu de 0,2% para 0,3% entre outubro e novembro, puxado por serviços; preços de habitação mostram resiliência

Roberto de Lira

Sede do Federal Reserve (Fed), o banco central dos EUA
Sede do Federal Reserve (Fed), o banco central dos EUA

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Embora a ligeira alta de 0,1% em novembro no índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) dos Estados Unidos não tenha trazido uma grande surpresa de alta, a manutenção do índice de serviços ainda em patamar elevado sugere que o Federal Reserve deve optar por manter o tom de cautela no anúncio amanhã da decisão sobre a taxa de juros.

Claudia Rodrigues, economista do C6 Bank, comenta que o setor de serviços segue sendo o principal responsável por manter os números elevados, com o mercado de trabalho ainda aquecido contribuindo para pressionar os custos, que são repassados nos preços ao consumidor. “Enquanto isso, a inflação de bens industriais já não é mais um problema”, pondera.

Assim, a persistência do núcleo da inflação (que subiu de 0,2% para 0,3%), puxado por serviços, deve manter o Fed cauteloso na opinião da economista. “Na decisão de amanhã, a última do ano, a instituição deve reforçar que permanece atenta aos dados e pronta para agir, se necessário”, prevê.

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Ela comenta que será importante prestar atenção nas projeções dos membros do comitê de política monetária (Fomc) sobre os juros nos próximos anos (entre 2024 e2026). “Acreditamos que, apesar de sinalizar redução à frente, o presidente do Fed deve desencorajar expectativas de cortes no início do próximo ano”, analisa.

“Na nossa visão, o começo dos cortes deve ocorrer a partir de meados de 2024, de forma gradual, e não mais no fim do ano. Isso porque o mercado de trabalho deve continuar desaquecendo, ainda que lentamente, e a atividade desacelerando.”

Matheus Pizzani, economista da CM Capital, destaca que o CPI veio na véspera de uma reunião do Fomc cercada de expectativas, em função dos possíveis desdobramentos que pode ter sobre a condução da política de juros do país, “especialmente em um momento em que o mercado vem tentando consolidar as projeções para o início do ciclo de corte de juros do país.”

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Para ele, apesar da ligeira divergência entre as projeções e headline do CPI, nenhum dos grupos apresentou comportamento que motivasse uma leitura mais negativa da inflação no decorrer do período. No caso dos preços mais voláteis, o grupo de alimentação registrou alta de 0,2% no mês, desacelerando ante o mês imediatamente anterior (+0,3%) e mantendo a média observada nos últimos 6 meses.

Já no grupo de energia, houve deflação de 2,3%, dado razoavelmente mais elevado que o do mês anterior (-2,5%), contando ainda com deflações importantes na gasolina (-6%) e nos demais óleos combustíveis (-2,7%), itens com maior impacto na renda disponível dos consumidores.

Pelo lado negativo, ele destaca o avanço dos serviços de energia (+1,7%), cujos preços aceleraram de maneira significativa no período.

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Com relação ao núcleo da inflação, a leve aceleração observada no mês se deu especialmente em função da alta dos preços dos serviços, que saíram de 0,3% para 0,5%, cita Pizzani. Ele comenta que houve maior pressão inflacionária por parte dos serviços de transporte (+1,1%), mas essa variação deve ser lida com parcimônia, uma vez que o payroll apontou fechamento de postos de trabalho no setor.

Outro componente citado na análise da CM Capital são os preços de habitação, que aceleraram marginalmente ante o mês anterior (0,40%), dando mais uma mostra de sua resiliência na atual conjuntura, com suas contribuições mais significativas para o conjunto da política monetária devendo ser observadas apenas em 2024.

“Para condução da política monetária, o resultado de hoje, assim como o payroll na última semana, não traz informações que possam sugerir mudanças nos planos futuros do Fed. A alta apresentada pelo núcleo da inflação não encontra respostas em um possível excesso de demanda, sendo gerada por desequilíbrios pontuais e que serão revertidos já na próxima divulgação”, afirma.

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Marcelo Oliveira, co-fundador da Quantzed, por sua vez, lembra que o número veio em linha com as expectativas e que não deve trazer impacto na decisão do Fed de amanhã, que deve ser de manutenção dos juros nos patamares atuais.

“Apesar de um número dentro das expectativas e estagnação da inflação, o Fed provavelmente irá comentar que ainda não está próximo a meta de 2% e, com isso, segurar os juros mais altos por enquanto.”

Preços de energia

Na análise do Bank of America (BofA), o crescimento global da inflação ligeiramente mais forte do que o esperado refletiu, em grande medida, uma descida mais suave do que o esperado dos preços dos produtos energéticos. “Esperávamos que a energia caísse 3,5%, mas em vez disso caiu 2,3%. Entretanto, os preços dos alimentos aumentaram 0,2%, em linha com as nossas expectativas”, diz o relatório do banco de investimentos.

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Sobre os preços de habitação, a previsão do banco é que os aluguéis deverão eventualmente moderar em direção aos níveis pré-pandemia (aproximadamente 0,3% ao mês). O processo tende a ser lento e essa é uma das razões pelas quais o BofA espera que a desinflação diminua no próximo ano.

Na leitura de Michelle Cluver, estrategista de portfólio da Global X ETFs, o que se espera é que a impressão do CPI de hoje prepare o cenário para o gráfico de pontos do Fed que será atualizado amanhã. “Durante o último mês, os mercados apresentaram expectativas de corte nas taxas de juros à medida que os dados econômicos se suavizaram. A tensão no mercado de trabalho diminuiu e a inflação tem apresentado uma tendência de melhoria”, comenta.

Ela também vê os preços mais elevados de habitação (“Shelter”) exercendo uma pressão ascendente sobre a inflação subjacente, que atingiu 0,3% no mês e 4,0% anuais, em linha com as expectativas do mercado.

“No geral, este relatório aproximou-se muito das expectativas do mercado e é pouco provável que tenha qualquer impacto significativo nas expectativas das taxas de juro a curto prazo. A expectativa é que o Fed permaneça em espera na reunião do Fomc de amanhã, mas o foco está em saber se há uma atualização no número de cortes refletidos no gráfico de pontos para o próximo ano”, afirma.